Luz Negra I - Oculta escrita por Beatriz Christie


Capítulo 5
Capítulo 5 - Fixação


Notas iniciais do capítulo

"Eu mudo o canal
Eu viro a página
Mas você me persegue
Por todos os lugares...
Fixação!
Minha assombração
Fixação!
Fantasmas no meu quarto
Fixação!
I want to be alone..."
Kid Abelha.



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O que eu estava pensando? Como pude deixar as coisas chegarem á esse ponto? Senti uma vergonha profunda, era de mim mesma. Ele deveria estar me achando uma garotinha fácil que é comprada com doces e gentilezas. Estava claro que ele não me conhecia nem um pouco. Posso não ter muitas qualidades, mas ninguém pode negar que sou uma pessoa leal. Deixei-me levar e fomos nos aproximando, mas isso tinha de parar e tinha de ser agora. Porém, quando fui me afastar e abrir a boca para dar uma basta nessa situação, Enzo levantou-se rápido da cama e, sem dizer nada, afastou-se de mim. Era isso que eu mesma estava prestes a fazer, então por que por alguns segundos me senti confusa?
–- Vou pedir ao médico para que venha ver Abby.
Ele disse, simplesmente, saindo da sala sem me olhar novamente.

Que situação! Mal posso imaginar o que ele estava pensando de mim. Na verdade, posso sim. A mesma coisa que eu estava pensando e que Andrew pensaria. Andrew... como pude colocar em risco nossa relação, que é tão importante pra mim? Enquanto me martirizava percebi que Abby havia despertadoe olhava pra mim com um olhar confuso.
–- Mel, por que você está com essa cara?
–- Nada Calopsita...Começou a chover bem forte e tivemos de pegar uma carona com um colega. Desculpe, mas agora você vai ter que ficar aqui descansando bem quentinha, até podermos ir para casa.
–- Tudo bem, eu não quero ir pra casa.
–- Por que? Te fizeram alguma coisa?
–- Não...
–- Me fale agora Abby! Seja o que for, eu vou resolver pra você. Foi a tia Amanda?
–- Não... a tia Amanda me dá comidas que eu gosto. É que...
–- ...?
–- Eu estou com medo.
Eu sabia que ela estava com medo ou doente quando bateu em minha porta, mas não esperava que estivesse doente E com medo.
–- Medo? De que?
–- Eu vi... um homem.
–- Onde?
–- Na casa nova, ele sempre aparece lá quando você dorme.
Okay, agora até eu estava um tanto receosa.
–- Um homem de verdade como o papai ou de mentirinha com o senhor Boneco de Neve?

Senhor Boneco de Neve era o amigo imaginário de Abby e ela conversava e brincava com ele constantemente.
–- Não! Ele era de verdade verdadeira mesmo. Eu queria te dizer, mas o senhor Boneco de Neve disse que eu não deveria.
–- Onde ele aparece Abby? Temos que falar com o papai.
Isso tudo poderia até ser uma criação da mente fértil de Abby, mas a possibilidade de um psicopata que te admira enquanto dorme vulnerávelmente não é uma coisa que eu deixo passar em branco.
–- Na sua janela.
–- Não se preocupe, tudo bem? Vou dar um jeito nisso. Agora se acalme e volte a dormir. Você precisa descansar, pra ficar boa e irmos pra casa.
Passei a mão em sua cabeça e ela disse
–- Mel, eu prefiro a nossa casa colorida.
Aquela frase me acertou em cheio. Se ela soubesse o quanto eu também queria voltar... Eu não podia deixar Abby ficar tão deprimida quanto eu. Ela merecia um infância feliz e normal.
–- Eu também Abby...eu também. Mas a nova casa é a nossa casa agora. Isso vai ser bom pra nós, temos que dar uma chance á nova casa. Ela não é bonita?
–- É, mas eu gostava de mexer na horta, junto com a mamãe...
–- Você sente falta dela, não é?
Abby balançou a cabeça assentindo. Partia meu coração ver pelo que ela estava passando, se já era difícil pra mim, imagine para ela.
–- A mamãe está aqui agora. Ela está em todos os lugares e se você fizer assim - Juntei minhas mãos -- você pode conversar com ela a qualquer hora!
–- Igual quando vamos rezar?
–- Isso! Igualzinho.
Abby pareceu contente com a novidade de poder conversar com a mãe. Eu nunca fora muito religiosa, mas os seres humanos precisam de uma esperança pra viver. Se não existir isso de céu e inferno, do que valheria ser bom nessa vida? Não haveriam consequências para o mau. Mamãe sempre disse que você frequentar a igreja não te torna religioso, é mais uma coisa do coração. Uma coisa que não pode ser determinada por outras pessoas.

