Desabafos de Uma Adolescente...louca? escrita por Yamashinara


Capítulo 1
Capítulo Único




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- Estranho pensar que ele poderia estar comigo agora, é até que engraçado o modo que eu tento colocar na minha cabeça que sou forte o bastante para aceitar a partida dele. - Eu disse isso com o olhar vago, quem me visse, podia ver que eu estava trancando o choro, mas não um choro de tristeza. Não completamente. Havia em meu olhar uma pontada de alegria pelo que estava contando.

- Sou tão burra assim? Espero que não, afinal, dezesseis anos é a idade da rebeldia onde adolescente não sabem o que tem na cabeça e isso faz com que eles fiquem confusos. HAHAHAHA! Olha só quem está dizendo, a pirralha falando dos pirralhos! Juro, se eu tivesse com vinte e cinco eu ainda estaria pensando da mesma coisa. - Eu baixei meu olhar até sua xícara de chá de doce-de-leite, minhas mãos que antes tremiam de frio, agora estavam sendo aquecidas pelo calor da xícara.

- Você está errada. Ainda acho que o que sentes não é algo que possa ser argumentado por causa de sua idade, se fosse por isso, eu que sou apenas o fruto da sua imaginação jamais poderia ajudá-la... Ou ao menos tentar.

Eu levantei o olhar e me vi de frente a um espelho. Ainda usava meu roupão azul claro, grosso, de mangas compridas e largas. Meus cabelos estavam presos em uma longa trança negra com mechas douras virada para o lado esquerdo de meu corpo e caída para frente deste. Estava com o rosto nu. Sem maquiagens, sem uma cor de pele natural... Há quanto tempo eu não saía de casa em dias ensolarados? Já não lembrava mais. Olhei novamente para o espelho, séria, triste, cansada. Não era mais a menina jovem que todos olhavam, me sentia uma velha que se esqueceu de viver, mas, lá no fundo do espelho, juro, bem lá no fundo quando eu conseguia prestar atenção no meu olhar e entrar nele eu podia vê-la. Que linda era, aquela garota alta com um sorriso gentil e um olhar quente. Aquela era eu? Eu era assim? Não... Essa é a minha Yama.

- Mais uma vez tentando me enganar, Yama? Sabe que não sou assim, nunca fui e não adianta vim com "nhé nhé nhé'' que eu não vou te responder entendeu?

- Diabos! Se não quer me responder, então por que tanto me chama em sua mente? Por que faz com que eu saía do meu descanso e venha aqui lhe fazer companhia?

- Porque você faz parte de mim. Se você não existisse pra ouvir minhas lamúrias e besteiras eu poderia agora ter me matado sabia? Que? Claro que não sua idiota eu não estou chorando...

- Mas quer fazer isso, não? Admita você é uma criança, infantil e egoísta. Posso te chamar de louca mais se eu disser isso você irá me mandar novamente para aquele seu mundo.

 - Eu gosto de lá, há algo contra ele?

- Nada, apenas acho que ele está com muitas placas dizendo "Volte". Baaaka, ainda não compreendeu? Quantas vezes eu terei que te dizer para não chorar ou se lamentar por algo que aconteceu? Já mandei você sorrir!

- Como se fosse muito fácil. Você diz isso porque quando você vem, tem vários amigos, amantes e todos a amam. Tem um marido perfeito, uma filha perfeita, de certo modo e ainda por cima é linda! Não tens muito que reclamar...

- Realmente é uma criança mesmo, você acha que eu sou linda, amiga, com uma família perfeita por causa de que? VOCÊ, SUA IDIOTA ME CRIOU, VOCÊ FEZ COM QUE EU FOSSE ASSIM. SOU TUDO AQUILO QUE QUERIAS TENTAR SER MAIS SABE QUE NÃO PODE.

- E continua me jogando em cara. Mas... Eu não poderia confiar em outra pessoa que não fosse você... Se eu contasse a alguém todo meu sofrimento, iam acabar me contando suas histórias, me dizendo para esquecer e depois iriam voltar a suas vidas chatas. Não quero preocupar a ninguém, mesmo que minha cabeça esteja explodindo de dúvidas, conceitos, argumentos, perguntas, explicações... É isso que chamamos de... Adolescente?

- Não. Isso que chamamos de humano. Mesmo que eu não possa te abraçar ou te consolar, eu ao menos posso conversar com você através disto. Você sabe... Todos te chamariam de louca se descobrissem que falas com sua personagem criada para um mundo virtual, e admita, se a sua mãe soubesse de tudo o que falamos... Você já estaria no olho da rua.

- Como se ela nunca tentasse fazer isso...

