Ano Novo. escrita por AnaBonagamba
Eu nunca vi minha mãe tão agitada. Nos últimos dias eu via a Senhora Riddle sentada em sua cadeira de balanço, remexendo cartas e mais cartas, fotos perdidas de sua juventude, as poucas que restaram. Estava inquieta como jamais estivera, e meu pai, distante. Aquela distância entre os dois era mais estranha que o silêncio de mamãe. O silêncio dela significava ansiedade, e a distância de meu pai era resquício de sua determinação frágil perto dos desejos dela.
E, por fim, chegou quinta feira, e nossas malas prontas. A minha e a dela. Não me avisara de nada, e nem o fizera, pouco tempo tínhamos. Pegamos o trem às 16:00.
O porto de Londres sempre fora daquele jeito: cheio de pessoas vendendo, comprando, passeando, se entretendo. Ali parecia que o mundo se reunia, todas as línguas eram as mesmas, todos os olhares sempre focados nas embarcações que surgiam, que iam, e talvez nunca voltavam. Mary puxou-me pela manga do terno, e dirigiu-se até um dos maiores navios ali presente, branco e vermelho, ainda com os enfeites de Natal. Deu as malas para o encarregado e entrou no convés.
– Mãe? - perguntei confuso. - O que está fazendo?
– Entre no navio, Tom... - ela disse sorridente. - Vamos dar uma volta.
– Mãe, daqui 3 dias será ano novo... a senhora não pode deixar Little Hangleton.
– Entre no navio, Tom. - repetiu ela com mais autoridade, seus olhos azuis a brilhar por estar ansiosa, as mãos trêmulas como eu nunca vira. As mãos de minha mãe eram admiravelmente belas...mãos de uma verdadeira artista.
Pulei no convés sem ter a noção exata do que estava fazendo. Eu era jovem, mais do que eu queria ser, e mais do que eu aparentava ser. As pessoas ali não olhavam-me nos olhos, pareciam maravilhadas de mais com o que estava ocorrendo. Aos poucos a paisagem foi mudando e os olhos que fitavam e despediam-se já pareciam cansados e enjoados de todo aquele cerimonial.
– Para onde vamos? - questionei-a, que olhava o porto distanciar-se, apoiada em mim.
– Para um lugar incomum, Tom. - por sua voz notei ainda ansiedade, mas parecia aquietada a conviver com ela. - Queria fazer isso há muito tempo.
– Como chama esse navio?
– Grande Imperador. - sorriu. - Você vai entender o motivo em breve, querido.
Ela deitou sua cabeça em meu ombro e continuou a admirar a paisagem. Mesmo eu, jovem e imaturo, poderia julgar aquela visão como uma verdadeira obra prima, uma que eu sabia, com certeza, que ela pintaria mais tarde.
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velikiĭ imperator - grande imperador. Nem preciso dizer em que língua está, não é? :)