Eu não sei exatamente como Tom conseguiu acalmar o meu pai e particularmente também não quero saber, na verdade tudo que quero é deixar essa casa o quanto antes. Mas enfim, quando eu acordei Tom estava ao meu lado e basicamente se convidou para ir comigo até o Ministério, como já comentei Tom não é do tipo romântico então eu realmente estranhei o seu comportamento, mas não tinhas um tipo de acordo silencioso sobre não fazer muitas perguntas.

- Tomo cuidado está bem, não quero ter que vir salvá-la outra vez.

- Hilário Tom, não vê que eu estou morrendo de rir?

- Com essa resposta você acabou de me dar a certeza de que está bem.

Eu apenas revirei os olhos enquanto ele aparatava para o Beco Diagonal e fui trabalhar coisa que me permitiu não pensar sobre o que acontecera na tarde anterior até porque graças a Merlin consegui não cruzar com o meu pai durante todo o dia. Quando retornei para casa encontrei minha mãe cantarolando na cozinha como se nada tivesse acontecido o que não me surpreenderia nem um pouco, já que é o que minha família sempre faz.

- Mira querida, eu estava começando a arquitetar as coisas para o seu casamento e posso lhe garantir que ele será maravilhoso.

- Tom e eu não queremos nada grandioso, mãe, apenas a família e alguns amigos mais íntimos.

- Mas Mirach, é um casamento! Tem que ser grandioso.

- Não tem que ser e não será.

- Se é o que você quer de verdade. – Ela falou embora claramente estivesse desapontada.

- Obrigada. – Falei já me preparando para subir para o meu quarto.

- Você está bem? – Ela perguntou de súbito, me fazendo congelar, afinal não me lembrava dela alguma vez ter me feito essa pergunta.

- Quer a verdade? Não mamãe eu não estou bem, mas não preocupe, eu vou ficar, afinal não é isso que eu sempre faço?

- Não precisava ser tão rude Mira, eu faço o melhor que posso.

- E vem fazendo um excelente trabalho, não é mesmo? Pelo que me lembro você o viu levar a minha irmã embora e não fez nada! Viu que Othy não quer realizar os sonhos que vocês sonharam para ele e não o apoiou! Eu fiz isso mãe, eu tentei tomar conta deles, tentei ser eu mesma e o resultado foi perder Liandan e o que você mesma viu acontecer ontem quando curiosamente você também não fez nada a respeito. Quer mesmo que eu acredite que esse é o melhor que isso é o melhor que a senhora pode fazer?

- Eu sei que não fui a mãe que você esperava, por Merlin, eu sei perfeitamente bem que não fui uma boa mãe, mas precisa jogar esses fatos na minha cara.

- Eu discordo, você foi uma mãe excelente para Argos e Ignatio, pena que eu não posso dizer o mesmo em relação aos seus filhos que são as ovelhas negras da família.

- Diga o que queria que eu tivesse feito Mirach? Você sabe que não posso ir contra o seu pai!

- Não pode ou não quer? – Perguntei fazendo com que ela ficasse em silêncio. – Tudo que eu queria era tivesse tentado nos proteger, que tivesse nos apoiado. Eu só queria que quando todos estavam contra mim por eu ser diferente você tivesse me dito que eu não era louca. Eu queria que ao menos uma vez tivesse dito que me amava!

- Eu errei com todos os meus filhos, com você principalmente, mas não posso mudar o fato de que sem o seu pai eu não seria ninguém, não teria nem mesmo um lar ou uma família.

- Você poderia ter tido tudo isso, poderia se sustentar por sua própria conta, sem o meu pai teria se tornado uma grande estilista, como de fato se tornou, mas não precisaria esconder todo o seu potencial. Eu também quero um dia ter a minha família, embora você, e a maioria das pessoas, pense o contrario, mas eu sei do que sou capaz e a onde posso chegar e pode ter certeza, mãe, de que não desistirei enquanto não chegar lá.

