Dusk (Sombrio) escrita por MayaAbud


Capítulo 5
O Bom Filho... e todo esse blábláblá


Notas iniciais do capítulo

"A casa é assombrada
Eu apenas quero sair para um passeio
Fora e adiante
Antes que eu apague a luz desse quarto
Deixado para sempre sozinho e pelos crimes não limpos
Com minha paciência perdida
Alguém me levou pra longe daqui
Queimando essa gasolina"
—Gasolina, Audioslave



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Eu estive muito consciente de mim mesmo desde que Leah dissera aquilo, sobre voltar. Eu Jacob Black; Consciente de que eu gostava do som de um motor potente; que gostava de ovos e salsicha no café da manhã; e ainda consciente de que eu fora detrerido por alguém frio, um cadáver bebedor de sangue...



Ainda doía, no entanto, não era algo entorpecedor e atordoante como havia sido, agora era como assistir a um filme, um sofrimento que não era meu e que, de alguma forma, não era mesmo. Olhando agora, como minha humanidade desperta depois de tanto tempo tudo parecia ter sido há uma vida inteira atrás, parecia tanto tempo... Era até estranho pensar que eu sou quem tinha vivido e que era da minha vida de que se tratava tudo aquilo.

Estiquei minhas patas dianteiras à minha frente e repousei minha cabeça nelas, lembrando de como era ter mãos e polegares... Eu estava peludo, cinco anos sem cortar os cabelos me fazia parecer bem maior do que eu era. Se humano eu teria os cabelos tão longos como quando eu era um menino, antes de toda essa loucura de lobos e vampiros se tornar real, real demais para mim.

Meu pai e minhas irmãs não saiam de minha mente... Meu pai não tinha uma saúde muito boa, não andava por causa de um agravamento no diabetes, ainda não precisou amputar nada, mas talvez acontecesse, e eu devia estar lá para quando ele precisasse. Nesse momento, sem comando ciente eu me levantei e um ganido saudoso vibrou por minha garganta enquanto eu olhava para o norte na direção da minha casa.

***

Eu não tinha certeza de quando decidira realmente procurar Leah, só admiti minha decisão quando já estava nos arredores de Seattle. Eu estava inquieto com a perspectiva de ter duas pernas novamente, temia também a enxurrada de emoções humanas.

Nos dias que eu levei para fazer todo o caminho de volta pelo continente, Leah não havia se transformado. Ela não sabia que eu estava rondando a cidade. Para evitar ser visto eu esperei a madrugada, pois havia um trecho da cidade que eu teria de atravessar: era correr nu pela cidade ou correr como um lobo, e como lobo eu seria rápido o bastante no momento em que o fluxo de carros diminuísse nesse trecho.

Havia pouco mais de dois anos Leah se mudara do pequeno apartamento que alugou cinco anos atrás para uma pequena casa em direção às montanhas. Ela achava mais viável ter uma floresta como quintal do que ter de procurar um parque ou atravessar a cidade em busca de abrigo para sua forma lupina. Leah se orgulhava de sozinha já ter pagado metade de sua casa.

Quando o movimento naquele trecho diminuiu o bastante para que eu corresse na avenida sem ser visto por nenhum motorista, eu corri provavelmente uns 15 km por segundo. Tudo o que eu devia fazer era virar uma esquina e correr até o final da rua, onde as árvores eram como um dedo de floresta estendendo-se na rua sem saída. Foi o que eu fiz, embrenhando-me nelas, até que o corredor de árvores se alargasse. Eu podia ouvir que não estava longe de casas, ouvia ao longe corações batendo e sentia-se o cheiro humano mesmo dali, as vezes eu saía em algum quintal e retornava à floresta, e então eu senti o cheiro fraco e familiar de Lee. E a partir daí foi fácil encontrar sua casa

A casa em madeira escura e envernizada mais parecia um chalé, era bonita e tinha até uma chaminé no telhado, ficava pouco mais de um quilometro de distância das outras casas, a terra ali era levemente inclinada indicando o inicio da subida pela montanha.

