Verdade Ou Desafio? - 9a Temporada escrita por Eica


Capítulo 10
Como nos velhos tempos




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/212740/chapter/10

Rafael

Progressivamente, Lucas começou a se lembrar de alguns fatos, especialmente eventos da infância. Tais lembranças surgiram de acordo com a ordem em que ocorreram em sua vida. Começou a lembrar-se de acontecimentos quando tinha a idade de oito anos. O médico que acompanha o caso de Lucas desde o início, quando ele foi diagnosticado com encefalite, conjeturou que Lucas não perdeu sua memória (como foi suposto anteriormente), apenas que ele estava apresentando dificuldades em acessá-las.

De acordo com o médico, já houve casos como o dele, em que o paciente não sabia quem era e perdera seus conhecimentos acerca do mundo a sua volta. Em um caso relatado por ele, um paciente nunca mais recuperou sua personalidade de antes. Outro conseguiu lembrar-se da maioria dos eventos ocorridos em sua vida, no entanto, não retomou suas antigas ocupações.

Os pais de Lucas mantinham-se otimistas, mesmo que o prognóstico do caso fosse variado. “Não há como saber”, disse o médico, “cada caso é um caso. Temos que continuar fazendo os exames neurológicos para acompanhar sua recuperação”.

Segunda-feira. Estava no trabalho. Wilson havia aparecido de repente, mas logo se foi, porque tinha serviço. Marco apareceu quando eu estava almoçando. Comia um marmitex ali mesmo no escritório. Coloquei um guardanapo sobre sua mesa para o caso de acabar derrubando comida. Como ele tinha tempo, pediu marmitex para ele e se sentou em frente à mesa onde eu comia.

- Guarda segredo? Especialmente de Bruno? – disse ele, do nada.

- Guardo.

- Vou levá-lo para uma viagem depois do casamento. Já vi o preço das passagens e, inclusive já comprei um pacote de nove dias para Barbados.

- Barbados? Onde fica?

- Caribe.

- Caribe? Que chique, meu! E quando será o casamento?

- Depois que sair a autorização do juiz. Mas acredito que semana que vem já receberemos a certidão. Você estará lá no cartório?

- Claro, mas só se você me dispensar do expediente.

Marco riu:

- Claro que dispenso.

Naquele instante, meu celular tocou. Larguei meu garfo e faca e peguei-o.

- Lucas?

- É, sou eu. Ainda está na sua hora de almoço?

- Estou. Que foi, cara?

- Vem em casa hoje. Preciso te contar uma coisa.

- Tudo bem. A gente se vê, então.

- Tá.

- Espera!

Não deu. Ele desligou antes que eu pudesse perguntar o assunto. Mas tudo bem. Tive que esperar até as sete e pouco da noite para poder vê-lo em sua casa. Quando nos encontramos, Lucas me abordou ali mesmo na garagem:

- Eu sei quem você é. – disse, com os olhos brilhando.

- Que?

- Eu me lembrei de você.

Meu coração se contraiu:

- Você se lembrou?

Ele confirmou sacudindo a cabeça:

- Me lembro de cair... E depois de você me levar até sua casa... Eu me lembro de irmos a um... A um trilho de trem... E de ficarmos por lá... Não sei para quê...

Sem eu esperar, lágrimas escorreram do meu rosto. Foi algo involuntário. Mas aconteceu. E continuei derramando lágrimas enquanto ele continuava falando sobre suas lembranças.

- É estranho, - continuou ele. – porque sinto que eu não gostava muito de você. Te achei irritante no começo, mas depois...

De repente ele parou de falar e me olhou fixamente.

- Mas é você... É você, Rafael.

Não pisquei em momento algum, o que permitiu que lágrimas se acumulassem em frente aos olhos e embaçassem a minha visão.

- Eu já sinto como se fosse alguém de verdade, entende? É como se algo estivesse se abrindo... Eu já tenho uma idéia do que eu era, e de quem você é.

Vergonhosamente, comecei a soluçar, e as lágrimas, a cair.

- Sinto... Alívio... – disse ele, com a ponta do nariz vermelha e os olhos molhados. - Eu queria me lembrar porque não queria continuar não me lembrando de nada. É horrível não saber quem você é. Todos sabem, menos você... Mas agora eu acho que vou me lembrar. Sei que vou me lembrar de mais coisas. Eu já sei que amo a minha mãe. Sinto que ela é muito mais especial do que achava que fosse.

Sequei as lágrimas e, controlando a voz, disse:

- Isso é muito bom, cara. Muito bom mesmo. Você precisa contar ao médico. Tem que dizer a ele que continua se lembrando.

- Não quero continuar morto aqui em cima. – disse ele, apontando para a cabeça.

- Não, não está morto de jeito nenhum. – sorri e funguei.

- Quero andar de skate de novo.

Quando ouvi aquilo, foi mais um estalo de emoção em meio peito.

- Você vai me encher a paciência outra vez, não vai?

Alarguei um sorriso no rosto e disse, cheio de ânimo:

- Vou sim! Como nos velhos tempos!

Acabei chorando de novo ao sentir que, mesmo um pouquinho, estava falando com o antigo Lucas outra vez.

“Farei tudo o que quiser. Tudo. Absolutamente tudo”.

Leonardo

Sábado de manhã. Já havia tomado meu café. Agora colocava minhas roupas na máquina de lavar. Ouvi a campainha tocar. Corri atender. Era Michelangelo.

- Vai entrando. – falei, ao abrir o portão social.

- Tudo certo?

- Tudo.

