Aira Snape - A Comensal escrita por Ma Argilero


Capítulo 6
Não há mais


Notas iniciais do capítulo

O capítulo em que Jean conhece Severo é o próximo. Esse é meio triste.



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Procurei conversar com meu pai sobre a viagem, mas ele escolheu muito bem seus argumentos, dos quais não pude contra argumentar, por falta de opções. Ele estava certo quanto ao nosso orçamento baixo e de termos de poupar, pois nunca se sabe o que pode nos acontecer amanhã! Mas, mesmo eu sugerindo que desaparatasse no país ou usasse a rede de Pó de Flu, não houve conciliação.

Eu queria muito sair de Londres e conhecer outros países, saber de sua história, respirar outro ar e deixar esse peso que carrego dimunuir ou desaparecer por, pelo menos, alguns dias. Ele não entende que preciso me distanciar desse mundo medílcre e sujo em que vivo.

Não podia ficar presa dentro de mim, mas era isso que eu fazia: estando sempre pensando em formas de me alegrar ou maneiras de me distrair dessa monotonia. Pensei em explanar, mas com quem? Eu não podia revelar meus pensamentos e nem nada ao Jean. Nem as gêmeas eu confiava meus segredos.

Comecei a folhear o caderno que meu pai havia me dado e onde estava a fotografia dele e minha mãe. Eu sentia muita falta dela. Queria tê-la conhecido e sentido seu toque ao me acariciar quando eu estivesse com medo, ouvir suas palavras quando eu precisasse. Quantas vezes sonhei que estava com ela e que éramos felizes! Eu precisava de uma mãe pra me aconselhar após meus erros, para me consolar ao perder um amor...

Eu seria mais feliz se o destino não teimasse em retirar tudo que é importante pra mim. Quantas perdas eu tive! No dia em que eu nasci perdi minha mãe - é um dia triste, mesmo eu o comemorando. Não tive o amor de meu pai, pois fui privada dele, mas mesmo com ele tentando recompensar o tempo perdido, sinto que ainda falta muito. Não convivi com meus avós, perdendo a oportunidade de ser paparicada - mesmo eu não gostando, mas talvez tudo fosse diferente - e me elogiasse dizendo "Olha o quanto você cresceu!". Perdi meu namorado e primeiro amor pra uma amiga traiçoeira; depois sou traida novamente por uma amiga. Meus pais adotivos se foram de uma maneira horrorosa. Quem mais vou perder? Quem?

A solidão me abatia todos os dias ao acordar. Estar ao lado de Jean melhora meu humor, porém, depois de nos separarmos, sinto-me mais taciturna que antes. Não basta eu querer, tem de acontecer, mas nem sempre as coisas são do jeito que quero, especialmente quando o assunto é do coração.

Engana-se quem diga que é o coração que decide quem vai amar. Meu eu escolheu seu alvo, ele foi acertado e... fomos felizes. Ainda sinto ele, ainda sinto falta dele.

Meu pai entrou em meu quarto e sentou-se ao meu lado. Ele observou a foto e depois me fitou. Não era um olhar de repressão por eu não estar fazendo nada produtivo, mas sim, um olhar de afeto, o olhar que eu precisava. Eu o abracei, lhe apertando. Ele acariciava meus cabelos. Aquele cheiro de café misturado com vários aromas diferentes: sabão, ingredientes para poções, pelo molhado e a doce fraglância de flores. Não lembro de ninguém ter esse cheiro, mas meu pai tinha, era especial, pois me reconfortava e me deixava melhor.

Ele estendeu seu braço e tocou minha face, depois beijou minha testa e saiu. Não era preciso dizer nada. Os gestos e a presença dele valiam mais do que palavras. Para mim era suficiente naquele momento.

Meu plano de comprar os materiais para um novo ano letivo sepre falhavam. Toda vez aparecia algo para eu fazer e ter de adiar as compras. Ou era serviços que eu tinha que fazer em casa ou estudar. Não tinha mais cabeça pra nada. Eu não teria condições de estudar. Eram férias, Merlin! Por que eu tinha que estudar? Ele dizia que quanto mais eu estudasse melhor eu me sairia em Hogwarts e futuramente eu poderia receber propostas de empregos.

Eu concordava com o que ele dizia em que eu deveria estudar e ser alguém. Não dependeria pra sempre de meu pai, mas eu não sabia que carreira seguir. Eu dissera à Umbridge que queria ser uma Mestre em Poções, mas não é isso que eu quero. Quero ser alguém poderosa, que saiba impor poder, mas não quero ter de pisar nas pessoas pra conseguir isso. Se eu não conseguir algo no mundo bruxo, talvez no trouxa eu consiga.

