Por Um Segundo escrita por Phallas


Capítulo 3
Você não tem escolha


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora, meus amores. ;)
Boa leitura !



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"Estou no começo do meu desespero, e só vejo dois caminhos: ou viro doida, ou santa."

Adélia Prado


– Conhece o jornal da escola? - Sra. Mckingdom me pergunta, atirando um exemplar do Westpaper para mim.

É claro que eu conheço o jornal da escola. Só não leio. Ninguém lê o jornal da escola.

– O que tem? - Dou de ombros.

– A escritora de uma das colunas completou o Ensino Médio ano passado então precisamos de alguém para assumir a coluna de novo.

Meu corpo se enrijece.

– Qual coluna?

A diretora estala a língua.

– "Pergunte a Amy".

Sinto uma corrente elétrica passando por cada célula do meu corpo. De todas as colunas, a de esportes, eventos, notícias, até mesmo de moda, que sei que Tensy ficaria feliz em fazer para mim, a coluna vaga é a pior de todas. A mais brega, a mais ignorada e motivo de piada por todo o colégio. A coluna de conselhos.

"Pergunte a Amy" nada mais é do que o lugar dos sofredores. Nerds, isolados, desequilibrados, loucos, impopulares, todo o tipo de perdedor total, mandam cartas e mais cartas para Amy para conseguir ajuda.

– Você está me dizendo - Falo - que eu vou ter que sair por aí ajudando as pessoas.

Sra. Mckingdom se levanta e se apoia na mesa, de frente para mim.

– Isso. A coluna aparece no jornal duas vezes por semana. Seu dever é ler as cartas que recebemos e escrever conselhos para o Westpaper. Nada demais.

– Vou ter que fazer isso durante um ano inteiro? - Pergunto, o queixo caindo.

– Claro. - Ela diz, como se fosse óbvio. - Algum problema?

Minha cabeça está girando. Ela não entende o problema. Ela não pode entender o problema.

– Bellie, escute - A diretora diz, se aproximando de mim. - Eu sei que será difícil para você manter um compromisso semanal como esse, mas você precisa melhorar seu desempenho escolar e eu só sugeri que fosse você a ocupante do cargo porque gosto muito de você e te dou minha confiança.

Não respondo. Não consigo fazer nada além de me agarrar ao braço da cadeira como se ele fosse me impedir de ser Amy.

Sra. Mckingdom suspira. Parece que já desistiu de tentar me consolar e assume um tom mais sério.

– Você sabe como funciona, não sabe? "Pergunte a Amy" já esteve nas mãos de inúmeras pessoas desde que começou, e nenhuma delas foi descoberta. O anonimato de Amy é que encoraja as pessoas a compartilharem seus problemas. Se todos soubessem quem escreve a coluna, ficariam envergonhados de exporem seus segredos.

A questão é exatamente essa. Ninguém poderá saber que eu sou Amy.

– Sra. Mckingdom, você tem certeza que de esse é o único cargo que posso ocupar? Podemos criar uma nova coluna, que tal? Posso comentar o cardápio da cantina. As pinturas das quadras. As lâmpadas da sala. Por favor, qualquer coisa menos Amy.

Sra. Mckingdom fita o teto durante um segundo.

– Já existem pessoas fazendo isso, Bellie. Quer dizer, não as lâmpadas. - Ela fala. - E se você recusar a única oferta que estamos fazendo, vou ter que te tirar do time de vôlei.

Engulo em seco.

– Não posso sair agora, sra. Mckingdom, a liga estadual é esse ano.

– Se comporte se quiser ficar. - A diretora fala. - Estude, tire boas notas, ajude as pessoas com problemas, não deixem que descubram que você é a conselheira e não conte a ninguém os segredos dos alunos.

– E se... e se eu deixar escapar que sou Amy e sem querer contar o segredo de um leitor a alguém?

Sra. Mckingdom comprime os lábios.

– Bom, no primeiro caso, você não poderá mais ser Amy o que nos leva a sua exclusão do time de vôlei. - Ela responde, e eu sinto meu peito se contrair. - No segundo caso, por ter exposto a intimidade de alguém, Bellie, não terei alternativa a não ser expulsá-la.

Não acredito que isso esteja acontecendo comigo. Agora dependo de uma habilidade que não tenho. Me sinto refém de mim mesma.

