Luz Negra I - Oculta escrita por Beatriz Christie


Capítulo 30
Capítulo 30 - Destemida




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Enzo não levou muito tempo para simplesmente abaixar-se novamente e recolher sua pá. Ele deu-me as costas e entrou na casa pela porta dos fundos, o segui enquanto pensava em como isso seria mais difícil do que eu imaginara.
-- Eu preciso... - comecei a argumentar, mas então ele interrompeu-me.
-- Você precisa do que? - ele virou-se para mim nervoso - Tire isso da sua cabeça, não vai acontecer.
-- Eu vou com ou sem você. - afirmei - A diferença é que com você terei alguma chance.
-- Você está me pedindo pra ajudá-la em uma missão suicida! - ele protestou.
-- Não. - tentei manter a voz calma - Estou dizendo que preciso fazer isso por todos que amo, por todos aqueles que podem ser atingidos nisso. - aproximei-me mais de Enzo - Preciso fazer isso por ela. - Não precisei citar nomes, Enzo sabia que me referi a minha mãe.
Enzo ficou em silêncio por alguns instantes, até que sentou-se em uma das cadeiras de madeira na cozinha. Ele apoiou o rosto nas mãos e permaneceu em silêncio. O que eu faria sem sua ajuda? Eu não sabia para onde ir, ou como enfrentá-los.
-- Fiz tudo que pude até agora para protegê-la. - ele murmurou - Como pode me pedir isso?
-- Só quero que me treine e que mostre o caminho até os Alexandrinos. - apoiei-me na bancada de madeira - Nunca pensei em levá-lo comigo.
-- Você acha que mesmo que temo por mim ou que permitiria que você fosse sozinha?! - Indagou Enzo erguendo a cabeça para encarar-me.
Percebi então que nossas posições usuais estavam inversas. Enzo estava sentado e confuso, enquanto eu estava de pé, pronta para agir.
-- Não posso pedir para que se arrisque assim. - respondi-o.
-- Estou me arriscando desde que abandonei meu clã por... - ele parou de falar por alguns instantes, então prosseguiu - Pelo que acredito.
-- E no que você acredita?
Neste momento um som desviou nossa atenção. Era o toque de meu celular vindo de dentro de minha bolsa que eu deixara no balcão atrás de mim. Peguei-o e vi que era Luna, imaginei que, fosse o que fosse, o assunto não poderia ser mais sério do que este. Decidi não atendê-la, então o encarei novamente como um incentivo para que me respondesse.
-- Por muitos anos lutei ao lado daqueles que imaginei serem justiceiros revolucionários contra a liderança nebulosa dos Gardners. Até que descobri que era tudo cobiça - ele deu um soco no balcão, fazendo-o afundar e com que eu me assustasse. Enzo não pareceu importar-se com nenhuma das duas coisas. - Todos iguais, matando os próprios irmãos em nome do poder.
-- E você quer permitir que isso continue?! - insisti.
-- Se os achou brutais nas visões que lhe dei naquele sonho, saiba que aquilo não é nada perto do que fariam conosco, principalmente com você! - Enzo encarou-me perplexo - Como consegue agir tão normalmente sendo que só soube de tudo ontem? Parece até que não nasceu neste mundo dos comuns.
-- A verdade... - encarei outro canto da cozinha, desviando do olhar perplexo de Enzo - A verdade é que estou morrendo de medo, de verdade. - voltei a encará-lo novamente - Mas, as vezes temos que usar o medo como impulso.  Quantos mais terão de morrer?
Os segundos pareciam passar cada vez mais lentos diante do silêncio de Enzo, até que ele me respondesse.
-- Não sei quantos morrerão, só sei que nenhum deles será você.
As palavras dele  causaram-me uma emoção nova, desconhecida. Era um misto de alegria e decepção. Alegria por ter alguém me querendo viva, em meio a tantos outros me querendo morta. Decepção por esta pessoa ser a única que poderia me ajudar nesta missão, mas ela não o faria.
            Permaneci de cabeça baixa remoendo todos os pensamentos e dúvidas que vagavam em mim. O que encontrarei no caminho? E, se quer haveria um caminho á seguir? Percebi que estaria sozinha, sem defesas e perdida.
         