Ele parecia de bom humor. Caminhamos até a sala.

- Vou dar uma volta pelo shopping. Quer vir?

- Hoje não vai dar. Tenho um encontro.

Mick ergueu as sobrancelhas, aparentemente surpreso:

- Sério?

- É.

- Com quem?

- Um amigo do Rafael.

Riu:

- Amigo do Rafael? Tem certeza de que quer mesmo? O mundo está cansado de saber que os amigos do Rafael não batem bem da cabeça.

- Devo estar louco mesmo, - falei, rindo. – mas sair me fará bem. Além do mais, preciso arejar a mente.

Chegamos ao quintal de casa. Continuei colocando a roupa suja na máquina. Mick ficou ao meu lado.

- Uma parte de mim está triste, sabe? Por perder o Eduardo... – ele olhou-me. – Questionei seus sentimentos, afastei quem me amava, mas agora ele ama outra pessoa.

- Já conversamos muito sobre isso.

- É, é verdade.

Ele apoiou um dos cotovelos na lateral da máquina e me olhou fixamente:

- Na época, antes de você terminar com ele, disse que ficou pensando no que ele sentia por você e por Donatelo. Disse que, se ele gostasse do Donatelo, preferiria terminar tudo.

- É. Mas sei que, sei que ele não gostava. Tudo foi esclarecido.

Terminei de colocar as roupas e fechei a tampa da máquina. Liguei-a. Depois, encostei-me nela e disse:

- Pensar no passado me traz lembranças muito boas... Sinto falta daquele tempo em que todo mundo vinha em casa e... Fazia bagunça.

- Todos têm sua vida agora. Rafael tem o Lucas pra se preocupar, Donatelo tem que cuidar da filha dele... Todos estão trabalhando...

- Queria voltar a me reunir com vocês. Com todo mundo. Não quero mais ser o panaca da história.

- Que? De jeito nenhum! Não está sendo panaca.

Suspirei:

- E também não quero continuar dando uma de cretino pra cima do Donatelo.

- Se você quer se reunir com a galera, podemos marcar de ir a algum lugar... Bar, boate, cinema, qualquer lugar. Também tem o casamento do Bruno, lembra? É nesta quarta-feira.

- Verdade!

- Vamos ver todos durante a festa. Até lá, a gente pensa no que fazer pra se reunir de novo.

Michelangelo virou-se e se dirigiu para a porta, mas antes de entrar na cozinha, disse:

- Antes de vocês namorarem, vocês eram amigos. Tente resgatar aquela amizade com Eduardo. Não sei, mas talvez te faça bem.

Absorvi a informação.

Donatelo

Por volta das dez desta quarta-feira, o oficial do registro civil da cidade entregou a B.B e Marco a certidão de casamento. Agora Bruno se chamava Bruno Ribeiro Castello e Marco se chamava Marco Feriani Castello Ribeiro. A cerimônia, de entrega da certidão, durou uns dez minutos, e foi realizada pelo oficial do cartório em companhia de um promotor de justiça.

Eu estava junto de Bruno e Marco no momento da entrega da certidão. Carregava Sofia em meu colo. Eduardo estava comigo, assim como Rafael, Lucas, Leonardo, Mick, parentes e familiares de Bruno e Marco.

Ambos ficaram muito emocionados. Na verdade, quem não ficou? Dos dois, o único que conseguiu se conter foi Marco. B.B já estava em sua milionésima lágrima. Ele chorou, mas evidentemente que foi um choro silencioso, sem escândalo.

Do cartório nos encaminhamos para um salão de festa que foi alugado graças ao apoio conjunto dos pais de Bruno e Marco. Fomos ao bairro Caputera, e entramos na Chácara Pedra Azul. O lugar era imenso. Segundo me contaram, cabiam 450 pessoas em seu interior. Depois que atravessamos a porta principal da chácara, entramos no salão destinado a dança e mesas. Ali havia um mezanino, cujas colunas de sustentação pareciam da ordem dórica. Tais colunas eram brancas, assim como o mezanino. A tonalidade das paredes era de um bege bem claro. Era um local muito agradável e aparentemente chique. Era mais usado para casamentos mesmo.

Como Eduardo estava mais a par de tudo do que eu, contou que a área externa dava para 150 pessoas, o mesmo número de mesas e cadeiras. Havia ali um quarto para noivos, um quiosque iluminado (para cerimônia ao ar livre), piscina com luz interna e um amplo espaço natural. Pasmei quando Eduardo disse que o valor da locação era de 3.000 reais.

- Eu, hein! Não daria tudo isso por um salão. - disse, quando nós dois nos sentamos numa mesa vaga no interior do salão.

- É que a qualidade do lugar é grande. - justificou Eduardo.

Todos os convidados (que pareciam ter brotado do chão de tantos que eram), foram se ajeitando nas mesas também. Rafael e Lucas nos encontraram e se aproximaram de nossa mesa.

- Quero comer os salgadinhos. – disse Rafael. – Disseram que vai ter bolo também. Vai ter bolo, né?

- Vai, vai ter. – respondeu Duda.

Sofia ficou no meu colo. Como era uma menina comportada, ficou bem quietinha. Não berrou, não esperneou e nem chorou. Estava tranqüila, mas já pedia comida.

- Você não alimenta sua filha, não? – indagou Rafael, sentado ao meu lado.

- Alimentei. Tomamos café juntos.

- Papai, queio água. – disse Soffy.

- A lá. Vai dar água pra menina. – disse Rafael.

