Premonição 5: Água Negra escrita por Lerd


Capítulo 1
Um Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Primeiro capítulo da quinta fanfic! Yay!
Nesse capítulo ainda não ocorre o acidente. Ele acontecerá no próximo, com muitos detalhes. Galera que sempre comenta minhas fanfics: continuem comentando! *-* E os que nunca comentam, mas leem (sim, eu sei que vocês existem): comentem, POR FAVOR! Nem que sejam duas linhas. Comentários me incentivam DEMAIS a escrever, e eu desanimo a escrever quando ninguém lê ou comenta. Façam um esforço! *-*
E pra quem ainda não viu, os personagens dessa fic: http://premonicaofanficsource.blogspot.com.br/2012/09/cast-premonicao-5-titulo-oficial-ser.html
Enjoy!



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Emily colocou o gato no chão e sacudiu suas roupas. Mal teve tempo de voltar a sentar-se na frente do computador, e o irmão já a chamava do andar de baixo:

— A janta tá pronta! Vem rápido se não esfria! — Johnny falou, e a irmã ouviu apenas um resquício da frase.

A garota desceu as escadas com rapidez, sendo seguida pela Senhora Bigodes, que miava irritantemente. Já era quase nove horas da noite, e Johnny comia animadamente sentado à mesa. Emily sorriu ao vê-lo ali. Sempre sorria quando percebia o quão bem as coisas estavam. Tinha um emprego que amava, um namorado que amava mais ainda, e morava com um irmão que amava mais que tudo, e isso não era tudo.

Emily era também bastante bonita. Magra, alta, com membros compridos e finos. O rosto era agradável, não extraordinariamente belo, com gentis olhos purpúreos, nariz empinado e boca fina e delicada. Os dentes e as orelhas eram deveras grandes, mas a garota não ser importava com aquilo. Emily também tinha belos cabelos dourados, que pendiam finos e esvoaçantes em suas costas. Ela costumava usá-los em uma trança desajeitada que caía por seu ombro esquerdo. As sobrancelhas eram mais escuras e grossas, mas também igualmente belas.

— Macarronada de novo? — A garota reclamou.

— Se tá incomodada aprende a cozinhar. — Johnny respondeu, comendo mais uma garfada da macarronada.

Emily sentou-se à mesa e pôs-se a se servir.

— Ainda bem que hoje é o último dia desse martírio alimentício. Durante os próximos quinze dias nós vamos finalmente comer como reis!

— Como você tem tanta certeza? A tia e a vó podem muito bem cozinhar tão mal quanto eu ou você. Vai que é genético? — E riu.

A garota deu com os ombros.

— Esqueceu que o Mikey vai com a gente?

— E...?

— Você jura que não tá lembrado da torta de limão que ele levou pro aniversário da Jade?

— O que tem aquela torta? Deve ter pra vender lá em Miami.

— Foi o Mikey que fez! — Emily falou animadamente.

Johnny quase cuspiu o suco que tomava.

— Uau! Além de rico, bonito, inteligente e bem sucedido, meu cunhado também é bom de cozinha? Emily, que tipo de macumba você fez? — O irmão falou, e a garota deu com os ombros, rindo.

— A mesma macumba que você fez para conseguir a Jade.

Johnny era um rapaz bastante bonito. Parecia uma versão masculina de Emily, e muitos julgavam que eles fossem gêmeos. Mas não era a verdade, o rapaz era dois anos mais velho que a irmã. O rosto dele compartilhava os mesmos traços do dela, embora tivesse o adendo dos dentes menores e perfeitamente alinhados. O cabelo dele era mais escuro também, de um castanho claro, e vivia penteado de forma metódica. O rapaz fazia o tipo “certinho” e vestia-se sempre formalmente, com ternos, gravatas, coletes e camisas polo. Emily considerava-o bastante brega, mas era uma visão agradável de um irmão mais velho responsável. Estava quase se formando em direito, e com certeza seria um belo e bem-sucedido advogado.

Os dois estavam se preparando para uma viagem que fariam até a casa de sua única tia materna e da sua avó, em Miami, Flórida. Eles iriam a bordo de um navio chamado “Rainha Fohtaed”, que partiria da cidade deles, Houston, no Texas. A viagem prometia ser extremamente divertida. A começar pela lista de pessoas que iriam com eles.