          Guardei o celular na bolsa e coloquei-a em meu ombro. Não havia jeito, eu chegara ali com um objetivo; o de proteger aqueles que amo, mesmo que isso colocasse minha vida em risco. A última parte era o ponto chave de nossa discordância, Enzo não seria a favor de corrermos um risco tão grande, ainda mais com tão poucas chances ao nosso favor. Desencostei-me do balcão e segui rumo ao jardim, enquanto passava por ele seu olhar duro não me seguiu, ele estava pensativo demais para sequer notar minha movimentação.
               Prossegui pela lateral da casa, tentando chegar ao carro de Rick que fora o que eu usara para chegar até que dei de cara com um buraco imenso no jardim, olhando mais a frente avistei outro, um pouco menor. Prestando atenção pude ver que a terra fora revirada em diversos pontos ao longo de nossa propriedade. 
Ouvi passos rápidos atrás de mim e sabia que era ele. Enzo viera atrás de mim e pela sua expressão ele sabia bem o que se passava em minha mente.
-- Foi pra isso que vou comprou a casa. – Enzo permaneceu em silêncio, agora com as mãos no bolso da calça de moletom cinza. – Seu único interesse aqui é o livro, não é? Foi pra isso que você escavou esse buraco, e era isso que você estava fazendo quando cheguei.
Diante de seu silêncio, saí andando, deixando-o para trás. Como pude ser tão tola! É claro que ele não me ajudaria a destruir a pedra, pois também estava interessado nela e no livro
-- Você está enganada. – Enzo disse ou segurar-me pelo pulso – Sei bem que quem possuir este poder em mãos será consumido por ele. Não sou tolo, nem estou cego para querer isso, mas muitos estão e só estou tentando encontrá-lo antes deles.
-- Você diz ser tão diferente deles, mas enquanto isso está fazendo o mesmo que eles, buscando aquele maldito livro. 
-- Você não entende o quanto é arriscado para eu fazer tudo o que fiz? – ele aproximou-se de mim e segurou-me pelos ombros – Não entende como é difícil ter de estar aqui como um cão de guarda, esperando pelo momento em que um nômade ou clã venha atrás do livro e ter de detê-lo? – suas mãos agarravam meus ombros, comprimindo-os cada vez mais – E ainda, com tudo isso, proteger você... – Enzo aproximou seu rosto do meu – Jamais ouse repetir isso, jamais pense em que estou do lado deles.
Poucos centímetros separavam seu rosto do meu. Recordei-me do dia no hospital, quando conversamos de verdade pela primeira vez. Quem diria que, daquele dia até aqui, tantas coisas teriam mudado, inclusive eu. Contudo, uma não havia mudado tanto assim.
-- Como posso não duvidar de você? – coloquei minhas mãos em seus pulsos, um sinal de que deveria soltar-me – Você me revelou muitas coisas, e sou grata á isso, mas, a realidade é que não nos conhecemos! Eu não sei quem é você.
Ele franziu as sobrancelhas e apertou os lábios. Sua expressão era de uma mágoa profunda.
-- Sim, você conhece. Você...
Enzo foi interrompido, quando eu e ele viramos a cabeça simultaneamente para a encararmos surpresos. Luna fitava-nos paralisada, com a boca ligeiramente aberta. Seus olhos estavam vermelhos e ela parecia abatida. No mesmo instante Enzo soltou-me e dei alguns passos afastando-me dele.
             "Enzo só com as calças do moletom, segurando-me pelos ombros enquanto eu segurava seus pulsos, nossos rostos próximos.", pensei desconcertada e imaginando o que Luna deveria estar pensando sobre a cena que presenciara, eu não sabia realmente o que dizer.
-- Desculpe, eu... – Ela sibilou. Então, deu um pigarro e voltou a falar – Preciso que você venha comigo, e rápido.
Suas palavras causaram-me urgência.
-- O que foi?! – um dor atingiu meu coração. Seus olhos vermelhos eram evidências de que havia chorado. Nervosa, aproximei-me dela – O que foi Luna?!
Abby, Andrew, meu pai, Daniel... Vários rostos passaram pela minha mente, e não pude deixar e pensar que fosse o que fosse, fosse com quem fosse, era culpa minha.
-- Sua tia Deborah...
Não! Minha tia era como uma segunda mãe para mim, ela sofreu tanto quanto eu com a morte de Liane e nos aproximamos ainda mais. Fora que, exceto por Enzo, ela era a única que estava envolvida no mundo oculto e que estaria ao meu lado. Senti que cada vez mais os braços da solidão tentavam me dar um abraço frio, paralisador, que fizesse com que eu perdesse as forças. 
-- Ela não... - Senti meus joelhos fraquejarem e a mão de Enzo em meu cotovelo – Me diga que ela está viva.
Luna mordeu os lábios antes de prosseguir.
-- Sim, mas o estado é delicado. Venha, é melhor irmos logo para o hospital.
Assenti e segui Luna até a frente da casa, onde estava seu velho conversível.
-- Vamos com o carro do meu pai, é mais rápido. – sugeri.
Luna assentiu e entramos no carro. Devido ao meu nervosismo, ela proibiu-me de dirigir e tomou a posse do volante. Enzo apareceu em minha janela, quando ela já estava pronta para dar a partida.
-- Estarei por perto. – ele disse – Eu prometo.
Enzo afastou-se do carro e Luna acelerou, indo para a estrada e afastando-se cada vez mais de minha velha casa. 

