O Teatro escrita por GabrielleBriant


Capítulo 28
A Overdose




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XXVIII

A OVERDOSE

Linda olhou para as suas próprias mãos, trêmulas, suadas e frias.

A hora não passava. Aquela madrugada não parecia ter fim.

Quando Narcissa foi embora da sua casa, Linda quis procurar Severo imediatamente. Era uma da manhã. Ela soube que não podia ir para Hogwarts àquela hora – não haveria ninguém acordado no castelo e o Lorde das Trevas ficaria desconfiado se soubesse que, depois de uma conversa com Narcissa e no meio da madrugada, Linda procurara Severo, com quem não falava a mais de um mês. Teria que esperar amanhecer.

Agora, quase três horas mais tarde, ela percebia que a espera seria infernal. As palavras de Narcissa ecoavam em sua cabeça e, aos poucos, tudo – todas as atitudes de Severo que, eventualmente, provocaram o fim do seu casamento – começava a fazer sentido. Tudo teria sido diferente se ela tivesse confiado nele. Ela deveria ter escutado Dumbledore, que lhe dissera repetidamente que Severo falava a verdade. Ela deveria ter percebido o que ele estava fazendo e o apoiado.

Linda olhou para cima, tentando evitar que as suas lágrimas caíssem.

E se tudo aquilo fosse mesmo verdade?

Linda olhou para o chá que preparara há quase uma hora, descansando sobre a mesa de centro. A xícara ainda estava totalmente cheia – o nó em sua garganta estava tão intenso, que engolir era difícil – e o chá já deveria estar frio. Nauseante.

Ela suspirou, levantando-se e pegando a xícara. Tinha que se distrair. Se arrumasse a casa, ela teria horas de entretenimento e, com sorte, ficaria tão cansada que conseguiria dormir. Começaria pela cozinha.

Quando ela estava no meio do caminho, ouviu fortes batidas na porta. O susto a fez soltar a xícara, que se quebrou, espalhando o chá frio pelo chão. Um pequeno estilhaço de porcelana cravou-se em sua perna esquerda.

- Merda! – Ela se ajoelhou no chão, examinando o corte, e pegou a sua varinha. – Accio, toalha de rosto.

Uma toalha de rosto branca flutuou rapidamente do banheiro social e ela colocou-a sobre o corte, rapidamente estancando o sangue. Do lado de fora da casa, bateram novamente na porta – dessa vez com mais violência, fazendo a madeira vibrar.

- Um minuto! – Ela gritou.

Rapidamente se levantou, soltando a toalha sobre o chá derramado. Por precaução, empunhou a sua varinha – embora não acreditasse que alguém que desejasse lhe fazer mal fosse bater na porta.

Quando abriu a porta, ela soube que estava certa. Era Severo.

Linda piscou atordoada, esquecendo as preocupações e a aflição anterior. Severo parecia aborrecido, impaciente e bêbado, a julgar pelo olhar inexpressivo e sem brilho; mas era maravilhoso vê-lo. Linda queria abraçá-lo, e chamá-lo para passar a noite com ela, e perguntar se tudo que Narcissa lhe dissera era verdade. Mas, antes que ela pudesse reagir, ele disse:

- Você deveria ter desaparatado.

- O quê?

Severo, irritado, suspirou.

- Se uma pessoa bate na sua porta dessa maneira, no meio da madrugada, você não atende à porta, Linda, porque esta pessoa dificilmente teria boas intenções. Você foge. Desaparata ou usa a rede de Flu.

- Mas era você!

- Mas poderia não ter sido.

- Você está bêbado – ela bufou, abrindo totalmente a porta e permitindo a passagem dele. Observou enquanto Severo entrava. Os seus passos ainda estavam muito seguros, o que significava que ele não bebera o suficiente para perder o controle dos seus atos. As batidas violentas só podiam ter duas explicações: ele estava apressado ou nervoso... Mas aquilo não importava. Ela tinha muitas dúvidas que precisavam ser sanadas. – Eu estou feliz que você veio, Severo. Eu preciso conv-

- Você não sabe se cuidar! Eu vim lhe levar para Hogwarts.

