Capitols Flower escrita por Lana6Willa


Capítulo 9
Capítulo 7: Imperdoável


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novo, especial, e enorme! Espero que gostem.



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Respirei fundo. Mesmo após todo esse tempo, eu ainda fechava os olhos toda vez que tirava a blusa para tomar banho. Removi as pulseiras que usava em ambos os pulsos ainda sem abrir os olhos e tateei todo o
caminho até o banheiro.

Tanto tempo, e aquilo ainda me assustava, e as memórias ainda voltavam para a minha mente, não importava o quanto eu tentasse esquecer. Quase automaticamente, levei minha mão direita em direção à cicatriz pouco abaixo do meu pescoço que Caesar parecia ter visto no
centro de treinamento. Uma linha fina e rosada, assim como suas irmãs, que seguiam o contorno de minha coluna, até a base de minhas costas. Deixei minha mão deslizar até minhas costelas, encontrando outra cicatriz, grossa, enrugada. Não era comum na Capitol possuir uma cicatriz. Ter duas ou três era um caso raro. Ter as costas cobertas por elas era um caso único.

Frio, tão frio.

Ajustei a água deixando-a morna. Mas as lembranças já tinham voltado.

Eu podia sentir algo frio, metálico, prendendo minha mãos, pés e meu pescoço. E eu podia sentir algo frio, metálico e afiado pressionando a pele nua de minhas costas. Retorci-me ao sentir a dor, mas não tinha para onde fugir. Eu estava completamente imobilizada. A única coisa que podia fazer era gritar. Ouvi um leve riso zombeteiro.

_Tem certeza que ela não vai desmaiar? - disse um voz masculina. Percebi que fora ele quem rira.

_Não importa, desde que ela grite o suficiente. - retrucou uma voz feminina - Tragam o jabber jay.

Mesmo morrendo de medo, entendi o que eles pretendiam. Um jabber jay. Um mutante da Capitol capaz de reproduzir conversas inteiras. Um mutante que deveria estar morto. Alguns sobreviveram e assim surgiram os mockingjays, como aquele que Katniss Everdeen ostentava em um broche. Mas os verdadeiros jabber jays deveriam ter desaparecido depois que os rebeldes passaram a usá-lo contra nós. E agora novamente aquela mutação nos traria problemas. Eles enviariam o pássaro para meus pais, para meu avô. Um pássaro mutante que repetiria com exatidão
cada grito que eu desse.

Outra vez, aquela dor aguda passou pelo meu corpo, mas mordi meu lábio inferior e cerrei os punhos. Eu não iria ajudá-los. Se eram gritos o que eles queriam, eu aguentaria aquela sessão de tortura calada.

Outra vez o mesmo riso zombeteiro. Seguido de uma dor maior ainda no lado esquerdo de minhas costas. Mesmo que fosse contra minha vontade, os gritos mais uma vez arranharam a minha garganta.

Sacudi a cabeça, tentando me livrar das lembranças. Sussurrei baixinho uma pequena frase que eu repetia a mim mesma para tentar me acalmar desde que tinha voltado para casa.

_Onde é seguro, onde é salvo, aqui eu descanso.*

Mas aquelas palavras não tinham mais sentido. Eu tinha sido arrancada de minha casa e de minha família outra vez, sob as mãos dos Distritos, dos rebeldes, daqueles que não se importariam em me ver morta, daqueles que queriam me ver morta.

_Ela está morta agora. E você mudou. Tudo mudou. - murmurei em seguida.

Aquilo era verdade. Coin estava morta. E eu não era a mesma que antes. Eu não poderia nunca voltar a ser o que era, da mesma forma que nunca mais poderia usar alguma roupa com decote nas costas.

Porque eu sabia o que tinha feito eles sequestrarem a mim, e não minha mãe, ou meu pai ou minha irmã. Olhando-me no espelho, eu já podia ter uma ideia. Eu era pequena, tinha 1,48m de altura, meus ombros, braços e pernas eram estreitos e delicados. Meu rosto era arredondado e eu tinha grandes olhos azuis. Tudo em mim gritava frágil. E qualquer um que me conhecesse antes poderia dizer que no meu caso, as aparências não engavam. Eu era frágil. Doce, frágil e gentil, incapaz de desconfiar de alguém.

Como eu poderia continuar a ser assim depois de ter minhas costas
retalhadas? E eu realmente tinha desmaiado, mas só depois que a tortura já havia terminado. Eu despertei em um cubículo, e sua quarta parede era uma forte grade metálica. Havia uma cama a um canto e uma porta que conduzia a um pequeno banheiro, e nada mais. Eles haviam me vestido em folgadas calças cinzentas e em uma camisa de hospital. Eu podia sentir que minhas costas estavam enfaixadas, mas os ferimentos ainda ardiam. Eu recebia uma refeição três vezes por dia e de vez em quando era sedada e acordava com curativos novos. Um dia tentei fugir. Um dos guardas bateu na minha perna com uma barra de ferro por isso. Na segunda tentativa, minhas costelas foram atingidas e passei um bom tempo tentando recuperar o fôlego. Na terceira e na quarta tentativas, o golpe foi em meu rosto, e agradeci por não ter acesso a nenhum espelho. Na quinta, fui conduzida a uma sala que nunca tinha visto e fui atada a uma maca. Como meu avô era o presidente de Panem, eu tinha acesso a alguns livros de história antigos, de antes do surgimento de Panem. Uma vez, eu lera sobre o tratamento de choque que era imposto aos loucos em alguns sanatórios. Só percebi que fariam o mesmo comigo quando senti a corrente elétrica em meus pulsos.

Aquela não fora a única vez, eu voltava àquela sala a cada tentativa
frustada de fuga. Com o tempo surgiram em meus pulsos manchas vermelhas, depois manchas negras, e a pele ao redor deles adquiriu um aspecto curtido, derretido.

Por fim, eles me devolveram à minha família, mas eu nunca iria esquecer os dias negros que passei no Distrito 13. Nunca me esqueceria do rosto de Coin, ou de meu ódio por ela. Ela estava presente em cada
tortura, e eu sabia que era ela quem planejava cada golpe que eu
sofria. Eu nunca me esqueceria do estado de minha mãe quando voltei.
Os cabelos bagunçados, as olheiras escuras, os olhos vermelhos e a
magreza excessiva.

E eu nunca esqueceria do monstro no qual eles tinham me transformado. Agora eu conhecia a dor, conhecia os extremos aos quais os humanos podiam chegar, quão cruéis poderiam ser. Eu nunca mais confiaria em alguém de novo. Eu desenvolvera uma aversão a qualquer pessoa ou coisa que encostasse em mim. Aos poucos eu conseguira relaxar o suficiente para aceitar ser abraçada por minha mãe. Mas só por
ela. Era terrível lembrar a mágoa nos olhos de minha mãe quando eu
voltei para casa e fugi de seu abraço. Nem mesmo Ayllin, minha irmã
mais velha, conseguia encostar em mim sem que eu me esquivasse com um sentimento de medo e nojo.

Eles arruinaram minha vida uma vez, eu não podia deixá-los destruí-la completamente. Eu ganharia os Jogos Vorazes, mataria todas aquelas
pessoas que eu conhecia, mas não podia deixá-los ganhar. Não dessa
vez.


*Where’s safe, where’s sound, here I lay down.

Essa frase simplesmente surgiu na minha cabeça um dia desses, e quando estava escrevendo esse capítulo percebi que poderia usá-la como uma espécie de prece que Elyn repetiria para se tranquilizar. Essa frase
também me inspirou a fazer um capítulo bônus, previamente liberado.


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