Levantei da cadeira, carregando Soo, e me perguntando onde haveria uma cozinha nesse imenso lugar. Aparentemente percebendo minha dúvida, Eduardo disse:

- Pergunte aos pais do Marco onde fica a cozinha. Eles devem saber, eu acho.

- É, vou sim. – disse.

E me afastei.

Eduardo

Cada mesa redonda tinha seis cadeiras. Observei o povo entrando e se acomodando. Logo um DJ que eu vi lá em cima do mezanino começou a ajeitar seus equipamentos e tão logo a música tocou. Era dia. O salão estava bastante claro. O falatório ganhou vida quando todos os convidados chegaram.

Leonardo e Michelangelo sentaram conosco.

- Bruno conhece toda essa gente? – indagou Mick, ao sentar-se ao meu lado.

- Me parece que foram os pais deles que convidaram a maioria. – respondi. – Marco e B.B convidaram, se não estou enganado, umas quatorze pessoas, tirando a gente.

- Onde está o Donatelo?

- Foi procurar a cozinha. – disse Rafael, analisando o enfeite de mesa, que era um vaso de flores. – Esse negócio tá muito chique. Olha só. Pratos chiques, talheres chiques e taças! Eu esperava um copo vagabundo, mas nos deram taças! Isso está mais parecendo festa de casamento hetero. E onde está o garçom? Está quase na hora do almoço. Não comi nada esta manhã pra arrasar com a festa.

Rimos.

Quando Bruno e Marco se aproximaram de nossa mesa, me levantei e abracei a cada um. Desejei muitas felicidades aos dois. Mick e Leonardo fizeram o mesmo. Bruno estava radiante. Via em seu olhar que ele estava vivo. Tagarelou sem parar e gesticulou sem parar. Vestia uma camisa social de uma tonalidade de azul muito bonita. Já Marco vestia terno preto e gravata. Muito elegante e charmoso. Deixou os cabelos longos soltos como sempre os deixava.

Ambos rodearam nossa mesa por um tempo e depois se afastaram quando foram abordados por uma convidada. Neste momento, Donatelo retornou. Sentou ao meu lado e deixou Sofia em seu colo.

- Dei uma volta por aí. Um lugar tão grande e não tem área pra criança.

- Não tem? – indaguei.

- Não. Mas a cozinha é lá nos fundos. Estão preparando os salgados. Está um cheirinho muito bom lá. Uma das garçonetes deixou a Soo pegar uma coxinha.

- E não trouxe uma coxinha pra mim? – disse Rafael, pra Sofia.

Rafa provocou Sofia com beliscões e cócegas. Mais tarde, vimos os garçons irem de mesa em mesa oferecendo os salgados. Quando chegou nossa vez, recebemos coxinhas e bolinhos de queijo.

- Finalmente! – disse Rafael, engolindo uma coxinha.

- Algum de vocês tem compromisso neste final de semana? – disse Leonardo, de repente.

- Meu compromisso é com meu anjo. – disse Dodô.

- Eu não farei nada. – respondi.

- Pretendia sair, mas... Não vou mais. – disse Mick.

- Eu não vou a lugar nenhum. – disse Lucas.

Rafael respondeu o mesmo.

- Pensei em nós todos nos reunirmos lá em casa. Pra ouvir música... Comer...

- Ao invés de ser na sua casa, não pode ser na chácara do meu tio? – ofereceu Rafael. – Ele pretende tirar a TV da sala de lá. Meu primo ia buscar a TV pra ele, mas pode ser eu. Assim a gente aproveita pra curtir um dia lá.

Todos concordamos quase ao mesmo tempo.

- Será que Bruno e Marco desejarão ir? – disse Leonardo.

- Xiiii! Estarão viajando. – disse Rafael.

- Viajando?

- Pra onde?

- Ops! Não posso contar. Prometi a Marco que guardaria segredo. – disse Rafael.

- Conta pra gente, vai. – disse Donatelo.

- É, que é que tem? – disse Mick.

- Bem, posso contar se vocês não abrirem a boca pro Bruno que ele ainda não sabe. O caso é que o Marco comprou duas passagens para os dois irem a Barbados, lá no Caribe.

- Sério?

- Uau!

- Que ótimo!

- Muito romântico!

- Segundo o Marco, é uma viagem de nove dias. Eles viajarão amanhã de manhã. Agora que eu contei, fiquem caladinhos, viu? Nada de abrir o bico gay pro Bruno.

- A única coisa gay aqui é você. – disse Leonardo, zoando.

Continuamos conversando até o momento em que Donatelo saiu do salão com Sofia. Segui-os sete minutos depois que saíram. Vi-o andando com ela em torno da piscina, que ficava ao lado do salão. Parei ao lado da piscina e os observei. Donatelo segurava um prato de louça com salgadinhos e dava salgadinhos a Sofia quando ela pedia com a mão. No instante em que ele levantou o rosto e me viu, sorriu.

- Chamei-o de tonto. – disse uma voz, atrás de mim.

Ao me virar, vi Leonardo. Ele deu mais um passo e ficou ao meu lado.

- Chamou a quem?

- Donatelo.

- Por que?

- Foi me perguntar se tudo bem se vocês namorassem. Confesso que me surpreendi.

O observamos na distância. Leonardo e eu fizemos silêncio até que ele pôs-se a falar:

- Conversamos por um tempo e, bem, acho que eu o fiz pensar.

- Ele anda muito calado e distante. Acho que a conversa de vocês não adiantou muito.

Leonardo soltou um riso:

- Ah, adiantou sim.