A garota estava levando seu namorado, Mikey. Johnny por sua vez levaria sua namorada, Jade. Juntando-se aos quatro, estava o irmão gêmeo de Mikey e cunhado de Emily, Ajay. Havia também Krista, melhor amiga de Emily. E, por fim, o grupo encontrar-se-ia com Francis, primo de Johnny e Emily e que os guiaria até a casa da mãe dele. Sete pessoas, e a garota temia não conseguir dar atenção suficiente a todas elas. Bom, a Jade é assunto do Johnny, e o Ajay não vai ficar chateado se eu não der atenção a ele. Krista também, ela já é bem grandinha e me conhece há mais de quinze anos. O problema é Francis. Nós não nos vemos desde que ele tinha doze anos, e depois do acidente...

Além disso, havia o garoto do Egito. Leon era o nome dele, não era?

Pensar nele trouxe fez uma onda de eletricidade percorrer todo o corpo de Emily. Ela o considerava apenas um bom amigo, até o dia em que Mikey desvendou o segredo do garoto e fez Emily perceber com clareza onde estava se metendo.

Acontecera dois dias antes.


x-x-x-x-x


Emily diz:

Vai ser divertido demais! Mal posso esperar para te conhecer, Leon!

Leon diz:

Não é? Também estou ansioso para te conhecer. E ao seu namorado também, ele parece ser um cara muito bacana.

Emily diz:

E ele é! Aliás, você não vai conhecer só ele, vai conhecer a família toda: meu irmão, minha cunhada, meu cunhado, um primo, minha melhor amiga...

Leon diz:

É muita gente mesmo!

Emily diz:

E você vai trazer alguém contigo?

Leon diz:

Só uma amiga que veio junto do Egito, a Abi. Na verdade nós não somos nem amigos direito. Somos apenas conhecidos. Meu pai me apresentou pra ela quando ele soube que eu estava vindo para os Estados Unidos, e nos fez prometer que nós faríamos companhia um para o outro até voltarmos para casa. Ela veio pros Estados Unidos gravar um comercial de perfume qualquer.

Emily diz:

Isso é hilário.

Leon diz:

Você acha? Haha. Vinte e seis anos nas costas e meu pai ainda acha que eu preciso de babá.

Emily diz:

Meus pais fariam a mesma coisa, tenho certeza.

Foi quando Mikey entrou no quarto. Emily virou-se no mesmo instante, e recepcionou o namorado com um beijo, embora sem levantar da cadeira. Mikey encurvou-se atrás dela e abraçou-a por trás. Disse:

— Falando com quem?

— Com aquele meu amigo do Egito, o Leon. Lembra que eu te falei dele?

— É o cara que tirou aquelas fotos maneiras dos escaravelhos?

— Ele mesmo.

— Ah! — Mikey assentiu, e deu um beijo no topo da cabeça da namorada.

Mikey era um rapaz bastante bonito, embora seu tipo de beleza não fosse óbvio. Era extremamente alto, e bastante esguio. Os cabelos e os olhos eram escuros, pretos mesmo, e ele estava sempre sorrindo. O rapaz tinha uma bocarra enorme, com dentes perfeitamente alinhados e brancos, e um nariz grande e reto. Às vezes Emily achava que ele tinha cara de doninha, mas isso devia ser porque Krista vivia fazendo aquela comparação.

— Eu vou te dizer de novo, princesa: esse cara tá afim de você. — Ele disse.

— Não tá não, Mikey!

— Como você sabe? Pra mim esse papo dele é clássico de cara apaixonado. Vocês conversam há quanto tempo? Um ano?

— Mais ou menos isso. Eu o encontrei num fórum de fotografias... Eu mesma o adicionei.

— Ainda sim... Você não devia dar tanta trela pra ele.

Emily virou-se e olhou nos olhos do namorado.

— Você está com ciúmes! Own, você está com ciúmes de um cara que está do outro lado do mundo! — E começou a beijar as bochechas de Mikey com empolgação, enquanto o rapaz fingia-se de ofendido. — Pois não precisa ter ciúmes do Leon. Ele é gay.

Aquilo pareceu animar Mikey levemente.

— Como?!

— Pois é.

— Ele te falou isso?

— Não com essas exatas palavras, mas ele me contou sobre o ex-namorado esses dias... Um tal de Mike... — E Emily pôs-se a vasculhar as mensagens em seu facebook. — Aqui ó... — E apontou para a tela.