Terminei meus afazeres e saí, antes que fosse obrigada a fazer algo. Desci pela rua, em meio a chuva e com capa protetora. Eu estava usando meus coturnos, que se davam bem nessas épocas chuvosa. Como se eu tivesse votlado a ser criança, rodopiei pela chuva com os braços abertos e senti as gotículas de água fria e refrescante titubearem em meu rosto, e descerem vagarosamente até chegarem à capa. Não estava acostumada e fiquei tonta após tantos rodopios. Faltei cair no chão, mas consegui me recuperar fechando os olhos e respirando.

Não foi uma escolha totalmente ruim ir andando até a estação do metrô. Ao chegar no local, retirei a capa e guardei dentro de minha bolsa, que estava atravessada no meu corpo. Desci a escada e depois de passar pela catraca, embarquei no vagão. Não estava muito movimentado, mas se via pessoas indo e vindo a toda hora; cada uma com suas preocupações e deveres a lhe esperar. Sentei-me e fiquei a fitar o mapa das linhas do metrô.

Elas atravessavam Londres quase inteira. Eu poderia ir a qualquer lugar de Londres se eu quisesse, apenas pagando menos de cinco Libras. Era tão bom sentir-se livre. O metrô dava essa sensação por nele estarem pessoas de todas as faixas etárias, tonalidades, status social. Ninguém se discriminava ali. Éramos todos iguais. Por que não poderia ser assim também na superfície e não apenas no subterrâneo?

Todos se preocupam de mais com o futuro. Não é preciso pensar em como será seu amanhã, apenas viva a vida de sua maneira. Não sinta-se excluído.

Eu deveria empregar essa filosofia a minha vida. Deveria me apegar menos em coisas materiais. Precisava viver mais, sorrir mais, sonhar mais... Precisava de uma outra vida, de um novo motivo pra continuar.

O trem parou na plataforma, que era mais próxima da rua em que fica o Caldeirão Furado. Não chovia mais. Olhei para os prédios altos em sua estrutura feita anos atrás. Tudo em Londres era antigo e nostálgico. A cidade emanava história por onde passasse. Em cada tijolo, pedra, madeira tinha um minúsculo fragmento desse lugar maravilhoso.

Observei um ônibus de dois andares passar. Sempre tive desejo de conhecer a cidade por ele. Era a primeira vez que eu estava em Londres sem a companhia de alguém, andando pelas ruas e conhecendo lugares. Não devia ser muito caro para conhecer a cidade estando em um ^nibus de dois andares. Eles são mais populares entre turistas que não querem perder nenhum detalhe de sua visita por este país.

Calculei em quanto tempo demoraria para eu chegar ao Beco. Eu atravessava ruas, observando os estabelecimentos e vitrines de algumas lojas fabulosas. Pareie em frente a uma, que só vendia roupas e artigos femininos. Lutei contra a vontade de entrar e vislumbrar as vestes, mas antes de continuar a percorrer a rua, contemplei um vestido vermelho e longo tomara-que-caia fazendo conjunto com um par de luvas em tamanho médio. Era o vestido mais lindo que eu tinha visto. Fiquei tentada em vê-lo por mais alguns minutos.

A distância não foi longa, mas também não foi pequena. Eu diria que foram alguns metros bem andados por mim. Pude refletir sobre questões diversas e observar lindos lugares. Eu morava em Worcestershire, cidade onde minha mãe morreu e onde fui adotada. Lá não era legal. Eu conhecia a cidade e sempre me parecia a mesma todos os dias.

Atravessei a praça e andei mais alguns metros até avistar a entrada do Caldeirão Furado. Adentrei o recinto e vi diversos bruxos conversarem e beberem. Segui até o beco, que estava aberto e o atravessei. Bruxas e bruxos estavam em todos os cantos, fazendo suas compras.

Entrei na Floreios e Borrões. Retirei a lista e comecei a citar os volumes a serem comprados. Passei ao lado da jaula com os livros monstros, que estavam com muita raiva. Será que o meu antigo livro estava assim também? Eu o deixei dentro do armário. Seria divertido assustar alguém com ele, mas seria perigoso e muita idiotice fazer isso. Mas a ideia não seria má, se fosse com outro bruxo. Os preços se eleveram nesses últimos meses. Meu pai não receberia as moedas de volta.

