Abismo - Para Keiko Maxwell escrita por Amigo Secreto


Capítulo 1
Capítulo 1




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As guerras haviam acabado e finalmente a paz reinava, não só na Terra como também no Olimpo. “Irmãos não devem mais brigar!”, decretou Zeus, com sua voz grossa e potente como um trovão.

Como sinal de gratidão, Athena, ainda no corpo da jovem Saori Kido, conseguiu a permissão de seu pai para trazer a vida todos os seus soldados que lhe foram mais leais; que deram a própria vida para que a sua e de todas as outras do planeta pudessem ser salvas.

Haviam se passado mais de seis meses, desde o dia em que os cavaleiros de ouro mortos em batalha voltaram a respirar o ar, ocupando novamente as suas casas zodiacais. O Santuário estava tomado por uma atmosfera renovada. Havia vida para todos os lados! Novos e esperançosos aprendizes enchiam o Santuário de uma nova energia. Jovens corriam de um lado para o outro. Os campos de treinamento estavam sempre cheios. Quase todos os Cavaleiros tinham um ou alguns discípulos atentos e desejosos em serem o melhor e merecedores, em tempos futuros, das devidas armaduras de seus mestres.

Todos estavam felizes. Todos, exceto um: o morador da 3ª casa. Havia em seu rosto uma aura de solidão, um vazio existencial, uma tristeza profunda. Algo lhe faltava; e parecia que nada conseguia suprir aquela dor em seu peito...

Saga observava toda aquela movimentação e energia com certa melancolia. Era o único que ainda não tinha tomado para si um discípulo. Até mesmo Shion, restituído ao seu cargo de Mestre do Santuário, havia lhe questionado o porquê dele não ter um pupilo. O cavaleiro de gêmeos dissera que ainda não havia aparecido alguém a altura de ser o sucessor da Armadura de Gêmeos, mas a verdade era outra... Embora não expressasse com palavras, Shion entendia os sentimentos que permeavam aquela explicação, pois entendia o quão incompleto Saga pensava estar.

Sentado nas escadas da Casa de Gêmeos, Saga suspirou, ressentido. Aquele vazio o consumia dia após dia. Do alto da sua casa conseguia observar toda movimentação do Santuário, as idas e vindas dos aprendizes. Toda aquela alegria renovada fazia-o lembrar do tempo em que todos os Cavaleiros de ouro eram jovens almejantes às armaduras de ouro, assim como ele e o irmão (embora poucos soubessem de sua existência na época). Suspirou profundamente e um sorriso singelo, quase invisível, surgiu no canto dos seus lábios, quando se lembrou disso.

Nesse instante, dois jovens passaram por ele pelas escadarias das Doze Casas Zodiacais, sorriam e conversavam entre si. Eram gêmeos, assim como ele e Kanon, e havia certa intimidade e cumplicidade entre eles, assim como um dia houve entre ele e seu irmão.

Saga sentiu um aperto no peito, uma vontade louca de chorar. Se não houvesse acontecido o que aconteceu entre eles... Se não o tivesse prendido no Cabo Sunion... Se não houvesse sempre algo, desde o início, que os mantivesse separados...

Sentiu os olhos marejarem de lágrimas, úmidas e quentes.

As lembranças voltavam com força em sua mente. Coisas boas, momentos alegres que passaram juntos e outros mais tristes, mais angustiantes, como o dia que prendeu Kanon naquela prisão marítima.

Naquele dia, Kanon aparecera com um brilho estranho no olhar. Falara de coisas estranhas, ideias distorcidas e sentimentos pervertidos. Tudo que também sentia em relação ao irmão, mas que achava que poderia negar para todos e especialmente para si mesmo.

Sempre tentara ser o perfeito, enquanto por outro lado, Kanon não se esforçava nem o mínimo para isso. Eram o oposto um do outro, apesar dos rostos idênticos, e era isso que atraia um ao outro, não somente como irmãos, mas como homens, como amantes... E Saga sempre quis negar isso que considerava a loucura das loucuras, o pior dos crimes e dos pecados.

Como poderia amar o irmão desse jeito?

Lembrou quando Kanon chegou a falar de seus planos, da ideia de matar a pequena deusa ainda bebê, tudo para que pudessem ficar juntos para sempre. Nem os deuses tinham o direito de separá-los. Nunca estariam sozinhos, falava seu gêmeo, e, assim, poderiam viver o amor que sentiam um pelo outro.

Insanidades! A mente que Saga gritou naquele momento. Uma conspiração contra a deusa! A coisa mais impensável para ele que era um dos doze cavaleiros de ouro de Atena, que vivia para protegê-la e honrá-la. Como poderia fazer isso? Como Kanon poderia pensar nisso? E pior contar-lhe tudo! Isso era motivo mais do que suficiente para prendê-lo, aliás, era seu dever como defensor da deusa.

Como se arrependia de tudo agora...