Leon diz:

Mieke era realmente especial para mim...

— Viu? Ele falando do tal Mike... — Emily falou.

Mikey riu largamente. A namorada fez cara de desentendida.

— Qual a graça? — Ela perguntou.

— Você é muito ingênua.

— Sou é? Por quê?

O namorado então pediu que ela se levantasse da cadeira. Emily assim o fez. Mikey sentou, e então pediu que ela sentasse em seu colo. O rapaz pegou o mouse e digitou na barra de pesquisas “Mieke”. Quando os resultados apareceram, ele olhou para Emily e perguntou:

— O que você tá vendo?

— Um monte de garotas, mas e daí? — E quando externou seu pensamento, foi que tudo fez sentido. — Mieke não era um ex-namorado, era uma ex-namorada!

Mikey fez uma expressão de “voilà”. Disse:

— Mieke é um nome comum de garotas na Holanda e em outros países da Europa. Sua confusão é compreensível, a escrita realmente lembra Mike, que aqui nos Estados Unidos é nome de garoto. O negócio é que: esse tal de Leon tinha uma namorada europeia e agora é solteiro.

Emily fez muxoxo. Não queria dar o braço a torcer, gostava da amizade de Leon. O rapaz era inteligente, e, mesmo morando do outro lado do mundo, no Egito, tinha muitas coisas em comum com ela. Talvez mais coisas do que Mikey...

— Tudo bem. Você está certo. O que me aconselha a fazer?

— Hmmmm... Nada. Você mesma disse: ele está do outro lado do mundo, eu não preciso ter ciúmes. Confio em você. — E então pensou um pouco. — Quero dizer... Agora ele está nos Estados Unidos né? — E continuou a ler as conversas de Emily com Leon. — Não faz mal, eu confio em você.

Emily sorriu. Beijou Mikey e colocou os braços ao redor do pescoço dele.

— Mas e a viagem? Quer dizer, o Leon vai estar lá.

— E eu também. Vai ser uma ótima oportunidade para nós nos conhecermos.

E sorriu também. Naquele momento Emily amou-o mais que tudo e todos. Mikey era perfeito para ela, em todos os aspectos. A relação dos dois já durava dois anos, e o rapaz já flertara com a possibilidade de pedi-la em noivado, embora Emily estivesse relutante. Ela ainda não tinha uma casa, morava em uma alugada com o irmão Johnny. Apesar de ter um emprego fixo, sua renda era baixa: Emily era professora recém-formada em uma escola de crianças especiais. Mikey, ao contrário dela, não tinha problemas financeiros. Era filho de um empresário e uma professora universitária, e acabara de formar-se como fisioterapeuta.

Mas Emily não gostava da previsão de ser sustentada por ele. Queria poder ser independente, por mais estranho que pudesse parecer.

— Bom, eu vou indo. O Ajay pediu uma carona da faculdade e eu já estou atrasado. — Mikey falou aquilo e despediu-se dela com um beijo.

Na tela, havia a mensagem:


Leon diz:

Ansioso para te ver. Nos vemos no Rainha Fohtaed. Beijos no seu coração.

Emily suspirou e fechou o notebook.

x-x-x-x-x

Ajay estava sentado no vaso sanitário fechado, enrolado em apenas uma toalha, enquanto Mikey executava movimentos precisos com a navalha em seu queixo, retirando os pelos que havia ali.

— Quieto Ajay! Esse negócio é perigoso, se você ficar se mexendo eu vou acabar cortando o seu pescoço. — O gêmeo reclamou.

— Tá, desculpa.

Ajay era a imagem e a semelhança de Mikey. Os dois eram completamente idênticos, e até mesmo a mãe de ambos os confundia algumas vezes. Os rapazes aproveitavam-se disso sempre que podiam: seja para fugir de castigos, seja para provocar os pais. Já tinham vinte e quatro anos, mas continuavam tão moleques como quando tinham seis.

— Você sabe que eu não queria ir nessa viagem né? — Ajay falou, de repente.

— Eu sei. Mas eu quero que você vá. Você é meu irmão, eu te amo, vai ser divertido. A Krista vai estar lá.

O outro bufou.

— Você quer que eu vá porque quer me mostrar o aleijado do primo da Emily.