- Por que diz isso? O que você sabe que eu não sei?

- Encontrei sua mãe na feira semana passada.

- É, ela falou pra mim. Disse que quis te convidar para almoçar, mas achou que talvez você não quisesse aparecer na casa dela.

Ele me olhou fixamente:

- Prometo ser mais presente daqui pra frente. Sinto saudade de todo mundo reunido.

- Acho que todos nós sentimos.

Sorrimos um ao outro. Donatelo chegou até nos junto de Sofia. A pequenina derrubou um pedaço de kibe que comia e seu pai logo se adiantou:

- Dá pro papai. Este está sujo. – disse Donatelo, pegando o kibe que caíra da mão de Sofia.

- Tá suzo. Não pode comer.

- É, isso mesmo. Não pode comer porque sujou.

Donatelo enrolou o kibe sujo num guardanapo de papel e passou outro kibe para Sofia.

- Bem, vou entrar. Deu sede. – falei, quando a sede apertou bruscamente.

Deixei os dois lá fora e entrei no salão pela porta principal. Quando eu acabara de cruzar a porta, B.B se aproximou de mim e me puxou pelo antebraço:

- Vem, vem dançar comigo.

- Por que não dança com seu marido?

- O Mi tem vergonha de dançar.

- Achei que ele não soubesse dançar.

- É, isso também.

Fui no embalo. Acabei dançando com ele e, durante nossas danças, percebi que Rafael e Mick também vieram se juntar aos “alegrinhos” da festa. O DJ só estava tocando Dance Music. Reconheci algumas músicas que pareciam já ser muito antigas.

Donatelo

Houve um momento em que Mick e Rafael voltaram a se sentar em nossa mesa, depois de muito “rebolarem” no centro do salão, onde todos dançavam. Eu os observei de vez em quando e agora olhava para Bruno e Eduardo. Quando vi que Eduardo foi para o fundo do salão, decidi segui-lo, mas antes pedi que Rafael olhasse a Sofia pra mim.

- Volto logo. Preciso fazer algo antes. – falei, me levantando da cadeira. – Sofia, fique com o tio Rafael que eu já volto, tá?

Deixei-os para trás e, antes de seguir Eduardo, parei ao lado de B.B e perguntei para onde Eduardo tinha ido.

- Foi ao banheiro. – respondeu.

Andei apressado até a direção do banheiro. Entrei por uma porta que me levou até um corredor onde, do lado esquerdo havia uma porta com uma placa indicando banheiro masculino. Do lado direito, vi uma porta que indicava o banheiro feminino. Entrei no banheiro masculino. Não havia ninguém ali. Ninguém usava os mictórios e a maioria das portas das cabines estava aberta, a não ser uma. Aproximei-me desta porta, encostei-me à parede ao lado dela e, encarando a porta, disse:

- Eduardo, eu queria conversar com você... É... Desculpe não ter te falado antes, mas é que precisei de todo este tempo para pensar e... As coisas que aconteceram me serviram de alerta pra que eu percebesse o erro que estava cometendo. Quero te fazer uma promessa de que desta vez é pra valer. Agora nosso relacionamento é pra durar. Quero mostrar o quanto você significa pra mim, de todo meu coração, porque eu te amo.

Tomei fôlego e coragem e continuei:

- Me fizeram ver que não estou cometendo nenhum pecado. Acho que me sinto mais leve agora, sabe? – ri e prossegui: - Então pode confiar em mim. Vou cumprir a promessa. Vou mostrar, daqui pra frente, que te amo de verdade. Quero continuar sendo seu amigo e namorado. Quero continuar cuidando de você porque tudo o que você faz é importante pra mim.

Ouvi barulho no trinco da porta e ela se abriu. Quem saiu da cabine não foi Eduardo. Foi um rapaz moreno que nunca vi na minha vida.

- Ham? Eduardo... Achei que... Desculpe. Desculpe.

No instante em que me virei para sair do banheiro, dei de cara com Eduardo, que pelo visto acabara de entrar.

-Você? – soltei. – Achei que estivesse aqui no banheiro.

- Passei na cozinha antes. – disse.

Ele olhou-me fixamente e franziu as sobrancelhas:

- Está corado?

Abaixei a cabeça e depois pedi desculpa ao rapaz moreno que, neste momento lavava as mãos numa das pias.

- Sem problema. – respondeu o rapaz, e saiu do banheiro.

- Por que está corado? – disse, sorrindo de lado.

- Entrei aqui pra conversar com você, achei que estivesse usando aquela cabine e disse um monte de coisas para aquele rapaz que saiu.

- É? – disse, rindo. – E o que você disse?

- Bem...

- Não, não precisa dizer. – falou, se aproximando e pegando na minha mão. – Eu cheguei ao banheiro quando você fazia uma promessa. Não é isso?

- Você ouviu? – indaguei, sentindo um pouco de nervosismo.

- Ouvi.

- Safado! Você podia ter aparecido, assim evitaria o meu constrangimento de dar de cara com o carinha da cabine.

Ele riu.

- Eu gostei muito das coisas que você disse. – falou, com um largo sorriso no rosto. – Achei que você nunca conseguiria ver que as coisas ficaram sérias entre nós, que você se transformou de meu amigo querido para alguém muito especial pra mim. Achei que eu não estivesse sendo claro o bastante. Você é bonito, é charmoso, tem um jeito cômico de falar e agir, tem um coração enorme também...

Sorri:

- Não precisa me elogiar. Não, precisa sim. Pode continuar. Brincadeira! Não precisa não.

