― Como assim, você desistiu de ser um lobo? – pergunta Leah indignada.

― Eu cogitei a ideia de ir embora de La Push, mas minha mãe quase surtou ao imaginar minha partida, então decidi parar de me transformar... Não tenho nada a perder, afinal!

― Como não? – explode ela de repente. – Está abrindo mão de uma parte de você, por birra, e ainda diz que não tem nada a perder? Onde está sua honra nisso tudo?

Leah não queria ser rude com Nicolas, mas aquela gravidez estava realmente sendo diferente e já mexia absurdamente com seu humor, fazendo-a explodir ou chorar com extrema facilidade. Seu acesso de fúria desaparece ao ver o rosto magoado do garoto Uley.

― Não fique brava comigo, Dona Leah, eu a tenho em grande estima e me incomoda saber que a desagradei – responde a olhando de maneira um tanto suspeita, quase como se parece venerá-la.

― Já chega dessa palhaçada – grita Lucian, levantando-se e batendo na mesa. – Qual é o seu problema, moleque? Por que está tratando minha mulher assim?

Nicolas sente seu corpo se arrepiar em alerta. Ele podia ter parado de se transformar, mas levaria tempo até que seus genes adormecessem por completo. E até lá, seu instinto de lobo sempre tentaria alertá-lo do perigo ao seu redor.

― Pare com isso, Lucian, ele só está tentando ser educado!

― Não está não – rosna o cherokee. – O que você está tentando esconder de mim, Nicolas? – questiona, tentando encontrar algo em sua mente que denunciasse seu estranho comportamento.

― Nada, Sr. Lucian, não estou escondendo nada...

― Está exagerando, pare de bancar o ciumento – fala Leah.

― Não estou com ciúmes – responde entre dentes –, só não estou gostando da maneira com que ele fala com você.

― Isso pra mim se chama ciúme – pensa Harry, que somente observava.

Leah toca o braço do marido tentando acalmá-lo, mas Lucian estava possesso, pois sua fera estava inquieta com a presença e o comportamento de Nicolas.

― Me deixe em paz, Leah! – grita ele, afastando seu toque.

Lucian fecha os olhos no mesmo instante, com força, não acreditando na maneira com que a tratara e conscientizando-se de que estava mesmo fora de si. Ele volta seu olhar para a esposa e apenas move seus lábios num pedido mudo de desculpas, contudo, lágrimas já escorriam dos olhos de Leah devido ao seu estado tão emotivo.

― Imbecil, olhe o que fez! – rosna Nicolas ao sentir uma súbita revolta inundá-lo, agarrando o colarinho da camisa de Lucian e empurrando-o contra a parede mais próxima. – Se continuar a agir dessa forma, vou começar a duvidar que realmente a mereça como esposa.

O que raios estavam acontecendo com aqueles dois, afinal? Harry não fazia ideia, mas já não podia mais ficar na posição de espectador. Lucian solta um rosnado furioso para o Uley, e, com uma piscadela, deixa sua íris negra se sua fera preencher os seus olhos.

― Pare com isso, pai, não pode se transformar aqui, vai destruir tudo! – alerta Harry, levantando-se da mesa e tentando separá-los.

Com o pouco de bom senso que lhe restava, Lucian se desvencilha das mãos de Nicolas e o empurra para longe, saindo pela porta dos fundos. E, sem dizer nada, Leah o segue...

― Acho melhor ir embora – diz Harry seriamente.

― Me desculpe, Harry, não sei o que deu em mim... Droga! Não faço nada certo – repreende-se, partindo em seguida, com o semblante tão confuso quanto o do mestiço.

Na floresta, Lucian derruba a primeira árvore jovem que vê em sua frente. Ele não conseguia controlar sua raiva, pois nunca vira alguém que ousasse enfrentá-lo por causa de sua própria esposa, e que ainda a defendesse em seu lugar. O cherokee sentia-se enciumado, impotente e um completo imbecil.

― Idiota, idiota, idiota – gritava ele para si mesmo.

― Lucian – chama a loba.

― Me deixe sozinho, senão...

― Senão o quê? Vai me bater? – desafia.

Lucian dá um suspiro, deixando-se derrotar. É claro que ele não tocaria nela daquela forma.

― Eu te amo! Não existe vida pra mim, se não for ao seu lado...