Levantou-se. De repente não podia mais continuar ali, sentando a beira das escadas, como se estivesse esperando a vida passar; ou simplesmente que ele, seu irmão, aparecesse subitamente subindo os degraus em sua direção.

Sentia-se sufocado, sem ar, sem chão...

Desceu as escadas das Casas Zodiacais correndo, parecia sem rumo, como se não soubesse para onde estava indo; só que o seu coração o guiava a um certo lugar.

Saiu do Santuário tão apressado que, ao passar por Mu na casa de Áries, nem se deu ao trabalho de cumprimentá-lo. Mu ainda tentou chamá-lo, perguntar o que estava acontecendo, o porquê de tanta urgência. Em vão. Saga nem se virou ou parou. Apenas corria. Como um imã, seu coração se sentia atraído ao único lugar na face da Terra que tanto que lhe causava repulsa quanto fascínio; que o deixava tão confuso, e atordoado quanto como se sentia em relação ao irmão: Cabo Sunion.

Estar ali era como estar diante do próprio gêmeo. Era sentir amor e ódio ao mesmo tempo; algo que o fazia sentir encurralado, mas que não ele conseguia evitar. Não tinha como fugir, apenas se sentia puxado para lá, como se sentira atraído para perto do irmão, por mais que algumas vezes procurasse evitar essa atração tão insana. Sentir-se assim era como estar diante do mar revolto, do qual não se pode lutar e a única coisa a fazer é se deixar levar por suas ondas.

Os Deuses sabiam como tentou evitar tudo isso. Como procurou negar tudo o que sentia pelo irmão, sangue de seu sangue, e como não quis ser levado por aquela insanidade toda. Prendê-lo na prisão de Cabo Sunion era a desculpa mais do que perfeita para conseguir afastar Kanon e livrar-se dos sentimentos impuros que sentia por ele.

Seria perfeito, mas não foi isso o que aconteceu. Ficar longe de Kanon, que era uma espécie de pilar para ele, junto a solidão dos dias sem a presença do irmão, foi o estopim para outro tipo de loucura. Poderia ter convencido o seu gêmeo de desistir de seus planos, seria mais fácil, mas achou que fugir do que sentia seria a melhor das saídas. Seu maior engano... Mas foi até as últimas consequências ao negar o que sentia, e a única que coisa que conseguiu foi se deixar levar pela escuridão que habitava a sua alma.

Hoje o arrependimento o corroía por dentro. E ainda havia o medo de voltar a se tornar o louco que era, que Ares voltasse a tomar conta de seu corpo novamente, que tentasse matar Atena novamente, por achar que era culpa dela não estar com o irmão agora, sem o seu gêmeo, sem o seu pilar, sem a pessoa que mais amava nesse mundo...

Cheio de amargura, Saga correu, correu, apenas correu; deixando que a suas pernas o guiassem até aquele lugar, como se não houvesse outro lugar para a fuga de seus sentimentos. Corria, sentindo o gélido vento de principio de inverno bater contra a pele de seu rosto, queimado pelo sol grego, sem se importar. Apenas queria estar lá; precisa estar lá... Era uma necessidade!

Só parou de correr quando chegou à praia; de onde estava podia ver a prisão na qual, há anos atrás, ele havia prendido o seu irmão gêmeo. Seu coração falhou uma batida, um sufocamento tomou conta de seu ser. Era tanta dor que parecia não conseguir respirar.

Devagar foi se dirigindo ao topo daquele cabo, bem acima da prisão. No topo da falésia, parou; e olhou além. O mar estava revolto e batia com força contra a parede de pedras que formavam a falésia onde ficava aquela prisão.

Que sentido a sua vida tinha sem ele? Por que Athena o trouxera de volta? Para sofrer com toda essa dor e solidão longe dele? Por que o seu irmão ainda se encontrava no inferno? Que crimes ele ainda expiava?

Sentia-se miserável. Olhou para baixo, observando as ondas quebrarem contra as rochas. Suspirou. Não queria mais ser o cavaleiro de gêmeos. Se pudesse ter renunciado desde o início... Se houvesse mais uma oportunidade... Porém, se isso acontecesse, quem estaria ali naquele momento seria o seu irmão Kanon, e não ele. Estaria mesmo? Poderia ter sido Kanon um santo melhor do que ele? Com certeza seu irmão não surtaria como ele. Com certeza... Quem sabe?

Inclinou-se para frente como se fosse se atirar a qualquer momento daquele penhasco. Não via sentido em viver, em estar ali servindo como cavaleiro de gêmeos. Queria renunciar a tudo naquele momento. Inclusive a vida.

Que Athena o perdoasse, mas não tinha nem força e nem motivos para perdoar a si mesmo!

Sentia-se miserável, a autopiedade o consumia. Sem o seu irmão não era nada, nunca tinha sido esse tempo todo. Por esse motivo, perdeu a razão, deixou que Ares tomasse conta de si, deixou que ele fizesse o que fez. Deuses, quase matou Athena ainda bebê! Não tinha forças para lutar contra aquilo, não se sentia motivado. Sem Kanon não via sentido em existir, quanto mais em continuar sendo um Cavaleiro de Ouro...