- Então desta vez é pra valer? Posso botar fé no que você disse? Como pretende mostrar que me ama de verdade? O que vai fazer?

- Ah, bem, coisas simples. Coisas simples.

Eduardo tocou na ponta da minha camisa e depois levantou o rosto para me beijar. Nosso beijo me causou uma felicidade muito grande. O beijo terminou quando ele afastou a cabeça para trás e me fitou. Naquele instante um cara entrou no banheiro. Saímos do caminho e ficamos num cantinho do banheiro, sem que pudéssemos atrapalhar os passantes.

- Sabe no que me lembrei outro dia? – começou ele, com os lábios avermelhados e os olhos mais azuis. – Lembrei quando você deu uma de guarda-costas pra mim, lembra? Quando me fez companhia na escola?

- É, me lembro.

Quando tal assunto despertou lembranças em minha mente, resolvi falar:

- E... Você lembra quando provoquei Leonardo te dando um selinho? Naquela vez em que descobrimos que vocês escondiam o relacionamento?

- Sim.

- Pois é, - ri. – a partir daí eu pensei a... Eu comecei a ter pensamentos que não condiziam com a minha heterossexualidade.

- Como é? – pestanejou, sem compreender.

- Eu tive pensamentos a seu respeito que, na época eram somente... Eram somente, ham... Fantasia. Algo do tipo.

- Você fantasiava comigo? – indagou, espantado.

- Não leve para este lado. – me apressei. – Não era nada sexual. Era só curiosidade inocente. Eu te dei um selinho e imaginei como seria... Quero dizer, descobrindo que você e Leonardo eram gays, eu... Droga! Eu não devia ter falado isso... Eram somente sonhos... Não sei como posso chamar. Não. Não eram sonhos. Só pensamentos. Esses pensamentos não duraram muito. Foi uma coisa de momento.

- Sério?

- Vamos mudar de assunto? Estou me comprometendo aqui.

Ele não tirou os olhos de mim, fazendo meu rosto queimar ainda mais. De repente, vi Rafael entrar no banheiro.

- Vão cortar o bolo, suas bicha! Vamos lá pro salão. – disse ele.

Eduardo virou o rosto para trás e encarou Rafael:

- Já estamos indo.

- Estavam se pegando? – indagou ele, com olhar de desconfiança maliciosa.

- Não. – respondeu Eduardo.

- Iam se pegar?

- Não. – respondi.

- Pretendem se pegar?

- Não! – falei.

- Esfriem o fogo do rabo e venham comigo. Vão cortar o bolo e Bruno quer que vocês estejam presentes. Andem. Dêem uns amassos mais tarde.

Saímos do banheiro com Rafael. Eduardo, que há tempos segurava minha mão direita, não a soltou em momento algum e, só depois que chegamos ao salão, me dei conta de que Sofia não estava com Rafael.

- Cadê minha filha?

- Não se preocupe. O Lê e o Mick ficaram com ela. Olha eles lá.

- Ah, menos mal.

Rafael virou-se para mim e disse:

- Se você não parasse pra dar uns pegas no Du, saberia onde sua filha está.

- Não estávamos nos pegando. Só estávamos conversando.

De súbito, vi que, no centro do salão, haviam posto uma mesa e sobre a mesa, um lindo bolo de casamento de três andares com dois bonequinhos de biscuit sobre o topo. Os dois bonequinhos eram a cara e focinho de Bruno e Marco.  Leonardo e Mick se aproximaram da gente, peguei Sofia e a carreguei. Os convidados se posicionaram em frente da mesa do bolo, B.B e Marco, atrás, e as fotos começaram a ser tiradas no momento em que ambos cortaram o bolo. Foi mais um momento de grande alegria para todos.

A festa teve seu fim duas horas mais tarde, depois que o bolo foi servido. Nós, amigos dos recém-casados, e familiares de ambos, permanecemos na chácara por mais uma hora. Presenciei o momento em que Marco contou a Bruno que havia comprado passagens para Barbados. (É desnecessário dizer o quanto Bruno ficou feliz).

Senti, naquele momento, que o relacionamento dos dois tornou-se algo muito maior e mais forte do que era antes. Nunca soube de nenhuma briga entre os dois e suspeitava que o relacionamento continuaria desta forma. Eles pareciam se entender muito bem. Pareciam conhecer um ao outro muito bem. Respeito mútuo. É disto o que um relacionamento precisa. E, é claro, o algo mais: o amor.

Na volta para casa, refleti sobre o assunto. Assim que chegamos em casa, Sofia quis deitar no colchão da sala. Ali ela ficou, vendo TV. Dei-lhe suco de uva para beber. Duda e eu nos trocamos no quarto. Ele entrou no banheiro para tomar banho e depois se trocou para ir à clínica. Disse a ele para ir de carro.

Nos despedimos na calçada.

- Quando volta? – perguntei, depois de nos beijarmos.

- Eu aviso antes.  Faz uma janta gostosa pra gente?

- Faço.

Deu-me outro beijo e se foi. Quando o carro já se distanciava, vi Sofia caminhar pela garagem com sua garrafinha de suco na mão.

- Tio Duda.

- Ele foi trabalhar. – falei, atravessando o portão social e entrando na garagem. – Mais tarde volta.

Minha tarde foi assim: dei banho em Sofia, brinquei com ela, vimos televisão e comemos um lanchinho um pouco antes das sete da noite. Às 7h21m, Eduardo me ligou dizendo que já estava voltando. Dei a idéia de comprarmos um frango assado. Ele topou. Enquanto eu o esperava chegar, coloquei Sofia para dormir na cama do seu quarto. Uns minutos depois, entrei no meu quarto. Guardei um par de meias na minha gaveta de cuecas e percebi que o pacote de camisinhas estava vazio.