― Está achando que ele vai me tirar de você? O Nicolas? – pergunta incrédula, fazendo-o se envergonhar por ter tido tais pensamentos. – Ele é apenas três anos mais velho que nosso filho, já pensou na possibilidade dele ser educado, porque estou virando uma chata que briga, ri e chora sem muitos motivos? Além disso, o imprinting não é assim. Você é insubstituível e eu te amo, Lucian, nunca duvide disso.

Leah envolve a cintura do marido num abraço apertado, ouvindo as batidas frenéticas de seu coração amedrontado. Ele achava mesmo que Nicolas seria seu rival? Que tolice, ela nunca o deixaria...

Ainda na casa dos Clearwater, Harry se arrumava para buscar Elena na escola, onde ficara até mais tarde para adiantar algumas coisas de seu trabalho escolar e arrumar a papelada de sua transferência, afinal, depois da lua cheia, ela não poderia mais frequentar a mesma escola que os vampiros.

O mestiço entra no carro, ainda atordoado com as cenas de mais cedo, decidindo dirigir com certo cuidado por causa disso. O tempo ameaçava chuva naquele momento e, quando Harry chega à escola de Forks, os pingos já começavam a cair.

― Oi bonitão! – cumprimenta Nessie, surgindo em sua janela de repente e não se importando com a chuva.

― Deus do céu! – Pula com o susto. – Quer me matar do coração?

― O que faz aqui numa hora dessas?

― Vim buscar minha namorada! – responde naturalmente, correndo os olhos pelo cenário em busca de seu imprinting.

― Ah, é uma pena que tenha perdido viagem. – Apoia os cotovelos na janela do veículo descontraidamente. – Elena terminou o trabalho mais cedo e pegou uma carona com um garoto de outra sala.

― Garoto?

― Muito bonito por sinal, eles pareciam se conhecer muito bem – lança com falso desinteresse, olhando para o rosto nada contente do mestiço. – Me desculpe, Harry, acho que falei demais...

― Com licença, eu tenho que ir – diz ele apressadamente, ligando o carro novamente e já engatando a ré para sair do estacionamento.

― Pode me dar uma carona? – questiona Nessie, dando o seu melhor sorriso.

― Não! – responde somente, saindo do estacionamento um tanto revoltado.

Por que Elena não lhe dissera nada sobre este tal garoto? Ou sobre o fato de não precisar de sua carona? Ela poderia ter ligado, não poderia? Se Harry já estava atordoado antes, agora estava completamente fora de si em desatenção, dúvidas e uma pontada de raiva...

― Por que fez isso? Por que mentiu pra ele? – questiona Bella após a saída de Harry, inconformada com o comportamento da própria filha.

― Ops! Foi sem querer. – Ri, saltitando em meio à chuva em direção ao seu próprio carro, como se tudo aquilo não passasse de um jogo.

Renesmee coloca a chave na ignição e também sai do estacionamento apressadamente, deixando os pais para trás e sem dar qualquer tipo de explicação. Bella olha ao redor e logo vê Elena, segurando os livros numa mão e o guarda-chuva na outra, tentando equilibrar tudo enquanto procurava o carro de Harry.

Droga! Como explicaria a situação sem que ela se zangasse com sua filha?

Porém, antes que a vampira pudesse formular uma resposta adequada, Edward freia o carro bruscamente em frente à Elena, descendo do automóvel e praticamente a empurrando para o banco de trás do veículo.

― Vamos, Bella, temos que ir atrás dela!

Sem pestanejar, a vampira corre até o carro, entendendo que o marido finalmente descobrira as intenções de Nessie, e, ao entrar no veículo, se depara com quase-lobisomem totalmente furiosa.

― O que pensam que estão fazendo?

― Nessie está indo atrás de Harry! – explica Edward rapidamente. – Mentiu para ele dizendo que você havia partido e, assim que ele se foi, ela o seguiu...

― Qual é o problema dessa garota?

― Nessie é o imprinting de Jacob – esclarece Edward, tentando fazê-la entender. – Cresceu rodeada pelo seu carinho e sua atenção. Quando recebemos a ligação da gravidez de Leah, ela demonstrou uma súbita alegria em voltar para Forks e, mesmo depois dela ter perdido o bebê, Renesmee insistiu que viéssemos da mesma forma... A todo instante ficava cogitando como estaria o pequeno Harry, que ainda era um bebê quando fomos embora. Sabia que havia algo estranho com aquela inesperada curiosidade por ele, mas, somente agora, entendi o porquê.