– E como o jornal não é muito apreciado pelos alunos daqui - Diz a diretora, indiferente ao tom de verde de minha pele. - ler o jornal, comentar as reportagens e mandar cartas à Amy serão deveres de casa de todas as séries.. Assim você poderá ajudar até mesmo os nosso alunos mais problemáticos, mas são teimosos demais para ir atrás de conselhos. - completa, e quase pula de felicidade.

Eu pisco com força e tenho vontade de me beliscar para garantir que isso não é o pesadelo no qual caí sem querer e do qual agora não consigo me livrar. Ela por acaso disse "dever de casa de todas as séries"?

– Deixe-me ver se eu entendi. - Falo, tremendo. - De agora em diante, os segredos do colégio todo estarão na minha mão, é isso?

– Basicamente sim. - Sra. Mckingdom diz, como se não visse nada demais no fato.

– E se qualquer um deles escapar serei expulsa. - Continuo.

A diretora sorri.

– Você demorou para entender.

Junto as mãos e fecho os olhos. Me imagino com cartas contendo os segredos de todos os alunos nas minhas mãos. E tendo que ajudá-los a superá-los com palavrinhas quaisquer escritas no papel feio do jornal de Westward.

– Você pode vir aqui amanhã à tarde para conhecer a equipe de edição do jornal? Somente eles terão acesso à sua identidade, mas a coluna é exclusivamente sua, você escolhe as cartas divulgadas, sempre em anônimo.

Para o bem da minha permanência no time de vôlei e no colégio, tento me levantar.

– Tudo bem. - Respondo. - Q-quando eu começo?

– Quando as pessoas esquecerem um pouco que eu a chamei aqui. Quando eu mandar o trabalho para casa, "Pergunte a Amy" estará de volta.

– Ok. - Digo, me sentindo enjoada, enquanto caminho para a porta.

– Não se preocupe tanto, Bellie. Guarde segredo e tudo ficará bem.


Acho que isso era para ser um consolo.


○ ○ ○



– O que ela queria? - Pergunta Tensy, assim que me vê chegando na cantina. Já está no horário do intervalo.

Algumas meninas estão com ela, além de Derek Hall, o lançador do time de baseball, que mantém seu braço ao redor da cintura de Tensy.

Eu respiro fundo. Começou. Vou ter que ficar mentindo, fingindo e me escondendo até o fim do Ensino Médio. Três coisas que eu definitivamente não sei fazer.

– Ela... só queria... dar os parabéns. - Invento.

– Pelo quê? - Diz Tensy, distraída com uma mecha de seus próprios cabelos.

– Pela... liga municipal.

– A liga que ganhamos três meses atrás? - Pergunta Patriccia Vanndersar, minha reserva no time.

Pisco algumas vezes e olho para os lados.

– É.

– Por quê? - Pergunta Lily Parker, outra das reservas. - Ela tinha falado com todas no dia do jogo.

– Bom ela... queria só dar um parabéns mais formal, só isso. E não achou justo tirar todas da sala de aula então pediu que eu disesse a vocês que nós jogamos com garra... disposição... união e é isso aí.

As garotas se entreolham. Nenhuma delas acredita no que eu falo, mas preferem não fazer mais perguntas.

Olho para os lados procurando Megan Parsons. Não pretendo falar com ela ou até mesmo deixar que ela perceba que ainda sei que ela existe, mas estou curiosa porque ainda não a vi. Parece que ela faltou à aula hoje.

Em vez de Megan, localizo outra coisa. Muitas pessoas vindas do portão de entrada, principalmente homens, chegam à cantina comentando algo, As meninas não parecem tão animadas quanto os garotos, mas falam mesmo assim. Tem alguma coisa errada. Os alunos não iam ficar tão excitados se não fosse nada. Tensy e as demais meninas do time olham ao redor procurando a causa de toda essa agitação. Pessoas e mais pessoas chegam falando alto e gesticulando muito. Algo bem interessante está formando esse escândalo. O que diabos está acontecendo?

Então eu vejo.


Uma garota. Alta, magra, a pele clara. Cabelos negros e brilhantes que caem lisos até a cintura. Ainda vestida com suas próprias roupas, ela caminha para cá. Os olhos são azuis mas não é preciso muita atenção para perceber que a íris apresenta tons de violeta.


E, rindo e abraçado com ela em uma forma bem íntima, está o meu namorado.


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