Inclinou-se mais um pouco para frente. A ideia de se entregar aquelas ondas, sentir seus pulmões enchendo-se de água e sal, parecia cada vez mais sedutora.

Se Athena não trouxe seu irmão de volta era porque ele ainda estava morto, entre os seres do inferno, expiando pelos seus crimes. Provavelmente, ela tivera que escolher qual dos dois tirar do mundo dos mortos. Seu pai não lhe permitira devolver a vida aos dois. E ele, Saga, havia sido o escolhido. Claro, ele era o cavaleiro de Gêmeos por direito, não o seu irmão. Devia ser Saga de Gêmeos o escolhido, não um usurpador. Ou, então, estar separado de seu irmão seria um tipo de penitência... Sim, talvez Atena tivesse pensado numa forma de puni-lo por ter atentado contra a sua vida... E que maneira mais perfeita do que separá-lo de Kanon? Era como viver o Purgatório em vida!

Não queria mais. Não queria mais nada daquilo. Queria estar com o irmão, fosse onde fosse, mesmo que esse lugar fosse o inferno!

Olhou mais uma vez para o abismo, inclinou-se inspirando o ar salgado da maresia e fechou os olhos. Queria se jogar. Sim, mergulharia naquelas ondas revoltosas e desapareceria. Coragem para isso nunca lhe faltou. Abriu os braços e apenas deixou que seu corpo fosse levado para frente, para que as ondas o abraçassem e o levassem para o fundo do mar, para junto de seu amado irmão. Em breve estariam juntos!

Só mais um passo e sentiria o seu corpo sendo levado para baixo. Porém, quando se moveu para o abismo, sentiu uma mão o segurando com força, trazendo-o de volta à realidade. Furioso, abriu os olhos. Quem seria o desgraçado que o havia impedido de seus planos?

Mas qual foi a sua surpresa quando viu diante de si a pessoa que mais queria e precisava ver naquele momento: Kanon. Quase não pode acreditar. Imediatamente, seus olhos encheram-se de lágrimas, seu coração bateu tão forte dentro do peito que chegava a doer. Levou uma das mãos ao rosto do irmão, abriu a boca para falar algumas palavras, mas as palavras morreram antes de nascerem. Seria aquilo um sonho, ou já estaria no Campus Elíseos com ele? Morrera? Mas...

- Sim, sou eu mesmo, Saga... – Kanon sussurrou, puxando o irmão pela nuca e encostando a sua testa na dele, impedindo que ele falasse. – Estou bem aqui do seu lado... vivo.

Ficaram assim por um tempo. As lágrimas descendo sem parar dos olhos de Saga, molhando o seu rosto, o seu peito... Era tanta dor e alegria ao mesmo tempo, misturados, que Saga não conseguia se expressar. O pranto dizia tudo.

Como se suas pernas não pudessem mais sustentar o próprio corpo, Saga se sentiu descendo aos poucos até o chão. Uma fraqueza tomava conta do seu corpo. Seu irmão desceu junto e, no solo, o trouxe para seus braços, num abraço de amor, compreensão e perdão. Apenas os soluços do Cavaleiro de Gêmeos eram ouvidos naquele momento.

Saga chorava copiosamente, como se toda a dor, revolta, fúria e solidão pudessem ir embora através das suas lágrimas. Não conseguia se controlar, a única coisa que conseguia falar era o nome do irmão repetidas vezes.

- Tudo vai ficar bem agora. – foi a única coisa que Saga ouviu o irmão dizer, enquanto era agarrado fortemente por ele. Se tudo ficaria bem, duvidava; mas pelo menos agora existia uma esperança ressoando dentro de seu peito.


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Notas finais do capítulo

Fanfic especial de Amigo Oculto de Natal do Grupo Projetos.
Fic curta, mas não por isso menos especial. Espero que a minha amiga oculta curta bastante e me incentive a escrever uma continuação para essa fic. Você acha que merece uma continuação? Depois me diga, ok?
Agradecimentos:
* Gostaria de agradecer em primeiro lugar a Lucrécia Borgia, pelo incentivo, atenção e ideias e, principalmente, por ter me contagiado de amores pelos gêmeos maravilhosos da 4ª Casa Zodiacal.
* Gostaria de agradecer a minha beta-reader Cristal Samejima pela paciência e por ter aceitado de tão boa vontade ser a minha beta. Confesso que nem esperava!
* Gostaria de agradecer também ao meu querido e velho amigo Tarso Pereira por ter dedicado um pouco de seu tempo para ler as minhas más traçadas linhas.
* E por último, mas não menos importante, porque está sempre em primeiro lugar na minha vida de yaoi-writer, a Bia Costa, minha grande amiga e fã eterna. Sem ela já teria largado essa vida! XD Obrigada por me incentivar a voltar a escrever mais e mais. Minha eterna gratidão!



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