Virtua.Net escrita por Maya


Capítulo 8
Epílogo


Notas iniciais do capítulo

Oi galera!
Recentemente coloquei, enfim, o epílogo de Virtua.Net no papel e fiquei feliz com o resultado, então decidi restaurar a fic e deixá-lo disponível aqui para vocês também, caso queiram saber como ela teria terminado se não fosse interrompida no meio.
Algumas coisas não tinham sido explicadas ainda, então se quiserem uma explicação mais aprofundada, não hesitem em mandar uma MP :)
Divirtam-se!
PS: No final do capítulo tem um trechinho de uma música. Se quiserem ouvi-la, o nome é Kara no Kokoro (sim, de Naruto Shippuuden).



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/256824/chapter/8

                A barra de energia de Keiko estava quase esgotada. Imaginava que o de Ícaro estivesse mais ou menos no mesmo ponto. O cenário cinzento e pedregoso – um dos primeiros a serem inventados no jogo e o primeiro em que os dois se enfrentaram, anos atrás – estava todo devastado depois dos vários ataques de ambos os lados. Tudo o que Keiko queria era acabar logo com aquilo; não aguentava mais precisar lutar naquela intensidade com seu amigo de infância, ainda mais sabendo que seus corpos também estavam sendo afetados na vida real.

            Amigos... Quando se encontraram na abertura do torneio, Ícaro apertara propositalmente em suas feridas do braço e jurara derrotá-la ali, e isso não era nada parecido com o ruivo tímido e leal que Keiko conhecia desde pequena. Queria muito saber o motivo de seu ódio repentino, e queria compensar o que quer que tivesse feito; tentava manter firme as boas memórias que tinha dele. Mas não compensaria nada ali. Estava ali para vencer.

            Seu adversário continuava sumido desde a última explosão que criaram, e o tempo não parava de correr – se acabasse ali, o vencedor seria aquele que tivesse a energia um pouquinho mais inteira –, então decidiu sair em passos mancos a sua procura. Olhava para todos os lados, segurando com firmeza a espada de cabo prateado, o coração batendo com força no peito por vários motivos.

            Foi quase tarde demais quando viu o tiro luminoso vindo em sua direção. Usou a espada para bloquear, mas o impacto ainda assim a jogou no chão. Esforçou-se para se pôr de pé, e viu os vários disparos vindo do céu em sua direção – o famoso Light Festival de Ícaro –, e então ativou a eletricidade da espada girou para criar uma barreira com ela. Não foi totalmente eficaz, mas certamente a livrou de uma derrota.

            – Keiko Toshimoto!! – Ouviu Ícaro gritando. A cortina de fumaça formada não permitiu que ela o visse. – Aqui e agora eu acabarei com isso!

            Keiko viu o ponto de luz nascendo – aparentemente seu oponente estava em cima de um monte – e crescendo gradativamente. Precisava pensar rápido. O que poderia fazer?

            A resposta veio logo, e ela riu de si mesma por ainda ter dúvidas; só havia uma coisa a ser feita.

            O ponto de luz cresceu mais e mais até se tornar uma esfera gigante de luz vermelha, ainda antes da fumaça cessar totalmente. Mas a vista estava clara o suficiente para Keiko conseguir mirar seu último ataque. Colocou-se em posição.

            – Owari!! — O ruivo esbravejou ao disparar seu raio.

            Este veio como um cometa na direção da garota. Seu corpo inteiro gritava para usar as forças que ainda tinha para sair correndo, mas o coração permaneceu firme e convicto do que estava prestes a fazer. Afinal, era só dele que precisava naquele momento.

            Raios foram invocados à sua volta, tão intensos que ela mal conseguiu suportar o peso. Porém, manteve o foco. O raio de luz gigante se aproximava cada vez mais rápido, deixando um rastro de destruição no caminho, e, ao chegar numa distância muito perigosa, o poder de Keiko precisava enfim foi totalmente canalizado. Com todo o pulmão, gritou:

            – HISSATSU: RAIJIN NO CHIKARA!!