- Que? Acabou?

Revirei a gaveta e não encontrei nada.

Mais tarde, Eduardo chegou trazendo um frango assado. Arrumei a mesa para a janta enquanto ele trocava de roupa. Logo mais, sentamos para comer. Há esta hora eu já estava bastante inquieto.

- Vou à farmácia. – disse, de súbito.

Não olhei para Eduardo, mas notei que ele virou o rosto para mim.

- O que vai comprar lá?

- Remédio.

- A Sofia está doente?

- Não.

- Você está?

- Não. Ééé… Só pra deixar o remédio em casa caso precise.

Minha intenção não era essa, mas eu precisava mentir para encobrir meu propósito obscuro. Jantei rápido, me aprontei, peguei o carro e fui para a farmácia mais próxima. Lá, comprei um pacote de camisinhas e, para despistar, Apracur. Voltei para casa. Quando entrei no quarto, vi que Eduardo estava deitado na cama de casal vendo TV. Entrei devagar, com o pacote de camisinhas no bolso do jeans. Tirei meus tênis, minhas meias, a jaqueta, troquei de camisa e troquei o jeans por um moletom.

Deitei ao seu lado, jogando a manta e o lençol sobre o corpo. No instante em que me deitei, Eduardo veio até mim, deitou a cabeça em meu peito e jogou o braço direito sobre meu abdômen. Beijei o topo de sua cabeça.

- Seu esmalte está saindo. – disse ele, depois que pegou minha mão esquerda e examinou minhas unhas.

- É.

Com a mão direita, acariciei sua nuca. Ele contraiu os ombros, dizendo que sentira cócegas.

- Você é muito sensível.

- Não sou não. – disse ele.

- É, é sim. – ri.

Tornei a acariciar seus cabelos e, conforme meus pensamentos se afundavam no mais profundo poço de malícia, a excitação aumentava, rumando para as partes mais perigosas do meu corpo.

- Esse filme passou ontem.

- Hm. – disse, sem dar atenção.

- Na verdade acho que passou a semana toda.

Olhei de seus cabelos para a TV. De repente, Eduardo levantou o rosto para mim, agarrou minha mão direita e disse:

- Pode continuar me fazendo carinho até eu pegar no sono?

Sorri:

- Você já quer dormir?

- Estou cansado. – disse, deitando a cabeça em meu peito de novo.

- Espere um minuto.

Levantei da cama e fechei a porta. Depois abaixei o volume da TV. Ao olhar para Eduardo, vi-o deitado de lado, com as mãos embaixo da bochecha, os olhos na direção da televisão e as pernas encolhidas debaixo da manta. Ao invés de voltar a minha posição anterior, decidi fazer o contrário. Deitei atrás dele e o abracei. Ele virou o rosto para o meu lado o máximo que pôde.

- Ainda não quero dormir.

Inclinei a cabeça para frente e apossei-me de seus lábios. O beijo se intensificou quando ele o retribuiu. Para apressar as coisas e evidenciar minha intenção, retirei minha camisa e me livrei da calça. Só de cueca, tornei a deitar-me atrás dele e o beijei outra vez. Ao morder a curva do seu pescoço, inspirei a fragrância inata do seu corpo.

- Me dê um espaço. – pediu.

Afastei-me um pouco e permiti que ele saísse debaixo da manta e do lençol. Em seguida, retornamos às nossas posições. Dediquei alguns minutos de meu tempo a beijar-lhe o pescoço, sem descolar nossos corpos. Escorreguei a mão direita por seu tórax e abdômen. Depois levei esta mesma mão à sua cintura. Cada contato com ele elevava meu nível de desejo. Pressionava minha pélvis contra seu bumbum, e ele trazia seu bumbum em minha direção, me apertando e estimulando graciosamente.

Dali, puxei sua calça e ele próprio se despiu, sem precisar levantar da cama. Em seguida, enquanto ele tirava a camisa, arranquei minha cueca. Nu, Eduardo deitou de bruços como eu pedi. Sobre ele, beijei-lhe muitas vezes nas costas e nos ombros, até terminar por beijar-lhe no bumbum. Fiz mais que isso: beijei-lhe lá no fundo, fazendo com que ele deixasse escapar um som baixo, nada mais que um gemido abafado. Ele soltou outros mais enquanto eu permanecia a beijá-lo ali. Do seu bumbum, tornei a beijar suas costas e fui subindo até voltar a sua nuca. Toda esta minha ação causou-lhe uma reação imediata de pequenos e quase imperceptíveis tremores. De sua boca continuaram saindo ofegos e gemidos abafados. Totalmente sobre ele, deitei o rosto em seu ombro, com a ponta de meu pênis já lhe roçando o bumbum.

Eu não podia penetrá-lo ainda por não ter posto a camisinha, mas vontade não me faltou. Eu era tão sacudido por tremores quanto ele. Estava tão e completamente imerso no desejo quanto ele. Era maravilhoso sentir aquele corpo quente tão próximo.

Fechei meus olhos e pensei: "Agora não. Agora não.". Eu não queria sair de perto dele, mas eu era forçado a isso e então me levantei para buscar a camisinha no bolso da calça que eu havia guardado dentro do guarda-roupa.