Eu ria comigo mesmo, a imagem no espelho mostrava outro eu, uma R. que eu sonhava em ser. Toda criança teve um sonho, ser veterinária, professora, mãe, pai, jogador de futebol... Todos queriam estar na escola, ter novos amigos, se divertir. Mas eu não. Sempre fui tão diferente e igual. Eu queria crescer, queria poder proteger a todos que eu amo, queria ser alguém que mesmo estando triste, podia consolar as pessoas e tentar ajudá-las, animá-las. Bebi mais um pouco do meu chá, que delicioso o presente que havia ganhado. "Será que sou nova demais? Para preferir livros, chás, coisas caseiras ao invés de uma boa festa ou uma bela garrafa de vodka?" Me passou pela mente e então olhei curiosa para o espelho. Minha face era esquisita no primeiro olhar, eu vi algo tão caído e tão... Fraco que senti vontade de abraçá-lo. Quando parei para olhar e analisar, não vi aquela figura inútil, vi alguém diferente era como se eu mesma conseguia acalmar o que havia dentro de mim e senti o corpo todo aquecer. Era como se com o meu próprio olhar, pude abraçar a mim mesma e dizer "Não se preocupe, no final tudo dará certo".  Sorri obstinada, meu olhar voltava a ser o olhar quente que havia antes visto quando procurava sua Yama. Yama... Criatura feita de pedaços de meu cérebro e enchida com minhas memórias. Ah se eu pudesse ser ela, se eu pudesse não ter que amanhã abrir os olhos e ver tudo o que me faz mal novamente...

- Yama, não preciso dizer não é? Desejo esquecer ele, esquecer o que aconteceu e pensar unicamente no meu futuro. Seria possível?

- Desculpa R... Você ainda é fraca e humana. Não pode simplesmente dizer que você irá esquecê-lo e esperar que tudo suma em um passe de mágica, mas, há algo que você pode fazer. Pode mostrar o lado que você teima em não mostrar. Mostre a todos aquilo que você é e diga o que sente sem ter medo que alguém fique aborrecido. Ninguém conhece sua mente como eu, ninguém sabe as felicidades e tristezas que você teve. Ninguém sabe o quão sensível você é com as palavras.

- Não sou sensível com palavras...

- A não? Então porque toda vez que espera uma sms "dele" você fica ansiosa? Porque uma simples frase de "Você é linda, não deixe que ninguém te faça pensar ao contrário. Boa noite meu anjo" faz você simplesmente ser a garota mais feliz do mundo? Se fosse mentira, eu não estaria dizendo, certo?

-Você está certa, mas... EU MUDEI! Eu... Eu não tenho mais essa sms, eu apaguei você sabe... Eu... Eu... 

Senti meus olhos encherem d'água, minha mente estava certa, não sou forte o suficiente com as palavras. Uma simples frase pode me fazer ser tão feliz e ao mesmo tempo tão triste. Por que dependo tanto de pessoas que, após analisar, quase noventa por cento delas são consideradas apenas "ombro" e nunca um amigo?

- Seria tão mais fácil se eu soubesse me expressar, Yama. Por que sempre que eu preciso que você entre em cena, você sempre some?

- Porque eu não sou você, eu sou Yamashinara Okahoma. Alguém que não é humana e não é um amigo imaginário. Sou apenas a mente de uma adolescente que não consegue parar de pensar por alguns segundos e agir. 

Juro... Nesse momento senti minhas mãos vacilarem, a xícara quase vazia quase caiu de minhas mãos, senti meu corpo todo tremer e pesar. Antes, eu conseguia fazer minha mente entender os meus sentimentos, mas depois de um tempo, não conseguia mais me decidir, não consegui mais ter sentimentos certos e precisos. Precisei tanto do meu mundo... Precisei tanto da Yama... Fechei meus olhos e olhei pra cima, já não estava mais chorando e novamente olhei sorridente para o espelho. Ouvi barulho de passos e então chaves que logo se juntaram com o barulho da grade e porta sendo abertas. Virei-me e vi minha mãe chegando, como sempre, reclamando do meu pai e brigando sobre o serviço. Balbuciei algumas palavras que ela não entendeu e então voltei à mesma de sempre. Séria, quieta, respondendo apenas ao que ela me perguntava sem muito enrolar. Sentei-me na mesa da sala, fechei a janela e então abri o notebook. Estava na hora de acalmar minha mente, estava na hora de ser Yama. Olhei para o espelho e vi, rapidamente, a figura de minha personagem, ela sorria pra mim como se soubesse que havia me ajudado e que no outro dia eu iria estar mais calma. Não fiquei nem três horas no computador, desliguei, tomei meu remédio da diabetes e então fui me deitar. Não consegui dormir rapidamente porque uma idéia ainda estava na minha cabeça: Se, alguém como eu, dissesse às pessoas que eu confio que tenho uma amizade secreta com minha mente... Eles se expressariam como? Sentiriam medo? Diriam que era besteira e não acreditariam? Iriam me achar digna de pena e tentariam me consolar?  Queria ver qual seriam suas reações, mas, não faria isso... Não iria ouvir dos outros que estava ficando louca. Eu sorri com meus olhos fechados e senti o peso nas minhas pernas. Lindinho, gato preguiçoso, sempre esteve comigo sem dizer nada, apenas seu olhar me fazia entender que ele sabia como eu me sentia. Adormeci mais tranqüila sabendo que ele iria me proteger. No outro dia, acordei um pouco mais tarde, atrasada para escola, o que já era normal. Arrumei-me, corri. Estava a mesma R. que todos conheciam, sorria livremente e agia como se todas aquelas dúvidas e incertezas da noite passada tivessem sumido. Olhei pro alto na esquina da escola e então suspirei agradecendo por ainda viver e conseguir entender um pouco minha própria cabeça. Passei o dia como normalmente passava, à noite, novamente, estava lá, eu, meu roupão azul, minha xícara de chá, agora de morango, e meu olhar vago... Novamente, estava eu me consultando com meu espelho... Com minha mente.


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Notas finais do capítulo

Conseguem entender o que se passa com essa jovem? Se entendeu deixe comentário. :3



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