A voz dele também estava firme – e a fala era sempre a primeira coisa que a bebida afetava em Severo. Algo estava errado; o olhar dele estava desfocado demais. E, ainda assim, Linda apenas queria fazer as suas perguntas.

- Eu estou me cuidado muito bem, Severo – Mostrou rapidamente a varinha, que ainda estava em suas mãos, enquanto se aproximava dele. – Escute, algo aconteceu hoje e-

- Não mude de assunto, Linda – Ele interrompeu novamente. – Você estar armada não muda nada! Você vem comigo!

- Severo, eu-

- Eu não quero mais ficar longe de você! – Ele disse sem olhá-la e muito rapidamente; as palavras se atropelando, como se ele temesse não conseguir falá-las. E Linda sabia o sacrifício que era para Severo dizer algo tão sincero e, por isso, perdeu o fôlego. – Você é a minha mulher e eu preciso de você ao meu lado. Eu faço o que você quiser – Os olhos dele cravaram-se nela e, após uma breve pausa, ele completou com a voz baixa e sombria. – Eu conto o que você quiser.

Ela sentiu um frio na barriga.

Seria assim? Depois de tanto tempo e tantas mágoas por causa dos segredos dele, Severo simplesmente apareceria em sua porta os ofereceria? Sem medo, sem arrependimento? E justamente no dia em que ela tinha mais dúvidas?

Linda mordeu o lábio inferior com tanta força que chegou a sangrar. Sem dizer nada, serviu-se com uma dose de uísque de fogo – certamente precisaria dela. Algo estava errado. Mas ela não se importava.

Entornou a dose.

- Sente-se, Severo – ela disse, logo pondo em seu copo mais uma dose.

Lentamente, ele assentiu, encaminhando-se para o sofá. Severo se sentou de uma forma muito rígida, como se não pudesse relaxar e, por um tempo, apenas ficou observando Linda brincar com a sua segunda dose de uísque.

- Então? – Ele exigiu rispidamente. – Você não passou os últimos meses reclamando que eu não sou sincero com você?

Linda suspirou, sem tirar os olhos da bebida.

- Narcissa veio aqui hoje. Ela me contou muita coisa. Ela falou da sua lealdade e... e eu acreditei.

- Ela não sabe de tudo.

- E você vai me contar... tudo?

- Espero que não – ele respondeu rapidamente. – Quero contar apenas a parte que importa.

Ela assentiu e, trêmula, sentou-se ao lado dele. De repente, não sabia o que perguntar. Ela não conseguia formular em sua mente uma só pergunta sobre os planos dele, ou a guerra, ou até mesmo sobre a noite que ele passou com Narcissa.

Ela apenas queria saber uma coisa:

- Por quê? Por que você mentiu para mim?

Severo crispou os lábios e desviou novamente os olhos dos dela.

- Porque era perigoso. Ainda é, na verdade. Muito. Quanto mais você achasse que eu estava servindo fielmente ao Lorde das Trevas, mais segura você estaria. Concordando ou não com o que eu estava fazendo, você sempre estaria ao meu lado; e, conseqüentemente, na sua cabeça, ao lado do Lorde das Trevas. Ele poderia vasculhar a sua mente o quanto ele quisesse, e veria apenas isso.

"Sabe, Linda, o Lorde não se importa com os motivos que levam os bruxos à seguir as suas ordens dele; contanto que elas sejam fielmente seguidas. Isso, adicionado ao fato que você é filha de Marco Malfoy, lhe deixava relativamente segura." Ele respirou fundo e Linda viu os seus punhos fecharem fortemente. "Além do mais, você poderia querer evitar que eu entrasse em perigo, o que não era interessante para mim. Eu sempre soube que eu poderia morrer por causa dessa minha... missão, e sabia que se você me pedisse para largar tudo, para desistir, eu ficaria tentado. Não podia deixar você me atrapalhar dessa maneira."