                 Algo em meu coração denunciava a magnitude do que havia ocorrido.
-- O que aconteceu com ela? - perguntei, a voz embargada.
Luna titubeou, mas acabou respondendo-me cautelosamente.
-- Ela está com algumas fraturas... - encarei-a, era obvio que ela estava  floreando as coisas para mim - Tudo bem... - Luna murmurou - Ela está com muitos ossos quebrados, cortes e coisas assim - levei uma mão á boca, enquanto ela prosseguia - Parece que um fazendeiro encontrou-a nas proximidades de sua fazenda. Não me pergunte o nome da cidade, não era nenhum lugar próximo que eu já ouvira falar!
-- O que mais eles disseram? - insisti.
-- A coisa não está boa... Mel, ela está em coma. 
Sua última frase causou-me um choque. Minhas mãos caíram em meu colo e meu olhar fitava o horizonte. Eles estavam fazendo isso para fazer-me fraquejar. Mantendo isso em mente, segurei minhas lágrimas o máximo que pude. A voz de Luna era um sussurro no fundo de minha mente, enquanto ela prosseguia " Eles acham que ela foi atropelada ou algo assim... Meu Deus, quem faria isso com alguém?..."
Eu sabia muito bem quem teria feito isso, e apesar de Luna saber de parte das coisas, era natural que ela ainda não tivesse ligado os fatos.
-- Eles virão até mim - murmurei, fitando o nada. - E os que não vierem, irei encontrá-los.
Um única lágrima escorreu pelo meu rosto. Ela era quente, quente como o sentimento que surgia dentro de mim. E posso lhe dizer, ele não era nada próximo do amor.


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Notas finais do capítulo

Podem abaixar as pedras, sei que demorei horrores pra escrever dessa vez. Mas, tenho motivos "bons" :/
Esta magnifica (sqn) pessoa que vos fala quebrou a perna. D:
Tive uma fratura completa do maléolo lateral na perna direita. YAAAAY

Fiquei uma semana com a tala e agora vou ficar um mês de gesso... E tem gente que morre de vontade de ficar de gesso. Não queiram, é horrível, sério.
É horrível a dor, mas é pior ainda precisar da ajuda dos outros.

Sei que vão perguntar como foi, então...
Num belo dia de aula tudo ia bem, até que lembraram que tinha jogo obrigatório de handebol, que eu odeio. Daí que ZÁS! Biazita pega a bola. "uuuh que milagre!" É aí que as 15 meninas em quadra vão pra cima dela, e caem no pé dela, e quebram o tornozelo dela e ela se froid. Fim, essa foi a minha história emocionante.

O bom é que você descobre coisas que não sabia, tipo que pode se tornar uma tartaruga... Mas isso fica pro próximo cap!

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Beijos com gesso!