A luz da pequena varanda estava acesa e do meu ângulo de visão aquela era única luz acesa na casa, No entanto haviam vozes baixas e risos, então notei o reluzir de um carro, inclinei-me um pouco mais, para ter certeza de que era disso que se tratava, já que alguns dos galhos a minha frente me impediam de ver. No segundo que levei para perceber o movimento dentro da casa e concluir que Lee não estava sozinha, eu ouvi mais atentamente os sons na casa e... Eca! Bufei, ganindo meu nojo e desejando não precisar estar na cabeça de Leah tão cedo.

Por fim achei melhor avisá-la de que eu estava ali, ou ela me mataria quando soubesse que eu fiquei escutando, embora escutar Leah, fazendo o que estava fazendo não fosse nada animador, afinal eu e o bando todo já levamos muito esculacho dela quando éramos pegos pensando no pouco que víamos dela quando ainda explodia das roupas por qualquer coisa. Sendo assim, emiti um som baixo e áspero, algo como um ronronar contínuo ou um ruivo longo e baixo, àquela distância apenas ela ouviria.

Em poucos minutos ela estava colocando um cara... Eu era muito seguro da minha sexualidade pra admitir que ele era bem bonito, meus pelos se eriçaram ao lembrar que a última vez que pensei isso o cara era Edward Cullen e eu ainda era apenas um menino encantado pela garota mais velha, filha do amigo de meu pai... Sacudi-me livrando-me da lembrança, enfim Leah colocava o cara para fora. Ela o enxotou enquanto amarrava um quimono de tecido reluzente na cintura, à sua frente o cara calçava os sapatos pulando num pé só, e falava tentando convencê-la a ficar mais tempo. Leah disse-lhe que não e o entregou sua camisa rindo, os olhos vacilando em minha direção, mas ela não me viu. Sentei esperando quando ele a envolveu pela cintura e a beijou profundamente, até que ela o interrompeu empurrando-o pelos ombros e gargalhou, um som genuíno, como nas memórias adquiridas de Sam há uma vida atrás, de quando tudo era mais fácil.

Ele dava partida no carro quando ergui os olhos da terra úmida, o som se afastava e Leah desceu de pés descalços vindo em minha direção, então eu a olhei realmente. Claro que eu já sabia, por anos de exposição aos seus pensamentos, que ela deixara o cabelo crescer novamente, mas só agora eu enxerguei de verdade a mudança, estava pouco a cima do seio, ainda não eram longos como já foram um dia...

Dei alguns passos saindo da proteção das árvores, por instinto emitindo em gemido baixo e agudo, como se me rendesse, Leah estava certa, era hora de voltar e fazer algo positivo por minha própria vida. Leah como a boa amiga que era sorriu ternamente, os olhos escuros eram aconchegantes.

Não sei quanto tempo fiquei meio que em choque, Leah não disse nada, embora se movesse pela casa. Já estava amanhecendo quando enfim me movi. Mover-me daquela maneira parecia tão errado, sem falar na estranha vertigem que era a sensação de desequilíbrio causado pela falta de mais dois apoios. Leah havia me dado uma bermuda de Seth que dormia aqui às vezes, quando não conseguia ir da faculdade para Forks todos os dias. Leah havia trocado as roupas de cama do quarto que Seth usava para que eu descansasse.

_Não acostume, é só por hoje_ ela disse se referindo ao cuidado que estava tendo, de me preparar uma sopa e arrumar o lugar onde eu dormiria. Eu sorri em resposta, sentindo-me ainda fora do ar, acostumando-me aos sentidos limitados e ainda assim fantásticos de ser um lobo na forma de homem.

Eu gemi quando experimentei a sopa de carne que Leah me preparou. Meu paladar tinha esquecido o milagre do fogo, carne crua enchia e alimentava, mas nada se comparava a comida temperada e cozida. Era simplesmente fantástico comer se deliciando com a festa de sabores. Leah riu da minha cara, mas logo parou diante da minha careta de dor. Meu estômago recebeu a primeira, e as seguintes, colherada com um gorgolejo assustador e doloroso, eu não tinha comido durante a viagem de volta.