Linda assentiu, tentando absorver a franqueza com que ele dissera tudo – especialmente a última parte.

- Eu não atrapalharia – disse, quase num sussurro.

- Atrapalharia. Você não suportaria ver-me indo ao encontro do Lorde, se tivesse idéia da dimensão do perigo.

- Mas eu sabia de tudo... antes.

- Quanto eu tinha a Ordem da Fênix e Dumbledore ao meu lado, o perigo que você corria era inexistente. Desde que a guerra recomeçou, você passou a ser vigiada por Shacklebolt, Moody, Madame Rosmerta e Abelforth. Eles tinham ordens de lhe proteger, e de, caso você estivesse em qualquer tipo de perigo, comunicar a mim e a Dumbledore imediatamente. Depois da morte de Dumbledore você perdeu essa rede protetora e eu passei a temer pela sua vida.

- E a sua vida?

- Nunca me importou muito.

Linda franziu o cenho, sentindo o nó em sua garganta voltar. Quis dizer que a vida dele importava para ela; mas achou que seria melhor não mudar o assunto. Tinha que aproveitar a boa vontade de Severo.

- Você disse que ainda é perigoso. Por que, então, você decidiu me contar tudo agora?

- Porque eu sinto o Lorde das Trevas cada vez mais perto de mim, e eu não sei por quanto tempo eu conseguirei me manter tomando as atitudes certas. Você costumava me manter são, Linda. Além do mais, aparentemente, a minha morte é uma parte dos planos do Lorde das Trevas, e eu não quero passar os meus últimos dias sem você.

Ela perdeu o ar. O seu coração parecia querer explodir em seu peito e, por longos segundos, ela não conseguiu falar nada. Severo desviou o olhar depois de um tempo, perdendo a sua postura dura e deixando os seus ombros caírem. Ele parecia tão... frágil. Os olhos de Linda ficaram brevemente marejados e, com urgência, ela segurou o queixo de Severo e forçou-o a olhar para ela.

- O que você disse?

- Que eu sinto o Lorde das Tr-

- A última parte, Severo! – Ela exclamou rispidamente. – Sobre a sua morte!

- Então pergunte direito! – Ele respondeu com idêntica rispidez, mas os seus olhos ainda não exibiam brilho algum; continuavam mortos. – O Lorde estava procurando a Varinha das Varinhas, a última das Relíquias da Morte. Ele acabou de achá-la; e ela pertencia à Dumbledore. Acontece que, naturalmente, como eu matei Dumbledore, a varinha tecnicamente me pertence. E, para que o Lorde das Trevas conquiste a varinha, ele terá que, literalmente, passar por cima do meu cadáver.

- Então... fuja!

- Não posso.

- Por quê?

- Porque eu prometi à Dumbledore que apenas passaria a ver a minha missão como completa quando eu revelasse a Potter que-

Severo parou de falar abruptamente, sem deixar de olhar para Linda. Ela lembrou-se do início daquela estranha conversa, quando Severo dissera que contaria a ela apenas a parte que importava. Com a voz fraca, ela disse:

- Você não precisa me contar isso.

O canto esquerdo do lábio dele se ergueu, um sorriso agradecido.

- Eu tenho que revelar algumas coisas a Potter, e Dumbledore acha que o único momento em que será viável fazer isso será quando Potter e o Lorde das Trevas se encontrarem. Ele acha que, se Potter tiver a informação antes, toda a estratégia que ele teceu poderá ser posta em perigo.

Linda colocou as suas mãos carinhosamente sobre o joelho do seu marido. Angustiada, perguntou.

- Por que você faz tudo isso?