Mikey parou de barbear o lado esquerdo do rosto do irmão e lavou a lâmina na torneira. Antes de recomeçar o trabalho do outro lado do rosto, disse:

— Isso é rude. A Emily disse que o Francis é muito educado e prestativo.

— Grande coisa. Pra vocês só importa o fato de ele ser aleijado. É por isso que vocês querem que eu vá. Querem que eu sinta pena dele, que eu me sinta mal por ter tentado... — E engoliu em seco. — Bobagem. Tudo isso. Eu não vou tentar aquilo de novo, nunca mais.

O irmão gêmeo continuou a barbeá-lo.

— Eu sei. Eu acredito em você. Mas uma viagem vai ser boa, pra todos nós.

Ajay bufou e inclinou a cabeça para que Mikey executasse melhor a sua tarefa. Ele assim fazia com maestria: não se arriscaria a deixar giletes, navalhas e lâminas de qualquer espécie ao alcance do irmão. Não depois do que acontecera. Estava disposto a barbear seu gêmeo pelo resto da vida, todos os dias, se esse fosse o preço para mantê-lo vivo. Parecia algo ínfimo diante do valor da vida do irmão.

O incidente acontecera pouco mais de um mês antes.

Mikey chegara em casa cansado de seu primeiro dia de trabalho. Os pais não estavam, haviam saído para assistir um concerto de ópera qualquer. Só Ajay estava em casa. Pensou que, já que havia chego mais cedo, os dois poderiam encomendar algumas pizzas, talvez até chamar Emily e Krista para virem ali.

— Ajay? — Ele lembrava-se claramente de dizer. Subiu as escadas de dois em dois degraus, e logo viu a luz debaixo da porta do banheiro. Decerto que o irmão estava ali. — Que me diz de umas pizzas, Jay? — Mikey disse, e não houve resposta. — Jay? Você tá aí?

Nada.

Um terror então tomou conta de Mikey. Não pensou duas vezes: arrombou a porta do banheiro com força.

E encontrou Ajay caído no chão branco, com uma poça de sangue enorme ao redor de si. Havia uma lâmina ensanguentada caída ao lado, e os pulsos do rapaz estavam claramente cortados.

Felizmente, nada muito grave aconteceu. Uma transfusão de sangue foi necessária, mas até isso fora simples: Ajay tinha uma réplica exata de si no mundo, e o irmão ficou mais do que feliz em salvar a vida de seu gêmeo. Daquele dia em diante Mikey e os pais criaram uma bolha de vidro ao redor de Ajay, e não o deixavam sozinho por mais de uma hora, jamais.

Ajay continuava inquieto, mas Mikey logo acabou a tarefa.

— Pronto. — Disse.

O gêmeo levantou-se e seguiu para fora, enquanto o outro ficava para trás enrolando as lâminas em uma toalha. Essa viagem vai fazer bem para ele, Mikey tentava convencer a si mesmo. Ele só precisa de companhia, e isso não vai faltar nessa viagem. Bendita tagarelice de Krista! É disso que o Ajay precisa... É disso...

x-x-x-x-x

— Eu preciso fazer xixi, mãe. — Pete reclamou, batendo seus pezinhos minúsculos no chão.

— Não da pra segurar até a gente embarcar, amor? O Rainha tem banheiro.

— Não dá. — E antes que Rebecca pudesse fazer ou dizer qualquer coisa, o filho abaixou as calças e começou a fazer xixi próximo de uma parede onde estavam. A mulher sentiu um rubor em suas bochechas, enquanto pessoas passavam ao seu redor. Depois se sentiu boba. Ele é só uma criança.

Não se podia dizer que Rebecca era exatamente bonita, mas ela não era feia. Mestiça e descendente de japoneses, a mulher tinha os olhos levemente puxados e escuros, com um nariz delicado e uma boca de lábios carnudos. Os cabelos estavam sempre presos atrás; fosse em um rabo de cavalo, fosse em um coque. Jamais soltos. Era uma clássica mãe solteira, com seu rosto amigável e que passava segurança; com sua confiança e coragem natural, e que a tornavam uma pessoa extremamente doce.

— Mãe... — Pete disse quase num gemido.

— O que foi?

O garoto soltou um risinho, mas em seguida fez muxoxo:

— Molhou... — E apontou para sua calça.