Fui em todas as lojas e na Madame Malkin, encomendar saias novas, pois as minhas estavam velhas e rasgadas, após tanta encrenca. Enquanto ela costurava, fui andar pelo Beco. Avistei a loja dos gêmeos Weasley, a Gemialidades Weasley. Fiquei indecisa se entrava ou não. Acabei cedendo a curiosidade em saber o que havia ali. Entrei sem fazer estardalhaço, andei por alguns corredores repletos de objetos mágicos e trouxas. Eles devem comprá-los em uma loja comum e depois os revende. E o preço não era barato, custava galeões. Se os bruxos que compram isso soubessem que esses produtos não deveriam custar tanto.

Eu andava observando tudo, nem reparei aonde estava indo. Parei em frente ao Fred, que estava ao lado de caixas. Virei-me pra sair, mas ele segurou meu braço. O olhei. Meu coração estava acelerado, eu ainda o amava. Não queria ficar ali e correr o perigo de acontecer algo que não quero.

– Aira?

Estava cabisbaixa, lutando pra não estragar tudo. Ele soltou meu braço, talvez pensasse que estava doendo.

– Aira.

Olhei pra ele. Eu precisava fazer isso. Era preciso. Observei dentro de seus olhos. Não seria covarde em dizer tudo sem olhar em seus olhos. Quero que ele se convença de que estou dizendo a verdade.

– Não me toque mais.

Fred aproximou-se mais e me pressionou contra a prateleira cheia de obejtos. Senti-lo tão perto... Eu tinha que ser forte. Ele me traiu com a pessoa que achei que fosse minha melhor amiga. Foi uma traição dupla, dolorida e que ainda não foi curada.

– Eu sinto sua falta.

Eu também sentia. Tenho de esquecê-lo. Tenho de me distanciar dele. Ele e a cobra venenosa estão namorando. Eu não posso...

– Pois eu não senti.

Ele me observou duvidoso. Aproximou-se mais e tentou me beijar. Eu coloquei minha mão a frente de meu rosto, o impedindo.

– Veja, Weasley. Não quero nada com você. Seja feliz com a Giulia Cheege.

Ele era bem cafasgeste de tentar algo comigo estando com a outra. Os dois se merecem.

– Não tenho outra chance?

Não tem mais chance. Acabou tudo. Acabou no instante em que você beijou a Giulia. Acabou ali. Acabou...

Virei meu rosto e o empurrei. As lágrimas queriam sair. Controlei-me para não chorar em público. Virei-me para Fred.

– Não me procure mais.

Sai. As lágrimas começaram a descer enquanto eu saia da loja. As enxuguei e depois de várias respiradas e de constatar que meu rosto não demonstrava sinal de choro, continuei andando. Voltei à Madame Malkin e paguei pelas duas saias. Parei em frente à lareira lareira da loja. Eu poderia voltar rapidamente, mas optei por voltar pelo meio em que cheguei ali.

Retrocedi todo o percurso até a estação do metrô. Após algumns minutos cheguei em casa. Joguei tudo sobre o sofá e subi correndo a escada.

Entrei em meu quarto e bati com força a porta, atrás de mim, joguei-me em cima da cama e me pûs a chorar.

Ouvi passos. Eu sabia que era ele que me observava. Meu pai sentou-se ao meu lado e eu o abracei, chorando em seus braços.

– Quer me contar o que aconteceu?

Com a cabeça apoiada em seu peito, contei meu encontro com Fred até a parte em que eu disse não queria vê-lo mais. Ele falou para eu seguir em frente, que garotos da idade dele não entendem o que é amar. Mesmo ele falando diversar coisas, não fiquei melhor, apenas amenizou a dor que eu sentia.

Acordei de manhã e desci para a cozinha, pois sentia cheiro de torrada entre outros que eu tinha a lembrança de serem comida trouxa. Observei a mesa e me espantei em ver torrada, bolo, gelatina, pudim, torta doce e salgada, pães, sucos, café e leite. Era uma mercearia ali. Sentei-me e não sabia por onde me servir.

– Guardei suas coisas.

– Quando?

Ele sentou-se e serviu-se de um pouco de café.

– Hoje de manhã enquanto você dormia. Não queria ter acordar.

Tomou um gole de café e observou dentro da xícara.

– Desculpa por eu ter te pressionado.

Olhei-o. Ele estava falando sério?

– Não vou mais pedir muito de você.

Devo ter ficado ruim, ontem, pra ele ter tomado essa decisão. Fiquei agradecida. Não foi como as experiências anteriores comer uma refeição preparada por meu pai. Descobri, depois dele mencionar, que estava lendo um livro de culinária e treinando todas manhãs e madrugada.


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Notas finais do capítulo

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