- Porque eu me sinto responsável pela morte de Lílian, e eu preciso me livrar desse fantasma! Se eu conseguir manter o garoto vivo por tempo suficiente e os planos de Dumbledore derem certo, Lílian não terá morrido por em vão; a morte dela terá sido necessária para que Potter crescesse com caráter e fibra para vencer essa guerra. Lílian não teria morrido por um erro meu, mas para pôr um fim no Lorde das Trevas. A culpa seria do destino; não minha.

- Então não é amor o que te leva a fazer tudo isso? É egoísmo?

- Egoísmo e amor. Mas primordialmente egoísmo.

Ela deu um meio-sorriso.

- E eu passei anos sentindo ciúmes de um cadáver. Eu pensei que você ainda a amasse.

Severo suspirou e calou-se por um tempo. Se Linda soubesse o que ele diria em seguida, jamais teria feito o pequeno desabafo...

- Eu a amo.

Ela abriu a boca, surpresa e decepcionada. Tudo que ela queria era ver alguma expressão naqueles olhos mortos de Severo... qualquer coisa. Ela queria que ele dissesse que aquilo era mentira.

- Você... ainda ama aquela mulher?

- Você não devia estar surpresa.

Linda amaldiçoou-se mentalmente por deixar que os seus olhos marejassem.

- Eu sabia... mas eu preferia que você mentisse.

- Eu não posso mentir – Ele fechou os olhos pesadamente. – Olhe, Lílian foi a primeira pessoa que me viu como um ser humano, e eu não posso esquecer isso. Eu sempre vou amá-la. Mas você, Linda... Você é a minha mulher. Lílian era uma fantasia e você é a realidade. Você é o que eu preciso. Eu nunca pensei que eu poderia ter um relacionamento de verdade, até que eu conheci você... eu nunca quis um.

"Amar uma fantasia é fácil... Bem mais fácil que amar uma mulher depois de passar dez anos acordando na cama dela. Mas, com você, é diferente. Amar você é simplesmente... natural, para mim."

Linda engoliu seco, desejando ter trazido consigo a garrafa de uísque. Nunca tinha ouvido Severo falar daquela maneira. Nunca tinha sentido uma mistura tão estranha de felicidade e angústia.

Com o coração martelando, ela perguntou;

- O que você está dizendo? Que mesmo se ela estivesse viva, você me escolheria porque eu sou mais real?

- Não. Eu estou dizendo que eu escolheria você porque eu te amo.

Linda deu um sorriso nervoso, rapidamente enxugando uma lágrima que teimou em escapar.

- Claro que sim...! Dê-me um motivo para eu acreditar nisso, Severo!

- Eu tomei dois frascos de Veritaserum antes de bater na porta da nossa casa.

Ela abriu a boca, paralisada por um instante. Isso explicava a falta de censura em tudo que ele estava dizendo, os olhos opacos e geralmente desfocados.

E isso queria dizer que tudo, absolutamente tudo, era verdade.

O seu coração deu um pulo e a sua mão, quase instintivamente, procurou a dele.

- Por quê?

- Porque eu não conseguiria te contar nem dez por cento do que te contei. É por isso, também, que eu bati tão fortemente na porta: depois de tomar a poção, eu cheguei à conclusão que era perigoso demais.

Linda assentiu.

- Foi uma idiotice! – Severo deu um meio-sorriso em concordância. – Severo, eu... Eu não sei o que dizer! Você não deveria ter feito isso... Eu acreditaria em você!

- Como eu disse, eu não conseguiria. Essas informações são perigosas demais, Linda!

- Então... obrigada.

- Você não quer saber mais nada?

Ela pensou por um tempo. Sim; havia uma coisa que ainda não estava bem explicada.

- Por que você matou Dumbledore?

- Ele pediu. Ele já estava morrendo, e achou que era mais interessante que ele morresse e eu cumprisse o voto perpétuo que fiz com- – ele se impediu. Linda imediatamente soube o motivo.