Volx – o maior resultado da experiências que seu pai fizera durante a criação de VirTua.NeT, o gigante monstro elétrico que a habitava e fazia parte de seu coração – despertou. Ergueu-se majestosamente sobre a mestra e liberou seu rugido; as ondas energéticas de seu corpo uniram-se na forma de um raio elétrico de ondas azuis, vermelhas e amarelas, que foi em direção ao disparo oposto.

Os dois colidiram, abrindo uma cratera no chão. Keiko já estava ficando tonta; não era nada fácil manter aquela energia toda sob controle estando com o corpo tão frágil, e sabia que Ícaro tinha o mesmo desafio. Isso não a parou, porém. Gritou – ouviu seu adversário gritando também – e usou o pouco de força que ainda tinha para erguer mais a espada, pesada sob toda aquela pressão que Volx lhe causava. Tentou empurrar mais seu raio, entretanto o outro disparo também mostrava ainda mais resistência. Continuou. Continuou. Com tudo o que tinha, continuou.

Até apagar.

. . .

            Keiko abriu os olhos e se viu num cenário totalmente branco. Ainda tinha a espada e o bracelete equipados, e, ao ouvir alguns tiques, notou que o relógio do jogo também estava ali e continuava a correr. Faltavam poucos minutos para acabar o tempo. Então, quando olhou para frente de novo, viu Ícaro.

            Seu velho amigo também continuava em posso da pistola de luz e o bracelete, e todo o corpo apresentava ferimentos e sujeira. Mas o que mais chamou a atenção da garota foi a expressão suave que trazia no rosto. Foi como ver o antigo Ícaro, aquele que conhecera antes de ser tomado pelo ódio.

            – Ícaro... O que eu fiz para você me odiar tanto?

            Ele não conseguiu encará-la para responder aquilo.

            – Você... Quando seu pai fez todas aquelas coisas horríveis, eu te vi chorando e sofrendo todos os dias por causa das palavras daquele desgraçado e dos machucados que os experimentos te causaram. Eu não aguentava mais te ver naquela situação. Me ofereci para servir de cobaia, contanto que seu pai te liberasse.

            – O quê?! Eu não fazia ideia!

            – O fiz jurar que manteria segredo sobre essa troca, ou juntaria todas as provas que tinha para denunciá-lo. Mas não durou muito tempo; participei de quatro experimentos apenas, e depois o jogo foi oficialmente lançado.

            – Mas nunca te vi com muitos machucados ou qualquer efeito colateral dos testes. Nada aconteceu com seu corpo?

            Ícaro esboçou um sorriso pesaroso e levantou a bainha da perna direita da calça. Abaixo dela havia uma camada de pele artificial, já desgastada depois da batalha, e o ruivo terminou de abri-la para mostrar melhor a perna metálica.

            – Não foi por isso que fiquei com raiva, porém. A escolha foi inteiramente minha. O que me irritava tanto era ver como você reagiu. De uma hora pra outra, te vi ficando mais sorridente e alegre, falando com todo mundo, fazendo amizades, se esforçando mais nos estudos e no jogo, melhorando, vencendo, sempre com esse sorriso bobo no rosto! Você me irritou, Keiko, por ser você! – Ele começou a chorar. – Não consegui perdoá-la por estar vivendo como se nada daquilo tivesse acontecido, porque eu já tinha pago um preço alto por achar que você, no mínimo, se importava! Quando percebi que não fazia diferença nenhuma na sua vida... Me senti um idiota, e te odiei por isso. Então, quando foi anunciado o torneio, decidi juntar minha própria equipe para poder te enfrentar. Jurei a mim mesmo que a faria sentir todas aquelas feridas de novo e te machucar tanto ou até mais do que seu pai te machucou!