Também era estranho deitar numa cama, ter quatro paredes a minha volta, me fazia sentir quase claustrofóbico, levantei e abri a janela, deixando a brisa ainda enregelante do dia quase amanhecido entrar, de olhos fechados eu poderia me enganar que estava a céu aberto, não era de todo mau ser um lobo solitário...

Jacob!, a voz assustada me chamava. E embora eu buscasse a minha volta eu não encontrava nada, o sol era ofuscante em minha visão e muito quente em minha pele. Uma risada ecoante e familiar ribombou a minha volta. Bella?, pensei em chamar, mas não era risada dela. Jake!, e então seus olhos tão cálidos e aconchegantes estavam ali, da cor de chocolate ao leite,bem diante de mim, tudo a minha volta se refez e eu soube porque tudo estava tão claro, estávamos no alto da montanha, e eu ainda não acreditava realmente que ela me beijaria, não com ele tão perto, bem, era perto o bastante para mim e ele, talvez não para ela. Eu a trouxe mais para perto, sendo rude em minha intenção de mostrar a ela a diferença, que eu poderia abraçá-la realmente, beijá-la realmente... Depois, não era a mesma Bella, tão doente, tão frágil, se agarrando a vida com tudo o que podia por causa do monstro filho do sanguessuga... Jake...!, a voz agora era como se me consolasse e discordasse de tudo ao mesmo tempo...

Abri os olhos enfurecido, suado e ofegante. Eu não tinha absoluta certeza do que havia sonhado, mas os olhos castanhos de Bella não saiam de minha cabeça. Trinquei os dentes tentando controlar meu estômago e meus tremores. Uma batalha eu perdi, corri até o banheiro no corredor de acesso ao quarto e despejei no sanitário todo o ácido em meu estômago.

Olhei meu reflexo no espelho depois de lavar a boca, eu não mudara absolutamente nada em todo esse tempo. Exceto a barba rala que não crescia muito mesmo e os cabelos pretos e lisos, abaixo do ombro. Eu não era mais um menino, era um homem agora, embora ainda não tivesse certeza de quantos anos de vida completei. Não tinha ainda qualquer perspectiva do que ia fazer agora, ainda me sentia fora do ar, fora do lugar, mas eu não tivera tempo o bastante tivera. Estava ansioso. Optei por tomar um banho frio. Olhei ao redor procurando toalhas, e achei um bilhete de Leah:

Fui ao supermercado, na primeira gaveta tem o que você talvez precise e na segunda, toalhas. Volto logo.

Não eram nem oito da manhã, o que queria dizer que eu não dormira muito, afinal. Na primeira gaveta do balcão do banheiro, havia aparelhos descartáveis de barbear, cremes depilatórios de Leah, preservativos, eu fiz careta, ligas de prender o cabelo. Fui para a segunda gaveta, depois de decidir que seria bom fazer a barba, e peguei uma toalha.

Depois do banho, concluí que eu não poderia continuar usando as roupas esquecidas de Seth, o que me levou a pensar que eu precisava arranjar um emprego, e isso me fez lembrar que eu sequer terminara o colegial e conseqüentemente me fez imaginar se voltar teria sido mesmo uma boa idéia. Deixei minha cabeça cair, batendo com a testa na pequena mesa da cozinha de Lee. E fiquei ali fitando de muito perto as riscas escuras inerentes da madeira clara. Até que meu estômago roncou, já recuperado do acesso de fúria de logo cedo. Levantei e abri a geladeira encontrando o necessário para fazer um sanduíche. O pão fresco no balcão da cozinha me deu água na boca. Dei uma mordida antes mesmo de rechear as fatias. Enquanto mastigava me deliciando com todos os sabores deixei meus olhos vagarem pela cozinha e indiferentes encontrarem um calendário preso com um ímã à geladeira. 2012 saltou aos meus olhos, e eu engoli o bolo mastigado à força. Mas o que eu esperava? Eu sabia que passara cinco anos fora, na verdade quase seis; era outubro, outubro de 2012. Eu contara cinco natais, por isso pensei cinco anos, mas o sexto natal já batia à porta.