— Pete! Pelo amor de Deus, filho! — Rebecca reclamou. Retirou sua jaqueta jeans e amarrou ao redor das pernas do menino. — Agora tira. — O garoto entendeu errado pedido da mãe: desamarrou a jaqueta e jogou-a na poça de xixi.

Rebecca não conseguiu ter outra reação que não fosse rir.

Um risinho contido, mas que logo se tornou uma sonora gargalhada. Pete ria também, decerto feliz por não ter sido repreendido. Mas como poderia? Rebecca não conseguiria brigar com o garoto por fazê-la feliz.

Pete era uma coisinha adorável. Pequeno para um menino de seis anos, com seus gigantescos olhos escuros e brilhantes, seu sorriso inocente, os dentinhos tortos e as orelhas grandes.

— Seu boboca! — A mulher disse, e envolveu o filho no abraço mais duradouro que conseguiu.


x-x-x-x-x

Emily recostou a cabeça no banco do carro e olhou de relance pela janela. As ruas passavam com velocidade ao seu lado, enquanto o irmão dirigia o mais rápido que podia sem desrespeitar os limites de velocidade.

Johnny estava no banco da frente, com sua namorada Jade ao lado, no banco do carona.

Jade era tão bela quanto qualquer garota tinha o direito de ser. De rosto doce e angelical, com traços finos e pequenos olhos azuis esverdeados. Os cabelos eram bastante longos, passavam das costas, e eram loiros e cacheados. O sorriso dela era a coisa mais bonita da face da terra. As vezes Emily sentia inveja da beleza da cunhada, mas eram poucas vezes.

— Liga o rádio. — Emily pediu.

Jade tateou o aparelho e após alguns segundos ligou-o. A música rapidamente invadiu o veículo.


I'm feeling sexy and free

Like glitter's raining on me

You like a shot of pure gold

I think I'm 'bout to explode

— Eu amo essa música. — Jade disse, e pôs-se a cantar e a fazer movimentos ritmados com as mãos para a fora da janela.

Emily sentiu-se inquieta. Uma onda de eletricidade percorreu todo o seu corpo. Olhou para fora, e de relance pôde ver uma propaganda da cerveja Hice Pale Ale. Tentou lembrar-se se já havia tomado-a, mas não podia ter certeza. Não gostava muito de cerveja, embora já tivesse tomado diversas vezes.


Rock my world into the sunlight

Make this dream the best I've ever known

Dirty dancing in the moonlight

Take me down like I'm a domino


Então o celular de Emily tocou.

— Para a música, por favor. — Ela pediu, e Jade prontamente atendeu ao pedido da cunhada. Emily olhou no visor do aparelho, e atendeu o celular: — Onde você tá Krista?

— Acabei de chegar aqui no porto. O Mikey e o Ajay já chegaram também. E eu acho que seu primo também, mas não tenho certeza. — A garota do outro lado respondeu.

— E por que você acha que ele é o nosso primo então?

Houve um silêncio, como se Krista estivesse constrangida pelo que iria dizer.

— Ele é o único cara de muletas por aqui.

Emily engoliu em seco diante daquela resposta. Tentou recompor-se e então respondeu:

— Se ele estiver usando um cardigan marrom, é o Francis. Pode ir cumprimentá-lo, e avisa que nós já estamos chegando.

— Tudo bem. Beijinhos. — E Krista desligou.

Johnny estava curioso:

— O que ela queria? O Francis já chegou?

— Já. O Mikey e o Ajay também.

— Só falta a gente. — Jade falou, e Emily consentiu. — Posso ligar a música de novo?

— Claro.

E o carro seguiu pela rodovia o mais rápido que podia. Emily sentia-se inquieta como nunca. Sentiu o estômago embrulhar, e teve medo de que pudesse vomitar no carro. Vai piorar quando eu estiver em alto mar, pensou, mas não estava em condições de passar mal. Muita gente precisa da minha companhia nesse cruzeiro. Eu não vou decepcioná-los.

E fechou os olhos, procurando manter o almoço dentro de sua barriga.


x-x-x-x-x

Emily carregava várias malas quando viu um grupo de quatro pessoas acenando há alguns metros dali. Krista não deu tempo de a amiga chegar até ela, e rapidamente correu em sua direção, abraçando-a e fazendo malas voarem para todos os lados.

— Finalmente você chegou, vadia atrasada.

— Você que chegou muito cedo.