Não sei como consegui manter-me de pé, sendo que todo o sangue de meu corpo estava concentrado em um único ponto. Meus músculos estavam rígidos. Minha mente inteiramente voltada para o que estávamos fazendo.

Tirei a camisinha da embalagem e a vesti e então pude saciar minha vontade e deitar-me sobre Eduardo outra vez. Beijei-lhe no pescoço e na nuca e meu próprio corpo procurou penetrá-lo, e o fez, com uma lenta e suave arremetida. Beijei seu braço enquanto meu pênis agora se mantinha meio fora. Com um movimento da pélvis, recuei e arremeti outra vez, lentamente, e ofeguei junto com ele, quando senti que seus glúteos comprimiram meu pênis da maneira mais prazerosa possível.

Ficamos naquela movimentação lenta e gostosa. Descansei o rosto sobre seus cabelos, saboreando cada momento. Movimentava-me sem pressa, e ele contraía os glúteos. Resolvi levantar um pouco para poder ter mais movimento com os quadris. Então pude friccionar dentro dele e beijar-lhe a nuca.

Ele movimentou a pélvis naquele momento, e continuou contraindo os glúteos. Quando ele conseguiu se virar uns centímetros para o lado, meus lábios alcançaram sua bochecha. Em seguida, ele tornou a deitar o rosto no travesseiro e nossos quadris se movimentaram na mesma direção.

Nossos movimentos se intensificaram nos levando ao cume do prazer. E logo eu despenquei sobre ele, deitando o rosto em seu cabelo e me contorcendo junto com ele para alcançar as profundezas do seu corpo que eu ainda não havia alcançado. Seus músculos se contraiam e quando mergulhei a mão esquerda sob seu corpo, senti-o totalmente duro.

Nossos corpos já estavam muito quentes e eu já nem mais sentia aquele ar frio que estava fazendo. No instante em que comecei a me mover outra vez, outro clímax delirante me levou às alturas. Cada arremetida que eu dava, parecia intensificar os seus ofegos. Ele estava gostando e isto me causou grande júbilo, assim como sentir as contrações do seu corpo.

Ao penetrá-lo mais fundo e a arremeter com mais velocidade, acompanhei-o no orgasmo, excitando-me com seu longo e contínuo gemido. A fricção me fez explodir em prazer. Daquele momento em diante, caí sobre seu corpo, descansando meu rosto sobre seus cabelos. Aspirei o perfume de suas madeixas e terminei por beijar sua orelha.

Depois daí, adormecemos.

Rafael

Neste sábado de sol, aluguei um caminhão, pra levar a galera... Brincadeira! HÁ! Recebi a carona de Leonardo para ir à chácara de meu tio como havíamos combinado. Ele me buscou em casa. Sentei no banco ao seu lado e aproveitei para plugar meu mp4 em seu rádio. Coloquei a música "Chopis Centis” para tocar.

- Adivinha quem estará lá com a gente?

- Vai mais gente à chácara?

- Só três pessoas. – respondi. - O Hiro do Pub, o namorado dele e o irmão. E adivinha quem é o namorado do Hiro? Adivinha.

- Sei lá. Quem?

- Adivinha.

- Não sei. Fale quem é.

- Sandro.

- Quem é Sandro?

- O ex do Du.

- Aaaaah! Aquele cara que foi com a gente...

- Exatamente.

- Hm.

- Eu quase não acreditei quando Hiro me disse que namorava ele.

- Você virou amiguinho dessa japa, é?

- Sim, virei. O cara é super bacana e quem ri das minhas piadas tem um ponto a seu favor.

Ele riu:

- Sei... E o irmão do Hiro? Quando o conheceu?

- Ele tem uma choperia. Dá pra acreditar num japonês dono de uma choperia? Mas fui lá e conheci o lugar. É lugar de gente rica, meu chapa. Pelo que entendi, a família do Hiro é de japoneses com grana. O irmão do Hiro é meio serião, sabe? Mas me deixou beber de graça na choperia dele, por isso tem mil pontos a seu favor.

- Ai, Rafael! – exclamou, gargalhando. – Você vai afundar o negócio do japonês se continuar indo lá pra beber de graça.

Leonardo passou na casa de Mick para pegá-lo e depois buscou Lucas. Quando nós quatro já estávamos no carro, liguei para Duda para saber se já estavam indo para a chácara. Em seguida, liguei para Hiro. Fomos os primeiros a chegar. Abri o portão para que Leo pudesse estacionar. Os próximos a chegarem foram Sandro e Hiro. Em seguida veio Samanosuke em seu carro (carro chique, carro chique). Donatelo e Eduardo vieram por último.

Engraçado que, quando estes dois últimos se deram com Sandro, a surpresa foi grande, principalmente para Eduardo. No entanto nem Sandro e nem Duda disseram: “É meu ex!”. Ambos se cumprimentaram educadamente. Donatelo pareceu o mais abalado e chegou a me abordar na cozinha, no momento em que todos passeavam pelo exterior da chácara.

- O que te deu pra convidar o Sandro?

- Eu só o deixei vir porque o Hiro me pediu. Não pude negar-lhe o pedido. Eu tenho bebido de graça lá no Pub, sabia?

Ele se calou, ainda que, talvez, quisesse me repreender um pouco mais. De repente, Lucas apareceu na cozinha entrando pela porta dos fundos.

- O que estão falando? – perguntou.

- O Donatelo está dando uma de histérico.

Fui até a porta, por onde Lucas entrou, e espiei o pessoal.