Leah entrava em casa nesse instante e falava ao telefone, um telefone móvel, um celular. Ela se despediu da pessoa com quem falava e colocou o aparelho em cima da mesa junto da bolsa, enquanto colocava algumas sacolas no balcão e outras numa cadeira, e então disse:

_Essas aqui são suas. E a propósito, como está?

_Celular bacana_ falei levando meus olhos do aparelho de volta ao calendário.

_Bem vindo ao futuro_ disse ela suavemente, mas continuou me olhando, esperando resposta, o que ela disse mesmo? Ah!

_Sim, eu estou bem. Minhas?_ fitei as sacolas que não eram de um supermercado.

Leah avançou remexendo nas sacolas e tirou de lá uma camiseta masculina e a desdobrou diante de si para que eu visse, e que eu fitei sem reação.

_Eu acho que meu pai não deve ter doado minhas roupas, Leah.

_Mas você não está na casa de seu pai, a não ser que queira continuar vestindo as roupas que Seth deixou aí._ ela disse devolvendo a blusa à sacola.

_Tudo bem, obrigada, Lee, prometo que pago assim que..._ ela me interrompeu e eu dei mais uma mordida em meu sanduíche enquanto a ouvi dizer:

_Ah, poupe-me Jake!

Eu não tinha idéia de quando Leah se tornou Lee para mim. Acontece que a partir de que começamos a dividir nossas dores e ela se mostrou muito diferente do que costumava ser no bando e mais parecida com quem era antes de ser magoada por Sam e ter que viver na mente dele vendo como ele lamentava tudo e a queria longe, foi fácil gostar dela. Vê-la como uma amiga, dessas que te diz umas verdades bem duras, mas continua ali para dar o ombro para você chorar. Ela me deixou pensar nela assim, e como eu estava mais acostumado a pensar que a falar, simplesmente saiu. Ela não pareceu se importar, talvez ela estivesse mais curada que eu. Afinal ela se esforçara para isso, ela se reconstruíra enquanto eu lamentava sobre meus próprios escombros.

_Ah, não surte, eu avisei ao seu pai que você está aqui e que logo aparece por lá._ disse ela num fôlego só. Eu não sabia o que responder.

_Tome seu tempo, faça como quiser, não me importo, mas ele tinha que saber_ o olhar de Lee era muito grave enquanto ela falava, eu apenas assenti, e ela afagou meu ombro enquanto passava por mim a fim de guardar as compras, um olhar quase maternal em seu rosto, parecido com a forma como ela olhava para Seth.

_Eu não sabia que estava namorando_ falei tirando as compras das sacolas e passando para ela, a fim de que guardasse, eu não queria dar margem para minhas emoções e pensamentos.

_E não estou, acho eu_ respondeu e ficou pensativa.

_O cara parecia gostar de você, na hora de se despedir, quero dizer.

_Eu sei do que ele gosta_ ela sorriu com malícia.

_Ah, poupe-me você, por favor!_ isso era nojento, coitado de Seth, sendo o irmão. Lee gargalhou.

_ Ele esteve indo a clínica para ser massageado por mim três vezes por semana durante cinco meses seguidos, até que enfim achei que não seria tão mal... Eu sou solteira ele também..._ ela suspirou.

_Claro-claro_ falei lhe passando alguns sacos de fritas.

Leah era uma mulher muito bonita, a pele perfeita em tom de cobre, os cílios escuros espessos e longos, um corpo escultural, um rosto adorável... Qualquer homem desejaria ter uma mulher bonita como ela. O homem que tivesse ao seu lado uma mulher forte como ela seria um grande sortudo. O cara por quem ela, quem sabe, tivesse um imprinting seria muito feliz, tendo ele nascido ou não.


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