— Eu, o Tweedledee e o Tweedledum. — E apontou para Mikey e Ajay, que estavam esperando ao lado de um rapaz levemente conhecido por Emily.

— Você precisa aprender bons apelidos pelos quais chamá-los. Essas referências pretensiosamente literárias e cult não estão colando.

Krista riu, e ajudou Emily a pegar as malas. Johnny e Jade acenaram para elas e seguiram na direção do trio de garotos.

— Você sabe que eu gosto deles. Especialmente do Ajay, mas eu não me importaria de ter os dois se um dia você der um pé na bunda do Mikey.

Emily fez uma expressão de falso terror, e respondeu:

— Que nojo, Krista.

A amiga riu.

— Imagina só? Sempre tive essa fantasia, de ficar com gêmeos.

— Pois da próxima vez que tiver uma fantasia, mantenha meu namorado fora dela. — E riu.

Krista era muito bonita. Talvez bonita demais, e algumas vezes Emily temia por isso. Confiava em Mikey, e confiava na amiga, mas... A insegurança por vezes falava mais alto. Krista tinha o rosto milimetricamente esculpido, com olhos verdes acinzentados, nariz delicado e reto, e uma boca carnuda e vermelha. As bochechas estavam sempre coradas, dando-lhe uma aparência ingênua, o que nada tinha a ver com a sua personalidade maliciosa e sexy. O cabelo era menos imponente que o de Emily, e nem de longe se comparava com o de Jade. Mesmo assim era bonito: castanho escuro, com mechas douradas aqui e ali.

As duas foram encontrar com o quinteto conversando animadamente. Johnny e Jade estavam de mãos dadas, e conversavam com Francis. Mikey cumprimentou Emily com um demorado beijo, ao passo que Ajay ficou a trocar piadinhas com Krista. Com exceção de Francis, todos ali se conheciam muito bem, graças às festas que Krista organizava.

— Emily? — O rapaz aproximou-se lentamente, acanhado. O barulho das muletas dele chocando-se delicadamente contra o chão de madeira do cais assemelhava-se a batidas de um coração.

— Francis... — Foi tudo o que ela conseguiu dizer, e abraçou-o com delicadeza. O rapaz retribuiu da maneira que conseguiu, meio desajeitadamente. Quando o corpo de Emily encontrou-se com o do primo, ela sentiu a temperatura da pele dele. Ele é quente. É como se estivesse em chamas.

Francis mudara muito desde a última vez que a prima o vira. Os dez anos que separavam o garoto dentuço e a garota de cabeços embaraçados dos dois que estavam ali, havia feito bem a ambos. O primo tinha finalmente ganhado a aparência de um homem: um frágil homem, mas de qualquer forma um homem. Francis tinha os olhos doces e castanhos, um nariz grande e reto, e uma boca grande e delicada. Seu queixo era quadrado e imponente, e havia resquícios de um início de barba ali. O cabelo estava arrepiado e era repicado.

O rapaz pousou suas pernas de madeira e disse, num tom de voz que parecia um sussurro:

— Você mudou.

— Você também. Seus dentes, seu cabelo, suas...

— Minhas pernas. — Ele completou, e sorriu resignadamente.

Emily sentiu-se ficando vermelha.

— Eu ia dizer suas sobrancelhas... Elas finalmente são duas, quando nos vimos pela última vez elas eram uma só... — E riu timidamente. O rapaz seguiu-a no riso.

Mikey aproximou-se dos dois e cumprimentou Francis.

— Francis, esse é meu namorado Mikey. Mikey, esse é o Francis, de quem tanto falei...

O namorado de Emily então chamou seu gêmeo e o apresentou ao primo da garota. Ela então se afastou.

— Vamos tirar algumas fotos. — Decidiu-se. — Ainda falta tempo para o navio sair.

Krista bateu palmas e concordou. Emily retirou sua câmera de uma das malas e pediu para que todos se reunissem. Risos, muitos risos. E fotos. Muitas fotos, incontáveis. Emily deu por si cansada de tantos cliques. Apareceu em algumas: Krista exigira isso. Por fim eles estavam prontos para embarcar.

Pelo menos era isso o que Emily presumia, até finalmente encontrá-lo.

Leon.


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Notas finais do capítulo

Capítulo 2 com o acidente sairá em breve, já está quase todo escrito! :D



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