Destino escrita por Eve


Capítulo 40
Capítulo Quarenta


Notas iniciais do capítulo

Se eu disser que demorei mais do que pretendia a postar esse capítulo porque tinha perdido a folha onde escrevi o rascunho dele vocês me achariam muito ridícula ou só um pouco? Perdoem minha cabeça de vento e não desistam de mim.



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XL

 

 

Atena não estava mais se escondendo em seus aposentos, o que poderia ser considerado um progresso se ela não continuasse insistindo em não cumprimentar Poseidon quando se cruzavam nos corredores e ignorá-lo sempre que tentava iniciar uma conversa durante suas refeições cheias de um silêncio tenso. Até sua ajuda nas questões burocráticas do feudo ele havia perdido; Atena agora direcionava seus esforços apenas ao treinamento dos jovens intendentes e aos preparativos para a iminente chegada dos vassalos.

Poseidon não sabia como voltar a abordar aquele desentendimento com a esposa. Na primeira conversa que tiveram - se é que podia chamá-la assim - havia oferecido a anulação do casamento com a certeza de que Atena a aceitaria prontamente e então retornaria para sua antiga vida assim que possível, o deixando ali para curar suas mágoas sozinho como merecia. A recusa dela o surpreendeu, e surpresa ainda maior foi perceber que ela parecia de fato ofendida pela mera sugestão. Atena não costumava expor suas vulnerabilidades, disso ele bem sabia, mas a maneira como reagiu ao ouvir o que Poseidon dizia mostrava claramente que não era tão indiferente à questão quanto deixava transparecer: ainda conseguia lembrar-se claramente de seus olhos marejados e voz trêmula mesmo enquanto bradava furiosa.

A surpresa o havia deixado sem reação no momento e sem jeito de retomar o assunto depois. Havia decidido então esperar que ela tomasse alguma iniciativa em seu próprio tempo, mas à medida em que ela mostrava não estar disposta a retomar qualquer espécie de convívio amigável com ele tão cedo, aquela situação voltava a ficar insustentável.

Os Lordes que desfrutariam da hospitalidade de Atlântida durante o período de negociações para a guerra contra Cronos, acompanhados de suas comitivas, chegariam a seus domínios em questão de dias e não poderiam recebê-los daquela maneira; o casal de senhores, acima de qualquer outro aspecto do feudo, tinha de passar a estabilidade e confiança necessárias para conquistar o apoio e a simpatia dessas famílias que vinham de longe para prestigiá-los. Poseidon e Atena deviam portanto encontrar um meio-termo que fosse na relação que tinham para que parecessem um par harmonioso pelo menos a quem observasse de fora.

Foi com esse pensamento em mente que ele enfim reuniu coragem suficiente para, num dos dias de finalização dos preparativos no castelo, cruzar os lances de escada desde o seu gabinete até a torre que ela organizava no momento e pedir, após bater algumas vezes na porta já aberta apenas para anunciar sua presença:

— Atena, preciso falar com você.

Ela parecia bastante ocupada coordenando o rearranjo de alguns móveis e distribuindo itens como velas, penas e pergaminhos por cada mesa das diversas câmaras daquela seção, e não retirou a atenção do trabalho que estava fazendo para falar:

— Diga.

— Em particular. - Ele frisou como se fosse realmente necessário.

— Estarei na biblioteca assim que terminar aqui. - Ela replicou, ainda sem lançar um olhar em sua direção ou demonstrar qualquer consideração pelo tom urgente de sua voz. - Pode me esperar lá se quiser.

Ele engoliu uma resposta mais ríspida que poderia ter dado e retirou-se rumo à biblioteca porque não estava em posição de fazer exigências. Deparou-se com uma infinidade de servos no caminho, que subiam e desciam apressadamente as escadas levando móveis, itens de limpeza e o que mais ainda fosse necessário para deixar os aposentos dos convidados ainda mais impecáveis.

Poseidon não havia visitado propriamente a biblioteca depois da reforma que Atena conduzira no cômodo, e agora que o apreciava pela primeira vez percebeu como o espaço parecia bem melhor aproveitado com as mesas e poltronas complementando as estantes lotadas de manuscritos. Sentou-se num dos lugares próximos à janela e impacientemente aguardou que ela chegasse. Finalmente Atena apareceu, trazendo nas mãos alguns exemplares que guardou com muito esmero em seus devidos lugares. Poseidon levantou-se e pigarreou para chamar sua atenção. Atena concluiu sua tarefa e então aproximou-se, sentando numa poltrona que acompanhava a escrivaninha alguns passos à sua frente.

— Sim? - Ela perguntou, suas mãos unidas no colo e expressão que não denunciava nada do que se passava naquela mente complicada.

— Nós não podemos continuar assim. - Foi como ele começou. Ela recostou-se melhor na cadeira e apenas ergueu uma sobrancelha. Poseidon já previa que aquela seria uma conversa difícil. - Por que escolheu ficar aqui se nem ao menos fala comigo?

— E o motivo para que eu permanecesse deveria ser você? - Ela questionou calmamente, e a verdade era que o título e o status de uma Lady Valence sozinhos seriam motivos suficientes para que ela não quisesse anular o casamento, mas ele não acreditava que Atena fosse esse tipo de pessoa.

— Então não pretende me perdoar?

— Você mesmo disse que não merecia meu perdão.

— Mas estou pedindo mesmo assim. - Ele arriscou, e o silêncio que perdurou enquanto se encaravam estava carregado de coisas não ditas.