- Narcissa. – Ela disse em nenhuma sombra de rancor. – Eu sei.

Ele a olhou por um momento, ainda sem brilho nos olhos. Mas, pelas linhas no rosto dele, Linda sabia que ele estava confuso.

Severo respirou fundo.

- Segundo o voto, eu cumpriria as ordens do Lorde das Trevas no lugar de Draco; as ordens eram matar Dumbledore. Alvo achou que, como ele estava morrendo, seria um desperdício perder as duas pessoas mais fortes que protegiam Potter. Por isso, pediu que eu o executasse. Foi a coisa mais difícil que eu já fiz na minha vida.

- Eu sinto muito.

- Eu também.

Dando a conversa como encerrada, Linda se levantou e colocou o copo sobre a mesa de centro. Estendeu a mão para Severo, que a olhou, confuso, antes de perguntar:

- O quê?

- Vamos para o quarto. Você parece cansado, Severo... e definitivamente precisa tomar um antídoto.

Ele deu uma risada sarcástica.

- Agora você me oferece um antídoto?

- Apenas... vamos!

Ele aceitou a mão dela, e logo o casal se encaminhava para o quarto – uma cena tão corriqueira, mas que ambos sentiram tanta falta nos últimos meses. Quando chegaram, Linda ajudou o marido a despir as suas vestes negras e pesadas e desabotoou a camisa que ele usava por baixo. Quando o torso de Severo estava nu, ela o observou, lembrando-se de cada pequeno detalhe do corpo dele. Surpreendeu-se ao constatar o quanto ela ainda o queria.

- Sente-se.

Ele obedeceu imediatamente, enquanto ela dobrava a camisa meticulosamente e a colocava sobre a penteadeira. Ainda agindo como uma esposa devota, ajoelhou-se de frente para ele e tirou os seus sapatos e meias.

- Pronto – ela disse, se levantando novamente. – Agora se deite, enquanto eu pego o antídoto.

Com um sorriso em seu rosto, Linda abriu o pequeno armário de vidro que ficava ao lado do seu guarda-roupa e procurou dentre os frascos de poções aquela que tinha um líquido viscoso amarelo que apenas poderia ser o antídoto para o Veritaserum. Ela o pegou e, quando se virou, Severo já estava deitado e coberto.

Ela não precisou dizer nada ao entregar a poção a ele – Severo a tomou sem pestanejar. A mão dele procurou pela de Linda pouco antes dele fechar os olhos e, fosse por exaustão ou alívio, adormecer quase imediatamente.

Linda, então, sentiu-se livre para se despir e colocar uma camisa dele. Ela sabia que deveria ir dormir no sofá, mas não... Naquela noite, ela dormiria ao lado do seu marido.

XxXxXxX

O barulho ensurdecedor dos pássaros acordou Severo na manhã seguinte. Ele não abriu os olhos imediatamente – a pior dor de cabeça que ele já sentira em toda a sua vida não deixou. O que acontecera?

Lentamente, as lembranças a noite passada foram voltando. A aparição do Lorde das Trevas na sala da direção de Hogwarts, a violação do túmulo de Dumbledore, o roubo da varinha... a caminhada desesperada por Hogsmeade, os dois frascos de Veritaserum. A conversa que ele tanto temia.

Ele abriu os olhos rapidamente ao lembrar-se disso. Uma dor lancinante, causada pela luminosidade do quarto, quase o fez desmaiar... Mas tudo valeu a pena quando ele viu que, ao lado dele, deitada sobre o seu braço, estava Linda.

Severo deu um meio-sorriso, apesar da dor. Como ele sentira falta daquilo: acordar com Linda ao seu lado, ouvindo a sua respiração e sentindo o seu cheiro. Ele sentiu uma vontade quase irresistível de acordá-la com um beijo; mas não sabia se ela reagiria bem àquilo. Ela não deixou claro, na madrugada anterior, se aceitaria uma reconciliação.