Alguns minutos depois, Enzo retornou ao quarto acompanhado do Dr. Gabriel Arbus.
–- Ah, mas ela já está muito bem! Está até conversando. - disse Gabriel sorrindo.
–- Estavamos falando da mamãe e do homem que aparece lá em casa.
–- Ela disse ter visto um homem olhando pela janela de nossa casa hoje.- Expliquei.
–- Deve ser delírio pela febre.- era Enzo.
–- Imagino que não- disse o Dr. - A febre estava alta, mas não a ponto de causar delírios.
–- Pode ter sido um pássaro, árvores... Tantas coisas fazem sombras. - ele retrucou.
–- Não era, eu estou dizendo. Era um homem mesmo!
–- Bem, vamos ao que importa. - o Dr examinou-a novamente.- Bom, parece que essa moça andou pegando muita friagem! Não, é?
–- O senhor Boneco de Neve gosta de brincar na chuva!
O médico me olhou com um olhar de interrogação pura.
–- Esse é o amigo imaginário dela. - Esclareci. - Eles brincam, conversam e etc.
–- Ele não é "magitário", ele é de verdade!
–- "Imaginário" Abby, e viu só? Brincar na chuva te deixou doente.
–- Bom, ela já está liberada. Podem levá-la para casa e cuidem para que fique longe da chuva.- o Dr riu -Isso, é para a garganta.
Ele me entregou uma caixa de remédios e então Enzo aproximou-se de Abby.
–- Você é uma menina bem esperta, sabia?
–- Sabia!
Ambos riram e ele perguntou
–- Já está melhor? Quer ir no colo ou quer andar?
–- No colo!
–- Ah, claro. Por que fui perguntar?- ele disse rindo e pegando-a.
Enquanto caminhávamos até o carro, a conversa de Enzo e Abby ecoava pelo estacionamento.
–- Quantos anos você tem?
Abby perguntou a ele.
–- 23.
Agradeci aos céus pelos dois se darem bem, pois isso desviava a atenção do clima pesado que surgiu após aquele "quase beijo". Será que havia mesmo sido um quase beijo? A mudança repentina de comportamento de Enzo me fez até mesmo começar a duvidar disso. Eu imaginei tudo aquilo? Aquela aproximação, aquele olhar? Não, não era possível. Aquilo aconteceu mesmo, mas não acontecerá mais!

O caminho até em casa pareceu ser mais demorado do que realmente era. Enzo parou o carro em frente ao meu portão. Eu estava prestes a descer, quando Abby perguntou
–- Você quer entrar? Eu te mostro o meu quarto novo! Ele é gigante.
A-i m-e-u D-e-u-s. Ele tem que falar não, ele tem que falar não, ele tem que falar não!
–- Fica para a próxima, Abby. - próxima? Que próxima? -- Eu prometo que mando um bolo pra você.
–- Bolo? Você sabe fazer bolos?!
Mesmo doente, ela parecia um grilinho.
–- Se eu sei fazer bolos? - ele riu zombeiro - Depois de comer o meu bolo, você vai descobrir que nunca tinha comido um bolo de verdade.
Abby virou-se para mim com um beiçinho ensaiado
–- Mel, você tem que pedir pra ele ficar! Ele pode fazer um bolo pra gente. É rapidinho, depois ele pode ir embora.
–- Obrigado pela parte que me toca. - disse Enzo em falso tom de tristeza.
–- Abby, você está doente. Tem que descansar. Vamos entrar e eu faço uma sopa pra você.
–- Viuuu? Meninas doentes precisam de bolo, não de sopa!
Enzo e eu rimos em sincronia. Quando percebemos, paramos de rir abruptamente.
Faltava somente a minha resposta. Eu poderia dizer não e depois cortar totalmente qualquer contato com ele. Mas, ele fora tão gentil com Abby desde o começo e estava se prestando a fazer um bolo para ela, só para a agradar. Qualquer um que agradasse Abby, estaria me agradando também. Entretando, eu conheci esse cara ontem e esse bolo seria feito em minha casa, onde meu pai não se encontra. Sem contar que Andrew morreria se soubesse que fiquei sozinha com ele aqui.
–- Acabo de lembrar que minha amiga, Luna, aparecerá daqui a pouco. Ficamos de planejar o que faremos no meu aniversário.

Inventei aquilo na hora, mas não deixava de ser verdade. Estávamos em Junho, então meu aniversário estava mesmo próximo.
–- Seu aniversário?
Era a primeira vez que ele falava comigo novamente.
–- Sim.
–- Geminiana, então?
–- É, mas não acredito nessas coisas. Sou muito cética, sabe?
–- Não deveria.
Havia algo em seu tom que fez parecer um alerta.

Desci do carro com Abby e corremos para a entrada. Enzo só se foi quando nos viu passar pela porta. Disparei para o telefone.
–- Alô?
–- Luna, é a Mel. Você pode vir aqui?
–- Onde você estava? Andrew me ligou, disse que recebeu vários telefonemas seus. Não conseguimos falar com você a manhã inteira!
Manhã inteira? Olhei para o relógio, já eram 14:00 hrs. Eu saíra de casa com Abby não eram nem 11hrs!
–- Eu estava no hospital com Abby e ele.
–- Ele quem?
Fiquei com medo de sua reação, mas ela era minha melhor amiga e me conhecia. Luna saberia o que dizer, eu precisava conversar com ela.
–- Enzo.
–- Estou indo praí.


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo foi mais calmo, mas traz grandes pistas! Estou muito feliz com o carinho de vocês! Beijos.