Antes Que O Mundo Acabe escrita por Snapelicious


Capítulo 2
I


Notas iniciais do capítulo

O primeiro capítulo é sempre o mais complicado.
Essa é com certeza uma história bem mais... digamos, filosófica do que School of Rock. É diferente, mas eu gostei.
Espero que gostem.
E muito obrigada pelos comentários!



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Quem sou eu?

Uma garota.

O que eu significo nessa imensidão inplacável que é o universo?

Absolutamente nada.

Sempre pensei assim. Por mais que existamos, o que importa nossa vida para uma criança japonesa, ou para um velho de um bairro vizinho? Nadica de nada. Mas o que é o nada? Quando pensamos nisso, normalmente imaginamos uma sala vazia em branco.

Tipo, legal, eu sou uma sala vazia.

Pode parecer que realmente não importamos, mas fazemos parte desse conjunto. Como um dominó, uma peça colocada errada muda todo o sentido da coisa. Na verdade, eu sempre pensei que eu era essa peça errada. Nunca me encaixava, falava pouco, era absolutamente e totalmente ao contrário do que a sociedade chama de adolescentes normais.

Entenda isso: uma pessoa normal não muda o mundo. Uma pessoa normal não inspira outras pessoas a serem diferentes, a pensar de maneira diferente. Mas me responda: quem quer ser diferente? Talvez alguns, mas sempre tentamos seguir alguma tendência, mesmo que fosse para parecer legal.

Como saber se você é diferente? Pense em nada. Pronto, imaginou uma sala vazia em branco? Se sim, parabéns, você tem pelo o menos alguma coisa que se encaixe nos padrões. Se não, você é como eu.

Original.

Está me entendendo? Tomara que sim, porque eu não faço ideia do que estou falando desde o segundo parágrafo.

Todos querem mudar o mundo. Poucos tentam. A ideia de que podemos fazer melhor do que os outros sempre nos atormenta; mas no fundo sabemos que não é verdade.

Eu ainda não sabia disso. Achava que apenas com minha força de vontade acabaria com os meus problemas e com os dos outros. Quem nunca sonhou em viver em um mundo melhor? Em acabar com a tristeza? Eu já. E isso que me motivou a fazer aquela loucura. Mas eu tinha que fazer do jeito mais difícil.

Sinceramente, quem se contenta com a simplicidade?

Segunda-feira 8:35 AM – Aeroporto Internacional John F. Kennedy – New York, NY

Mais um pouco e eu matava essas velhas. Tá certo que meus all star (super) surrados chamam a atenção, mas não precisa exagerar. Como se eu fosse olhar de olhos arregalados para seus sapatinhos pretos sociais com um salto de 2cm de altura e uma flor brega na frente. Desgraçadas, vão reclamar das azeitonas, vão!

Calma Marlene, calma. Não culpe as “pobres” senhoras pelos seus problemas. Mal começou a narrar a história e já xingou um monte de gente.

É, tenho razão. Sr. Presidente, se estiver lendo isso, culpe o meu nervosismo pelo meu péssimo linguajar. E continuo tendo quase certeza que o vi de chinelos de dedo em um posto de gasolina.

Me sinto uma criminosa. Se meus pais descobrirem... to frita. Mas se parar para pensar, não estou fazendo nada de tão terrível assim. Fugir de casa é normal. Fugir do país nem tanto.

Desde o acidente de Charlie, as pessoas me tratam como se eu fosse quebrar. Sempre cuidadosos, perguntando onde eu vou, querendo saber novidades da escola e tentando conversar sobre meus seriados favoritos. Isso me deixa sufocada. Nunca recebi tanta atenção na minha vida; era sempre MeryPiper pra lá, MeryPiper pra cá... Nada de Marlene. Sempre a irmãzinha perfeita.

E de repente tudo muda. Meus pais brigam, na escola, ao invés de ser a riquinha revoltada passei para vadia, e o culpado por isso está todo quebrado em uma cama de hospital. Tudo o que eu conhecia desapareceu de uma hora para outra.

Eu tinha meus problemas, mas eles te multiplicaram por mil e me deixaram sem chão.

Foi aí que acabei aqui. Todo mundo acha que eu estou na escola, nem imaginam que eu estou fugindo. Daqui á algumas horas eles vão sentir minha falta e dar uma de pais preocupados, o que eles nunca foram.

Tentei não chamar a atenção para mim enquanto embarcava. Tenho o talento de parecer invisível, usei essa técnica por uns seis anos, desde que me mudei para St. John's. É simplesmente mais uma daquelas escolas enormes, com líderes de torcida, jogadores convencidos de futebol, nerds do clube de literatura e etc. Você pode entrar nela tanto sendo dono de uma ilha paradisíaca em algum lugar distante do planeta ou com uma bolsa do governo. Infelizmente, eu me encaixava no primeiro caso.

Nessa escola os boatos se espalham muito rápido, até para os padrões de um bando de fofoqueiros. É só alguém dizer “McKinnon”, “fez” e “Jared” que todos ficam loucos. Por Deus, não fiz nada! Nem bolo nem aquilo.