- Linda – ele chamou, impressionando-se com o tom rouco da sua voz.

Ela gemeu baixinho, abrindo lentamente os olhos e se espreguiçando.

- Bom dia...

Severo sorriu ao observar ela se ajoelhar na cama e tentar domar os cabelos loiros, penteando-os com os dedos. Ela vestia uma das camisas dele, proporcionando a Severo uma bela visão das suas pernas e do seu colo e, mais uma vez, ele sentiu o ímpeto de tocá-la.

- Que horas são?

- Deve ser cedo... É domingo, e ainda não tem barulho na rua. Eu estou com sono, Severo. Vamos voltar a dormir.

- Eu tenho que voltar à Hogwarts, Linda; você sabe que eu não poderia ter passado a noite aqui.

Linda sorriu.

- Você também não podia voltar à escola! E se Aleto lhe encontrasse e perguntasse o que você pensa dela? – Eles riram juntos; Severo quase esquecera como era rir pela manhã. – Você é o diretor. Claro que pode dar uma escapadinha...

- Você está certa; mas agora eu tenho que voltar... E eu quero que você vá comigo.

- Eu vou.

Ele, literalmente, estremeceu. Foi como se um peso enorme tivesse sido tirado dos seus ombros; como se, com aquelas duas palavrinhas, Linda conseguisse tirar toda mágoa e rancor acumulados pelos últimos meses... Como se, de repente, tudo pudesse acabar bem.

O impulso de beijá-la voltou, mas, daquela vez, ele sequer tentou resistir. Severo rapidamente sentou-se na cama e pôs a mão na nuca de Linda, trazendo-a para si. Antes de conseguir beijá-la, no entanto, Linda virou o seu rosto.

Ele deu um suspiro frustrado, enquanto Linda colocava uma mão em seu peito e o afastava.

- Eu... – Linda mordeu o lábio inferior. – Eu preciso de tempo, Severo. Nós precisamos de tempo... para cicatrizar, para nos aproximarmos novamente, e... Nós podemos dormir a mesma cama e passar o tempo inteiro juntos, mas eu ainda não estou pronta para... – Ela suspirou. – Você ainda quer que eu vá para Hogwarts?

Apesar da frustração, Severo forçou um sorriso em seu rosto.

- Se você não for, não poderemos dormir na mesma cama.

Linda assentiu, visivelmente aliviada, e se levantou.

- Que bom... – De costas para ele, Linda abriu o guarda-roupa e tirou de lá um robe de seda branca. Antes que Severo pudesse desviar o rosto, ela despiu a camisa, revelando para ele as suas costas nuas; antes de cobri-las com o robe. Aquilo era o tipo de coisa que ela fazia rotineiramente e que, enquanto estavam juntos, Severo sequer prestaria atenção. Mas que, depois de tanto tempo longe dela, tirou a sua concentração de tal forma, que foi difícil prestar atenção no que ela falava. – ...com você ontem, por causa da poção. Você já me disse como os efeitos colaterais são perversos e... Oh, Merlin, você deve estar com enxaqueca!

Ele pigarreou, finalmente lembrando-se da dor.

- Um pouco – mentiu. – Vai passar.

- Ok... O que você quer de café da manhã? Café e torradas? – Severo assentiu. – Então vamos para a cozinha; faz tempo que eu não cozinho para você!

Dizendo isso, Linda deixou o quarto. Severo precisou de um tempo para se levantar, colocar uma camisa e achar, no armário do banheiro, uma boa poção para diminuir a sua dor de cabeça. Quando chegou à cozinha, o cheiro do café e dos ovos e bacon fritos já dominava o local, lembrando-o de que ele não comia há mais de doze horas.