― E por que ela está fazendo isso? – questiona Bella, com medo de ouvir a resposta.

― Enquanto entrava no carro Nessie deixou escapar que finalmente se veria livre de Jacob, que sua presença era enjoativa... Parece-me que ela está cansada dele e quer tentar algo novo, está tentando substituí-lo por outro lobo!

― E tem que ser justo com o meu? – rosna Elena no banco de trás. – Quem ela pensa que é para brincar com os sentimentos dos outros?

― Pobre Jake, não merece passar por tal coisa – responde Bella com pesar, lembrando-se do tanto que ele se dedicou a ela, desde que nasceu.

― A julgar pela forma com que Jacob vem agindo, acredito que já tenha percebido seu interesse pelo Harry. – bufa Elena, ajeitando os livros no banco e colocando o cinto de segurança. – Não se preocupem, quando eu colocar minhas mãos nela, vou lhe dar um corretivo! – ameaça Elena.

Bem longe dali, mas ainda na estrada, estava Harry, que sentia seus instintos gritarem dentro de si, o mandando de volta para casa. Em sua cabeça, era por causa da raiva e do ciúme, contudo, os seus genes lupinos tentavam alertá-lo sobre outra coisa: a meia vampira que insistia em persegui-lo.

E com a ansiedade de voltar para La Push, o mestiço, mais uma vez, deixa de lado o conselho de seu pai para os dias de chuva e afunda o pé no acelerador. Entretanto, este fora o seu maior erro naquele dia, pois, com a velocidade alta e a pista encharcada, Harry logo sentiu os pneus deslizarem sobre a água, fazendo-o perder totalmente o controle do veículo.

Ele tenta frear e, numa tentativa desesperada de sair daquela situação, gira o volante, mas a junção destas ações só contribuiu para o pior. O carro deslizou lateralmente sobra à pista ensopada, ainda em alta velocidade, capotando duas vezes e saindo da estrada na sequência, chocando-se contra uma árvore. E com a forte batida o tronco se partiu, desabando por cima do veículo de modelo antigo e ameaçando a parte superior da lataria.

E lá estava Harry Clearwater, sozinho, acidentado, debruçado sobre o volante e inconsciente. O cinto de segurança se arrebentara com o impacto; o capô afundara de tal forma, que parte dela prensava as pernas do mestiço contra o banco; o teto também afundara com o impacto da árvore e acertara sua cabeça; havia sangue na região occipital de seu crânio e também na região frontal, devido a batida que dera no volante; seu lábio estava cortado e suas pernas imobilizadas. Quem o tiraria dali agora?

Talvez ele pudesse ter evitado tudo isso. Talvez pudesse ter se transformado para estourar o teto do veículo e segurar a árvore, talvez pudesse ter dirigido devagar ou, ao menos, se acalmado antes de pegar a estrada. Talvez pudesse ter passado na casa de Elena para esclarecer as coisas ou ter ignorado Renesmee desde o início... Eram muitos "talvez", mas nenhum deles mudaria o rumo das coisas agora.

Minutos depois da batida, o carro vermelho de Nessie para no local. Ela diminuíra a velocidade por causa da chuva e, por isso, tivera tempo de ver e reconhecer o carro de Harry na beira da estrada.

― Harry! – chama ela, saindo do próprio veículo e indo até o dele, deixando-se molhar pela chuva.

Ela estava tão desesperada com a gravidade do acidente, que não pensou duas vezes em pegar o celular e ligar para a casa de Charlie, em busca de ajuda. Contudo, Nessie sabia que precisava fazer alguma coisa, que não podia simplesmente deixá-lo ali até a ajuda chegar, e, por isso, tentou fazer algo, arrancando a porta que a impedia de chegar até ele. O próximo passo seria o de remover a árvore, mas seu lado humano logo gritou em protesto, não aguentando o esforço excessivo.

Barulhos de freios se fizeram ouvir na estrada, deixando Renesmee mais aliviada. E foi neste momento que a híbrida se permitiu a um ato ousado, aproximando-se do mestiço ainda inconsciente, tentando alcançar sua boca. Porém, ao ver que não conseguia, Nessie se contenta com um beijo em seu queixo.

― Tire essa boca nojenta do meu namorado agora mesmo!