- Eu não tenho a sua coragem, sabe bem que jamais a tive, não teria sido capaz de ir contra tudo e todos, de quebrar todos os limites como você faz, como você sempre fez. Mas a onde isso te levará Mirach? O mundo não está pronto para pessoas como você, minha filha.

- Sabe a onde isso vai me levar mãe? Vai me levar em frente e pouco me importa se o mundo está ou não pronto, eu darei um jeito dele estar.

Nós duas permanecemos em silêncio encarando uma a outra, os olhos castanhos dela contra os meus cinza, mas por mais que eu tente negar eu sei qual é a verdadeira diferença entre nós duas, ela é submissa, assim como a quase totalidade das mulher da minha época, enquanto eu não me permito baixar a cabeça diante de ninguém.

Entretanto a verdade era que por mais que eles me fizessem sofrer eu os amava, meus irmãos, minha mãe e até mesmo o meu pai, e talvez essa seja a razão de suas atitudes me ferirem tanto. Tudo que eu queria, tudo que eu sempre busquei, era uma palavra de reconhecimento, de orgulho, por que eu sou e não por quem eles queriam que eu fosse. Com o tempo endureci meu coração para que nada mais pudesse me afetar, tentei em vão deixar de amá-los, mas toda vez que eu pensava ter conseguido alguma coisa acontecia trazendo esses sentimentos para me assombrarem novamente. Ninguém que me conheceu seria capaz de acreditar se eu contasse, mas bem no fundo eu sabia que continuava a buscar o reconhecimento deles.

- Eu falei com seu pai ontem à noite. – Ela falou quebrando finalmente o silêncio e os meus pensamentos. – Ele concordou em dar uma pequena casa a você e Tom como presente de casamento.

- Não é necessário. – Resmunguei embora fosse mentira, ainda não tínhamos como comprar uma casa própria.

- Não seja orgulhosa, vocês não tem onde morar e nós duas sabemos disso. – Ela comentou como se lesse os meus pensamentos.

- Se faz tanta questão.

- Eu faço sim, e como manda a tradição você pode escolher qualquer coisa da família para levar com você.

- Eu quero Ink. – Falei rapidamente com meus olhos voltando a brilhar.

- Quer o elfo doméstico? – Ela perguntou descrente.

- Sim e estarei fazendo um favor, nós duas sabemos que papai o odeia, tenho certeza que ele adoraria se livrar de Ink e comprar um novo criado que satisfaça a seus critérios.

- Irei falar com ele, mas não creio que ele negue.

- Nem eu. – Respondi finalmente subindo para o meu quarto.

Uma vez lá dentro comecei a trabalhar em uns papéis que Kipling me entregara e só sai para o jantar, que, diga-se de passagem, foi muito silencioso, principalmente porque Othy teoricamente estava na casa de um amigo, embora eu soubesse que na verdade ele estava se encontrando com Aurora. Ao término da refeição me fechei novamente em meu quarto e me deitei para ler um pouco, mesmo que tenha caído no sono poucas horas depois.

Fui despertada pelo barulho da porta se abrindo, mas fingi que continuava dormindo, pois pelo som dos passos não se tratava nem de Othy nem de Ink.

- Minha menina. – Minha mãe falou afagando meus cachos castanhos. – Você cresceu tão rápido que já não é mais minha garotinha, mas você sempre foi madura para a sua idade e embora eu não demonstre estou orgulhosa de você. Orgulhosa da mulher que se tornou e do futuro que construiu.

Eu senti uma única lágrima rolar por minha face, mas ela não pareceu perceber ou ao menos fingiu que não.

- Eu não fui a mãe que você esperava e merecia, me perdoe, minha Mirach, minha estrela*, mas você nunca precisou de nenhum de nós para brilhar.

Eu sabia que ela estava chorando quando deixou o quarto, mas eu sorria e quando consegui dormir novamente desfrutei de uma noite de um sono doce. Depois de anos eu encontrara o sempre busquei, podia não ter sido da maneira ideal, na calada da noite quando eu supostamente estaria dormindo, mas eu aprendi desde pequena a me contentar com pouco e por hora isso me bastava.