— Eu não me importaria se você tivesse dito que tomaria uma amante. - Atena falou por fim, desviando o olhar para a paisagem do lado de fora da janela. - Sei que todos os homens casados as têm. Mas por que esperar até que eu estivesse fora para então trazê-la ao nos… Seu quarto e sua cama. A cama que dividíamos. Por que provocar rumores venenosos entre os servos e ferir meu orgulho dessa maneira?

— Ela não é minha amante. Eu não tenho e nem teria uma amante. - Foi o que ele conseguiu responder. Não sabia o que fazer com aquela confissão. Parecia até absurda a sugestão de que Medusa fosse sua concubina; a garota havia sumido depois da fatídica noite e ele não havia sequer se dado o trabalho de procurá-la. Se ela não tivesse aparecido no castelo, ele provavelmente nunca mais a teria visto uma segunda vez.

Atena riu e revirou os olhos ao que ele disse.

— Estou sendo sincero. Medusa é só uma garota da vila, não a conhecia há sequer uma semana quando… - Perdeu-se em suas palavras ao tentar explicar; não queria expor os detalhes sórdidos. - Nunca houve outra além de você desde que nos casamos.

— Até Medusa. - Ela corrigiu, num tom de quem claramente não acreditava em uma palavra do que ele havia dito.

— Sim, mas… - Ele involuntariamente passou a caminhar de um lado para o outro em uma tentativa de aliviar sua ansiedade. - Não significou nada. Eu estava confuso pela sua carta e…

— Carta? - Ela o interrompeu, franzindo as sobrancelhas. - Que carta?

Poseidon parou à sua frente. Havia refletido arduamente durante seus dias sozinho sobre se seria ou não uma boa ideia admitir que havia invadido a privacidade da esposa. Ainda não estava totalmente decidido, e por isso hesitou antes de tirar do seu bolso o pergaminho agora já um tanto amarrotado. Ele o havia recuperado há alguns dias quando Atena saíra de seu quarto para o almoço. Estava no mesmo lugar que o havia deixado. Ele colocou a carta na mesa à sua frente e aguardou enquanto Atena rapidamente corria os olhos pela sua extensão.

— Onde encontrou isso? - Ela perguntou, voltando a encará-lo. Parecia surpresa pela primeira vez desde que havia sentado para ouvir o que ele tinha a dizer.

— No seu quarto, quando fui entregar o convite de Hebe.

— E então em vez de me questionar do que se tratava resolveu esperar que eu deixasse o castelo para se vingar deitando-se com outra mulher?

Parecia realmente estúpido quando ela colocava daquela maneira.

— Não foi uma vingança. - Ele replicou, mas havia incerteza na sua voz. - O que fiz não foi premeditado. Eu estava decepcionado e acabei me deixando levar.

Atena o observou longamente enquanto tamborilava os dedos na superfície de madeira da mesa e parecia refletir sobre a questão, não mostrando-se convencida.

— E por que estaria decepcionado?

Aquele questionamento o deixou sem fala por alguns segundos. Nem mesmo ela poderia esperar que ficasse indiferente ao ler aquilo.

— Pensei que depois de todo esse tempo e convivência juntos você tivesse pelo menos… - As palavras lhe faltaram.

— O quê? - Ela o desafiou a falar, alheia ao quanto o feria. - Mudado de ideia? Me apaixonado pelo seu respeito e cavalheirismo? Que tivesse me encantado com seu charme?

— Agora está sendo cruel de propósito. - Ele a interrompeu, e o canto dos lábios dela se curvou de forma maldosa. - Você sabe que eu...

— Não ouse. - Atena o cortou, e Poseidon engoliu o resto da frase prestes a deixar seus lábios. O espaço afundou em silêncio outra vez.

— Podemos fingir que está tudo bem enquanto os hóspedes estiverem aqui se é isso que o preocupa. - Foi ela quem interrompeu a quietude novamente. - Seremos o casal perfeito durante as festividades.

— Não é só isso que me preocupa.

Atena ignorou o comentário e desviou os olhos dos dele mais uma vez antes de perguntar:

— Ainda teria se deixado levar caso não tivesse lido essa carta?

Poseidon refletiu por um momento. Seu primeiro impulso era o de negar imediatamente aquela possibilidade, mas uma resposta honesta era o mínimo que lhe devia. Lembrou-se da situação: a bebida e a excitação sufocada de quem há meses não levava uma mulher para a cama, a oferta fácil dos gestos simples e fascinados da garota, e ele se conhecia bem demais para não saber que provavelmente o teria feito de qualquer maneira. Poderia poupá-la de ouvir isso mas Atena não o havia poupado de seus comentários ácidos, por isso admitiu:

— Provavelmente sim.

Atena apenas assentiu, como se esperasse por aquela resposta. Ele se apoiou pesadamente no parapeito da janela atrás de si, sem saber o que ainda poderia falar.

— Se eu tivesse aceitado sua oferta… - Ela hesitou antes de continuar, como se não estivesse realmente certa do que queria dizer. - Teria se casado novamente?

A pergunta o surpreendeu. Nem por um momento havia chegado a cogitar um cenário tão distante, mas a resposta lhe veio sem um segundo de hesitação:

— Claro que não. - A mera ideia era risível. Como ela não esboçou qualquer reação à sua resposta, acrescentou: - Se importaria se eu o fizesse?

Mas Atena não lhe concedeu nenhuma réplica além de um pequeno suspiro cansado que mais parecia direcionado a si mesma do que a ele, e o silêncio que dominou o espaço entre os dois depois disso pela primeira vez em alguns dias não parecia tão pesado apesar de tudo. 


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Notas finais do capítulo

Sei que prometi outra atualização dupla mas pelo bem da minha satisfação em ver quarenta capítulos redondinhos por um período eu vou guardar o que acompanharia esse para a próxima atualização (que aí sim será em dobro, podem me bater se eu descumprir)