O Retorno de Milena escrita por Débora Falcão


Capítulo 5
Toreador




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/24608/chapter/5

Durante a noite, o Museu do Estado é fechado. Mas isso não impede que algumas pessoas, digamos assim, entrem. Rudolph é uma delas. Educado, elegantemente vestido, passos firmes mas silenciosos, mãos bem tratadas, cabelos grisalhos e bem penteados, olhos de um azul profundo que investigam o ambiente. A sala, a pinacoteca do museu. Totalmente às escuras, isso não é problema para um vampiro auspício.

Rudolph caminha vagarosamente entre as paredes repletas de pinturas de muitos artistas, locais e internacionais, réplicas e originais de tirar o fôlego. É o seu momento de prazer pessoal. A arte é como um bálsamo para seu interior. Um momento como nenhum outro. Às vezes, Rudolph vai ao teatro, ou ao cinema, ou a alguma ópera, mas seu lugar preferido é o museu. Relembra coisas que presenciou, acontecimentos e fatos que testemunhou. E era lá onde estava, e foi lá onde foi encontrado.

— Sabia que o encontraria aqui.

Rudolph não se perturba ante a voz do recém-chegado. Continua observando uma tela, bastante colorida.

— Este é um dos meus locais favoritos para passar o tempo. E, se existe alguma coisa que não me falta, é tempo.

— Não sei como você agüenta essa palhaçada de pintura. Cada coisa feia! Não dá pra entender nada!

Rudolph vira-se e quase fulmina o Ancilla com o olhar.

— Meu caro Lázarus, você jamais poderia entender o valor de uma tela de Tarsila Amaral, por exemplo.

Lázarus olha para a tela que Rudolph aponta.

— Eu quero lá entender um homem do pezão e uma cabeça minúscula!

— Vejo que você se enquadra perfeitamente no perfil Abaporu.

— Quê?

— Você é um perfeito idiota. Por que veio interromper-me em meu horário de lazer?

— Eu ressuscitei Milena.

Rudolph ri.

— Impossível. Não se pode ressuscitar um vampiro. Se ele já teve sua morte final, impossível.

— Não quando não se destrói o corpo.

— Como o encontrou?

— Isso é coisa minha. O que importa é que eu fiz e preciso de sua ajuda. Sua e de todos do clã Toreador.

Rudolph caminha em direção a Lázarus.

— E me diga, meu caro Malkaviano, por que eu me aliaria a você, convencendo os Toreador a fazerem o mesmo?

— Por que você me tem como a um filho. Lembre-se do laço de sangue que fizemos há quarenta anos.

— Claro. Como poderia me esquecer? Você me é uma vergonha. Nunca se interessou por arte ou por qualquer coisa. Sempre pensando em levar vantagem em tudo. Agora que domina os Malkavian de Recife acha que é alguma coisa. Mas eu lhe digo que não é.

Rudolph aproxima-se mais de Lázarus.

— Vocês, Bon Vivants, não são nada. São apenas sanguessugas que vivem para caçar e dormir.

— Rudolph? Por que está dizendo isso? Se é para tentar me convencer a fazer parte dessa sua ladainha de artistas plásticos e intelectuais, nem pense nisso. Na verdade, eu detesto os Toreador. Eles são chatos demais, vivem em museus! Que saco! Eu só quero a ajuda de vocês, porque vocês são muito fortes. Como você diz, os Bon Vivants não são nada. E Milena é uma Tremére. Mais do que isso: ela ressuscitou Ricardo, o namoradinho Tremére da oitava geração. Estamos ferrados se os dois vierem contra nós, o que é certo.

Rudolph caminha.

— Não sei se quero fazer parte disso. O que você vai ganhar?

— Quero dominá-la. Me casar com ela. Laços de sangue e tudo mais. Ela é quase uma mestra do clã Tremére, foi treinada para substituir Lady Anthonya na Primigênie, sétima geração, forte demais. Seus pontos de sangue são altos e tem poderes suficientes para acabar com duas castas inteiras. Uma delas seria a dos Malkavian. Eu sou apenas um vampiro da décima segunda geração. Não tenho tantos pontos de sangue e sou fraco diante dela. Dentre os fracos, sou o mais forte. Mas não sou nada perto dos grandes clãs. Preciso de Milena comigo.

— Você quer unir seu clã ao dela. Assim, você dominaria muitos clãs.

— Exatamente.

— E como pretende fazer isso? Milena não vai se unir a você, muito menos laço de sangue. Ainda mais agora que ela ressuscitou Ricardo.

— Por isso preciso dos Toreador. Vocês são fortes e muito inteligentes, são poderosos com pontos de sangue altos. Preciso de vocês.

Rudolph limita-se a ouvir, caminhar e observar uma pintura de Eckout.

— Eckout é maravilhoso em seus quadros.... bem... o que eu ganharia com isso?

— Você é o mestre dos Toreador por aqui. Teria a oportunidade de dominar os clãs de nossa região, Toreador e Tremére.

— Não acredito nisso. Você vai querer nos dominar. A nós, Toreador, aos Tremére, sem contar os Malkavian com você.

— Claro. Mas podemos dividir os clãs entre nós.

Rudolph sorri.

— Você tem um senso de humor incrível. Nada feito.

— Não pode me negar isso!

— Já neguei. Eu e os Toreador. Procure outro clã. Quem sabe os Nosferatu? E não pense você que a coisa toda está resolvida dentro dessa sua cabecinha lunática. Tenho ouvido rumores. Sete neófitos foram destruídos ontem, na região da periferia. E já soube que mais três foram destruídos no início da noite de hoje.

— Você acha que...

— Isso é atividade de um ancião recém-despertado. Há um novo ancião entre nós. Talvez você encontre nele um aliado, ou seja seu lanche...

Lázarus, humilhado, retira-se, ouvindo ainda ao longe a gargalhada de Rudolph na pinacoteca vazia. Mas, para Rudolph, as coisas não estão tranquilas. Se havia um novo ancião, recém despertado, isso era ruim. Ele sabia exatamente o que um ancião recém desperto era capaz de fazer. Ele mesmo fora um desses. Agora que o domínio de seu clã estava sob suas mãos, e já fazia algum tempo que viera de seu sono, ele podia se controlar. Um ancião novo poderia ser um grande problema. Alianças, isso era o que ele deveria fazer.

— Bem... para mim... eu tenho uma idéia bem melhor... Milena foi ressuscitada... isso é muito interessante....

Rudolph levanta vôo e entra num alçapão no teto, o seu esconderijo, que poucos conhecem.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Retorno de Milena" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.