- Então, como eu estava dizendo – Linda começou, enquanto separava algumas frutas. – Narcissa esteve aqui ontem, algumas horas antes de você chegar. Ela disse que Potter foi capturado, mas conseguiu fugir logo. Ele tinha a espada de Grifinória e o Lorde das Trevas está suspeitando de você por causa disso. Ela também disse algo sobre você não ser um dos favoritos do Lorde e que a sua morte está planejada.

Severo crispou os lábios. Depois de tudo que dissera a Linda na noite passada – muito do qual ele se arrependia – tentar esconder dela qualquer coisa parecia idiotice. Com a voz aborrecida, respondeu:

- Eu temia que isso fosse acontecer. Potter é estúpido – Bufou. – Ele realmente deve estar acreditando que a Varinha das Varinhas é a única maneira de eliminar Potter, se não o matou logo.

Linda mordeu levemente o lábio.

- Mas agora ele tem a Varinha, Severo. Eu sei que eu disse ontem que não atrapalharia os seus planos, mas... a situação me parece perigosa demais.

- Alvo acredita que o Lorde não vá querer me matar até que seja estritamente necessário; ou seja, quando ele de fato precisar da Varinha. Ele terá de estar perto de Potter.

- Faz sentido. Você é um bruxo poderoso. É bom tê-lo como aliado; por isso ele não o descartaria antes do tempo.

- Exato. Por que Narcissa veio a você?

- Porque ela é uma Black. Eles aprendem desde cedo que não podem ficar devendo favores a ninguém... toda família tradicional tem uma mania estranha. A dos Malfoy é negligenciar as filhas mulheres.

Severo rolou os olhos.

- Narcissa é idiota; eu não matei Alvo por causa dela ou de Draco... – Ele suspirou. – De qualquer forma, não podemos desencorajar esse comportamento. Narcissa é uma boa aliada.

Linda assentiu em concordância, para a surpresa de Severo.

O café da manhã estava pronto. Linda colocou os pratos sobre a mesa e serviu café com leite para Severo. Quando se sentou de frente para ele, a sua expressão estava sombria.

- E quando chegar a hora, Severo?

Ele engoliu seco.

- Eu encontrarei Potter, contarei o que tenho de contar, e lhe procurarei para fugirmos juntos.

- Ele não vai lhe escutar.

- Eu já pensei nisso. Tenho toda uma coleção de historinhas em minha mente mostrando-me ainda apaixonado pela mãe dele. A maior fraqueza de Potter é a mãe. Se eu mostrar que estou fazendo tudo isso por causa dela, ele acreditará.

Linda crispou os lábios.

- Ele tentará lhe matar.

- Como se ele pudesse... – Severo deu de ombros e tomou um gole do café. Delicioso; apenas Linda sabia fazer o café perfeito. – O importante é que ele veja as lembranças. Eu provavelmente terei de azará-lo e levá-lo a uma penseira, mas isso não será problema. Assim que eu chegar à penseira, eu o acordarei e te procurarei. Fugiremos juntos.

Linda suspirou, procurando a mão dele.

- Você não parece muito seguro.

- Esse é o plano, Linda. Se tudo der certo, não falhará. Mas, naturalmente, podem ocorrer milhões de complicações. É delas que eu tenho medo.

Ela crispou os lábios.

- Você promete que vai tentar sobreviver?

- Nunca tive vocação para mártir.

Linda deu um meio sorriso.

- Pois sobreviva. Sabe como você sempre quis filhos? – Os olhos ele imediatamente se iluminaram. – Esse será o meu presente para você. Quando essa guerra acabar, quando nós pudermos viver em paz, eu te darei o meu útero. – Ela riu-se. – E você poderá colocar nele quantos filhos você quiser.

O próprio Severo deixou-se sorrir.

- Isso é uma promessa? – Ela assentiu. – Saiba que eu pretendo cobrá-la.

Severo decidiu, naquele momento, que sobreviveria. Ele tinha muitos motivos para sobreviver.

XxXxXxX


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