            A voz mostrava rancor, enquanto a expressão denunciava tristeza e vergonha por dizer tudo aquilo. Ícaro continuava de cabeça baixa e chorando sem parar. Keiko foi pega de surpresa por sua confissão, mas ainda assim, de alguma forma, conseguiu manter a serenidade. Ainda o olhava diretamente quando falou:

            – Eu nunca esqueci e nem deixei de sentir aquelas feridas. Demorei anos para conseguir vestir algo que não cobrisse totalmente meus braços, fico nervosa sempre que inicio uma partida no VirTua.NeT, e não tem um dia em que não me lembre do que meu pai fez. Tenho pesadelos quase toda a noite. Tudo isso continua doendo em mim e não acho que um dia vá parar de doer.

            – Então... Como...

            – Só que eu percebi que ficar sentada num canto chorando todos os dias não me ajudaria em nada; só intensificaria a dor. Então decidi me levantar e lutar, e a arma que escolhi foi o sorriso. Busquei a alegria e ela começou a vir até mim por conta própria. Busquei fazer amigos e apareceram pessoas incríveis. Me esforcei mais para tirar notas melhores na escola, para ser uma jogadora exemplar do VirTua.NeT, para provar ao meu pai... Não, a mim mesma... Que era muito mais do que um mero rato de laboratório. Eu me construí. Foi difícil demais, mas deu certo.

            Ícaro finalmente a encarava com os olhos vermelhos de choro e o rosto surpreso. Keiko deu um passo em sua direção.

            – Ícaro, minha dor nunca vai desaparecer, por vários motivos. Mas agora sei que não estou sozinha, porque tenho amigos incríveis e, o mais importante de tudo, tenho eu mesma do meu lado. Desse jeito fica muito mais fácil suportar o passado e planejar o futuro.

            O ruivo desviou de novo o olhar.

            – Incrível – sussurrou.

            – Me desculpe. – O pedido chamou a atenção do rapaz novamente. – Pensei que estivesse te trazendo comigo nesse processo, mas pelo visto só te deixei sozinho. Acho que fui egoísta nessa parte.

            Ele não respondeu nada. Acima deles, o relógio seguia correndo e agora mostrava a contagem regressiva de um minuto. Keiko olhou para seu bracelete; sua barra de energia estava praticamente vazia com o número de 0,2% no visor.

            – Parece que não tenho muita esperança aqui. Quanto você tem?

            – 1%.

            Keiko sorriu para o amigo. Por mais que quisesse a vitória, ficou contente por ele.

            Só que Ícaro não parecia nada satisfeito. Olhou a garota nos olhos antes de levantar o braço direito. Qualquer um conhecia tal gesto.

            – O que está fazendo? – Ela exclamou. – E quanto ao seu objetivo?!

            Ícaro abriu um leve sorriso.

            – Ele não é real. – Então, gritou: – Eu, Ícaro Shinshi, desisto dessa partida! Concedo a vitória à Keiko Toshimoto!

            O relógio parou. Enquanto a imagem do amigo sorridente desaparecia, Keiko sentia as lágrimas finalmente caindo.

Acabou! A equipe vencedora do primeiro VirTuaLiFe é... INTERNATIONALS!!

 

. . .

1 ano depois

            Keiko ficara desacordada por uma semana depois da luta final do torneio. Após as comemorações, voltara para Tóquio com Akira, mas Ícaro não as acompanhou; havia pedido para Yukio entregar-lhes uma carta avisando que iria morar com a avó em Hokkaido. Escrevera ainda para Keiko "Desculpe por tudo. Obrigado por me ensinar a viver". Ela nunca mais o viu desde então.

            Depois do torneio, as equipes continuaram tendo atenção da mídia, principalmente a vencedora. Cada integrante voltou para seu país de origem e conquistaram o respeito dos demais jogadores, sendo vistos como os melhores do mundo. Seus rostos seguiam aparecendo nos jornais, televisão, internet e revistas, só que não tiveram outra chance de se reunirem.