- Vejam só. Os dois ‘ex’ juntos. Leonardo e Sandro. Se o Marco estivesse aqui, a piada ganharia proporções mais engraçadas. Percebeu como todos vocês namoraram trezentos carinhas nos últimos anos? O Mick, por exemplo, deve ter ficado com uns cinqüenta só este mês. O Leonardo já fez diferente. Saiu com um amigo meu, mas não voltou a procurá-lo.

- Não gostou dele? – indagou Dodô, se aproximando de mim.

- Não, ele lembra o Duda.

- Ah, é? Em que?

- Na estatura, nos olhos azuis e nos cabelos claros. O Muca e o Du são parecidos, se bem que o Du é mais “jeitosinho” que o Muca.

- Como é o nome do seu amigo?

- Muca é só um apelido. Às vezes o chamamos de Mu de Áries também. O nome dele é Murilo, na verdade.

Fomos para fora e alcançamos o pessoal, que agora estava perto do cercado da propriedade.

- Ó o riozinho ali. – apontei.

- É nesta chácala que aconteceu aquele episódio com a galinha? – indagou Hiro.

- É, é sim.

Hiro riu e virou-se para Samanosuke:

- Watashi ga anata ni itta hanashi o oboete imasu ka? – disse.

- Hai, watashi wa oboete imasu.

- Eles estão falando em japonês! – cochichou Donatelo, próximo ao meu ouvido.

- É como assistir a um anime. – falei, maravilhado.

Ficamos ali um tempo até o povo se dispersar.

Eduardo

Fui até o carro para pegar o carregador do meu celular quando notei que a bateria estava morrendo. No momento em que abria a porta, vi Sandro se aproximar.

- Oi.

- Oi. – respondi.

Após uma pausa breve, disse:

- Não nos falamos mais depois que terminamos.

- É, verdade.

Peguei o carregador e fechei a porta.

- Espero que não guarde ressentimento.

- Não, eu não guardo. – respondi, sorrindo.

Contornei o carro para voltar ao interior da casa. Ele veio comigo.

- Achei que tivesse voltado à sua cidade natal.

- Eu resolvi ficar, afinal. Depois que terminamos, conheci o Hiro e, decidi ficar por causa dele.

- Namoram há bastante tempo então?

- Felizmente sim. E você?

- Estou com Donatelo.

Acenou com a cabeça.

- Você está morando na mesma casa que...

- Estou.

Sandro não mudara nada. Só os cabelos estavam maiores. Vi Hiro e Rafael aparecerem na varanda à nossa frente quase ao mesmo tempo.

- Viu só a cidade pequena em que vivemos? – comentou Rafael, em voz alta. – Quem iria imaginar que o Hiro fosse namorar o seu ex?

- Ex? – indagou Hiro.

- É, o Du e o Sandro namoraram.

- Como é? Eles dois?

Graças à boca grande de Rafael, Hiro passou a me olhar torto. Senti que ele não me permitiu se aproximar de Sandro. Não que eu quisesse me aproximar, mas ele afastou-o de mim nas oportunidades e não disfarçou os olhares desdenhosos para a minha direção.

- Que bobinho! O que ele espera que eu faça? – comentei a Donatelo, quando estávamos sentados em cadeiras reclináveis de frente para a piscina. – Acha que vou pular em cima dele?

Ele riu:

- Tenho pena dele.

- De quem?

- Do Sandro. Não sei por quê.

Donatelo reclinou um pouco a cadeira, esticou as pernas, fechou os olhos e suspirou:

- Este lugar é tão legal... Sorte que saiu um solzinho, né? Este frio é um pé no saco.

Levantei da cadeira e sentei em seu colo, fazendo-o recuar as pernas e abrir os olhos.

- O que será que Marco e Bruno estão fazendo agora?

- Devem estar nadando num mar azulzinho ou tomando banho de sol numa praia de areia branquinha... Eu não sei nada sobre Barbados. Você sabe?

- Vixi! Nada. – respondi.

Ele se desencostou das costas da cadeira e deitou o queixo em meu ombro.

- Estou com inveja dos dois. Também queria viajar. Ah, e... Por falar em viagem... Tenho que te contar uma coisa.

Como julguei que seria algo importante, virei meu corpo para que pudesse fitá-lo nos olhos.

- Meus pais pretendem voltar pra Itália e querem que eu vá junto.

- Que??

- Meu pai disse que um tio me ofereceu trabalho. Eles planejam voltar neste final de ano ou, no mais tardar, até julho do ano que vem.

- E você vai? – indaguei, já sentindo aflição.

- Eu não penso em ir. Eles disseram que lá eu terei boas oportunidades e que a Sofia terá uma boa educação. Disseram para eu pensar, mas o que tenho pra pensar? Não quero abandonar tudo o que tenho aqui.

Olhei-o fixamente e considerei as circunstâncias:

- Se lá você poderá ter e dar uma vida melhor a Sofia, então devia pensar no assunto.

- Como é? Quer que eu vá embora? – disse, rindo.

- Não, só acho que devia pensar no futuro dela.

- E no nosso?

Olhei-o. Ele continuou:

- Eu não tenho uma vida ruim. Eu ganho bem. Até agora não tive problemas com dinheiro. Tenho guardado dinheiro na conta da Sofia e sei que nada faltará a ela. É claro que a educação daqui não é tão boa quanto a de lá de Montespertoli, mas não me agrada em nada deixar tudo para trás.

- Então você não vai?

- Não, não vou.

- Ah, menos mal.

Sorri e me acomodei melhor em seu colo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Verdade Ou Desafio? - 9a Temporada" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.