Agora estou com a reputação de Pe-u-te-a. É sempre assim, sempre sobra para os inocentes. Mas ninguém quer ouvir os dois lados do caso, só se interessam pela coisa mais bombástica, ela existindo ou não.

Seria legal se a vida tivesse um botão de retroceder. Sabe, voltar no tempo e corrigir erros. Maas, como o maldito ser lá do céu resolveu fazer a vida dos pobres mortais ficar mais difícil á cada dia, não podemos ter sempre o que queremos. E quando temos não percebemos, o que faz com que nossas chances de sermos infelizes para toda a eternidade aumentem.

Somos praticamente forçados a acreditar na ideologia da tristeza.

Pelo o menos eu sou.

17:45 PM – Camden Tandoori – London, UK

Estava há menos de uma hora em Londres e já havia me perdido duas vezes. Tinha a leve ideia que estava indo para o lado errado. Era pro taxista me levar em um hotel, não em um restaurante de comida indiana. Não era tão péssimo, pra falar a verdade.

Estava completamente confusa com as horas. Pelo meus planos, deveria chegar em Londres ao meio-dia, mas quando vi no relógio do Heathrow eram cinco da tarde. Eu, que esperava ter tempo para passear pela cidade, acabei chegando quase na hora do jantar.

O pior era que todos ficavam me olhando. Devo estar com uma cara muito americanizada, mas eles também deviam estar tomando chazinho das cinco, não?

Tentei evitar andar de transporte público, mas depois de só encontrar taxistas que falavam espanhol me dei por vencida. Meia hora depois estava no Corinthia Hotel, perto do famoso Big Ben. Pelo o menos eu acho que é. Vai que eu olhe em um mapa e descubra que estou no Vietnã.

Depois de andar um pouco pela cidade percebi que era isso que eu queria. Sem aquele trânsito infernal de New York, vários prédios velhos e encantadores e mulheres bem-vestidas. E alguns garotos... interessantes. Não aguentava mais aqueles emos da minha cidade.

18:18 – Parliament Square

Aqui estou. No lugar onde sempre me imaginei sendo feliz. Parece até que estou em um sonho.

Mas o melhor dos sonhos é que ás vezes eles são reais. Uma hora você está vivendo um pesadelo, e na outra tudo melhora de repente. Todos os meus problemas pareciam tão distantes, separados pelo Atlântico. E aqui, observando o incrível Big Ben, tudo aquilo que eu conhecia estava tão longe.

Isso é libertador. Mais liberdade do que esses manifestantes perto de mim poderiam querer para os seus protestos. Vontade de pegar um cartaz e me juntar aos seus gritos, só para me inturmar. São adolescentes, e estão cobertos de óleo.

Deixa pra lá.

-Gostaria de se juntar á nossa causa? - perguntou um garota que eu imaginava ser loira, dado á sujeira de seu corpo. Ela carregava uma enorme placa de madeira com os dizeres “O mundo não é só dos seres humanos!”. Espero que ela não seja um E.T. – Estamos tentando impedir os petroleiros americanos despejarem lixo e óleo nos oceanos. Milhares de peixes e de tubarões morreram por causa disso...

-Ei! - reclamei – Os americanos não são tão terríveis assim!

-Claro que são! - ela revirou os olhos – Você sabia que os Estado Unidos foram um dos únicos países a não assinar o projeto de lei para salvar a natureza? Eles literalmente produzem sem parar e não se preocupam em limpar a sujeira.

-Nossa, isso é uma coisa que não ensinam em St. John's...

-St.John's? - ela gritou – Tipo, New York? Você é americana? - ela se virou para os outros manifestantes – JAY! Achei quem pode dar depoimento!

Quando ela se virou de volta para mim, sua imensa placa deu com tudo em minha testa. Gritei e caí no chão.

-Você está bem? Oh, deus, desculpe! - a garota tentava ajudar, mas a única coisa que conseguiu fazer foi tropeçar em minha mochila e cair em cima de mim.

-Você conseguiu matar a única pessoa que poderia nos ajudar – um garoto apareceu e levantou ela do chão. Ele estendeu a mão para mim – Você está bem?

Levantei os olhos, e UAU. Lembra quando eu disse que os garotos daqui são bonitos? Pois é, esse é tipo sessenta vezes melhor. Resmunguei alguma coisa indecifrável e aceitei sua ajuda.

-Sou James. - ele disse, tirando os cabelos espetados do rosto – James Potter.

-Hm... Rachel – respondi.

-Rachel, você gostaria de me acompanhar em um café enquanto eu cuido do seu corte?

Exatamente porque eu menti meu nome, isso eu não sei. Talvez para não descobrirem que sou uma fugitiva. Mas acho que foi porque eu realmente odeio meu nome (nunca nos satisfazemos com o que temos).

Cinco minutos depois eu estava indo até o Starbucks mais próximo acompanhada de um garoto super gato que eu acabara de conhecer.

Onde fora parar toda aquela minha conversa sobre ética mesmo?


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