            Keiko usou a fama a seu favor e convenceu o pai a ceder a presidência ao senhor Roko – o mesmo que a treinara e cuidara da garota durante a semana que antecedeu o início do último campeonato, quando ela se afastara da equipe para encontrar sua própria maneira de superar o grande ponto franco, ou seja, as feridas permanentes dos braços. Prometeu ao pai que, se o fizesse, afastaria a mídia da polêmica das máquinas de realidade aumentada. Ele aceitou depois de muita discussão.

            Então, a segunda edição do VirTuaLiFe foi anunciada. Dessa vez sem máquinas que ferissem os corpos enquanto os jogadores batalhavam na dimensão virtual; o jogo seria mais limpo e divertido, ao invés de doloroso e agoniante como no último ano.

            A equipe Internationals finalmente viu uma oportunidade de encontro: eles foram convidados a participar da cerimônia de abertura do campeonato. E ali estavam eles.

            – Olha quanta comida! – Mast exclamou. – Tem muito mais do que no ano passado!!

            – Deixa um pouco pra mim!! – Gritou John, já correndo para pegar alguns mini sanduíches. – Isso aqui é muito melhor que a comida de avião!

            – Comportem-se, seus lunáticos! – Luna mandou. – Só o que me falta é passar vergonha aqui...

            – Nós com certeza vamos passar vergonha com eles – Anne garantiu. – Já tinha me esquecido de como era essa sensação de temor constante.

            – Vamos, garotas, divirtam-se! – Jack aproximou-se das duas com taças cheias de bebida. – Essa noite é nossa! Comam, bebam, dancem, tirem a...

            – Não complete a frase!!

            – Ei, Keiko! – Mast a chamou enquanto terminava de comer um salgadinho. – O que acha de uma partida hoje à noite?!

            A japonesa estava tão distraída que só notou que falavam com ela quando Luna a tocou no ombro. Seus amigos a olhavam com certa preocupação, então tentou acalmá-los com um sorriso.

            – Desculpa, pessoal, me distraí um pouco. O que foi?

            – Keiko... Você está bem?

            Ela não sabia direito. Estava feliz de verdade por reencontrar os amigos e por poder estar de volta àquela ilha, mas tudo ali a lembrava de Ícaro – seu encontro naquele mesmo saguão no dia da abertura do campeonato, a luta final, a última conversa que tiveram, as confissões dele. Por mais que soubesse que ele estava melhor, não conseguia deixar de ficar inquieta.

            – Mais ou menos... – respondeu por fim. – Mas não liguem pra isso! Só preciso de uma boa partida de VirTua.NeT pra aliviar a tensão.

            – É assim que se fala!! – Mast gritou, e de sua boca voaram migalhas de salgadinho. Luna fez cara de nojo enquanto Anne prendeu a risada. – Eu topo!

            – Ei menino-coelho, você cuspiu em mim!

            – Ah é, menino... Er... Menino-inglês! O que vai fazer a respeito?!

            – Por favor, se espanquem – Luna murmurou.

            Mast e Jack continuaram discutindo, com John tentando acalmar seus ânimos, e Luna e Anne pegaram taças de bebida e começaram a conversar sobre algum outro assunto. Keiko riu da briga dos garotos, mas permaneceu em sua posição mais afastada, apenas os observando.

            Foi então que sentiu alguém cutucar seu ombro. Virou-se e viu que era ele.

"O que significa brilhar sobre um coração vazio?"

            Ícaro tinha cortado o cabelo. Usava óculos agora. A calça que usava não cobria a perna até o final, deixando o tornozelo de metal à vista. E – o mais importante de tudo – ele sorria. Keiko também sorriu, porque sentiu o coração ficar preenchido.

            – É você mesmo? – Perguntou em voz baixa.

            – Sim. Finalmente.

            Os dois não disseram mais uma palavra; estava claro, simplesmente pelos olhares, o que queriam dizer um ao outro. Enfim, depois de tanta dor, rancor e mágoa, o ontem havia ficado para trás, e o amanhã de um encontrou amanhã do outro.

            Enfim, o presente.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Virtua.Net" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.