Hell escrita por N_blackie


Capítulo 2
Capítulo 2




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Decoração

O primeiro item na lista que Amy fez era decoração, e eu achei meio estúpido ela sequer pensar que nossa primeira preocupação para uma festa de dia das bruxas – mesmo que fora de época – fosse ser decoração. Quero dizer, todo ano fazemos festas de dia das bruxas, e esse ano já tínhamos feito uma muito boa. Quase dispensei esse tópico, teria dispensado, se não fosse Potter aparecer com aquele ar arrogante e sem escrúpulos dele para dizer:

- Mas então vamos reutilizar a decoração? Que brega, porque não reutilizamos a comida, também?

Estreitei os olhos na direção dele para expressar o quão nojenta a ideia era, e só para ele parar de me lançar aquele olhar sarcástico e irritante dele dei de ombros e chamei outro carinha do nosso grupo. James ergueu a sobrancelha como se achasse que em breve se veria livre de mim – muahuahua, vai esperando – e pareceu que tinha levado uma pedrada na cara quando eu apontei para ele e disse:

- Potter vai fazer a decoração, ok? Certifique-se de que ela seja sem por cento original, viu? Tem razão, James. Que cabeça a minha, querer reutilizar material antigo! Boa sorte.

E fui embora, me sentindo muito má e ao mesmo tempo muito bem. Dei uma olhadela para trás e vi que ele estava coçando a cabeça enquanto tentava desenhar algum tema que prestasse, e nem reparei quando senti um par de braços fortes – no bom sentido – me pegando pela cintura e colocando em cima do ombro de alguém alto.

- AAAAAAAH! – comecei a gritar e espernear, morta de medo de cair no chão. Tudo que eu conseguia ver por cima de quem quer que fosse que estava me sequestrando deliberadamente eram os corredores da escola, e claro, os alunos me olhando como se eu tivesse surtado e estivesse sendo arrastada para a Ala Hospitalar.

Só quando eu passei para o segundo estágio do desespero – conformar-se – e respirei fundo me dei conta de que estava sendo arrastada por um dos melhores perfumes de Hogwarts: Sirius. Aí sim que eu não relaxei, claro. Gritei mais ainda.

- SIRIUS, POSSO PERGUNTAR O QUE ESTOU FAZENDO EM CIMA DO SEU OMBRO, POR ACASO?

- Ufa, ainda bem que parou de gritar. – ele reclamou por cima do ombro (do outro lado, digo, ele não falou com o meu, hun, traseiro.)

- Você me sequestrou! Tem noção disso?

- Desculpa. Vai parar de gritar e me seguir?

- Vai me por no chão?

- Vou.

- Então eu sigo.

Ele me tirou do ombro e colocou no chão o mais gentilmente que conseguiu e eu agradeci, obviamente, mas não consegui para essa minha língua solta.

- Aonde vamos?

- Remus pediu.

- Rem? – perguntei ainda mais confusa. Estava com James – POTTER – Quando Sirius me sequestra a pedido de Remus. – Peter tem alguma coisa a ver com isso também?

- Hã? Porque teria?

- Sei lá, vocês quatro estão sempre metidos em umas.

- Não. Ele está na cozinha, eu acho. Não sei por que está na Grifinória se o dormitório da Lufa-Lufa é do lado da cozinha.

Não pude deixar de rir. Sirius às vezes é tão sarcástico, me lembra um pouco James. E porque estou me lembrando dele, hein? Eu o odeio, não tenho espaço para memórias sobre esse canalha aviltante.

Chegamos ao pátio, e vi que Remus me esperava como ele sempre espera quando marcamos alguma coisa. Sentado na fonte encarando o vazio, só deixando o vendo fazer o seu trabalho. Eu amo Remus, ele é como um irmão, um companheiro, tudo, e seria capaz de fazer qualquer coisa que pudesse por ele e pelo... Problema dele.

Comecei a andar sem perceber na direção dele por conta própria, sem perceber que Sirius tinha parado para nos deixar sozinhos. Remus sorriu serenamente enquanto eu me sentava ao lado dele, e assim que me vi completamente a sós com ele perguntei preocupada:

- Precisa desabafar?

- Não. Tenho a sensação de que quem precisa é você, Lil.

- Eu?

- Isso mesmo, você. James veio conversar comigo.

- Mas ele é um idiota, mesmo. Rem, você sabe que eu...

- Que é muito orgulhosa para aceitar o fato de que as pessoas erram? Ele está bem arrependido.

- Ah, sim. Se você visse o jeito que ele está me tratando na comissão...

- Ele está magoado, também. Não adianta me interromper com indignação, eu fiz por você quando ele me disse.

- Obrigada.

- Mas, sabe... Ele está mudado. Quero dizer, mais.

- James? Mudar? Só se for de roupa, me desculpa, Rem.

- Posso te contar algo? – Remus sorriu meio sonhador, e franzi a testa. "Claro que pode, você sabe disso" eu respondi como se a pergunta dele tivesse sido tão estúpida que eu nem precisasse pensar pra responder. – Quando eu cheguei na escola, achei que fossem ser os sete anos mais tristes da minha vida, sabia?

- Por causa da...

- Meus pais me explicaram que muita gente tinha medo de lobisomens, mesmo que eu fosse igual a todo mundo fora da lua cheia. Me disseram que seria melhor que eu não tentasse me misturar muito, e eu concordei. Queria tanto vir pra cá, aprender, ser normal.

Quando ele terminou de falar eu instintivamente apertei sua mão, sentindo a garganta fechar conforme tinha a estranha sensação de que poderia começar a chorar a qualquer momento. Remus sorriu gentilmente e limpou a primeira lágrima que caiu dos meus olhos. "Rem, você sabe que eu..." tentei começar, mas ele me interrompeu.

- Ainda não terminei. Quando cheguei, Lil, era mil vezes melhor do que nos meus sonhos mais impressionantes. Entrei no trem, procurando por alguma cabine que estivesse vazia, e vi você e Snape saindo de uma. Supus, óbvio, que vocês eram os únicos lá dentro até ali, então entrei com toda a coragem. Dei de cara com Sirius e James, que estavam rindo tão alto que me deram um susto.

- Eu me lembro desse dia. – revirei os olhos. – Desde criança esses dois não cansavam de atrapalhar...

- Pois é. Eu tentei fugir, mas Sirius levantou na mesma hora e me perguntou o que diabos, isso mesmo, diabos, eu estava fazendo. Pedi desculpas e disse que iria procurar outra cabine, mas ele não deixou. James começou a rir mais alto ainda e estendeu a mão para me cumprimentar, perguntando por que eu não estava querendo ficar ali. Eu já estava tremendo bastante, sabe, era proibido de fazer amizades, e apertar a mão daquele menino míope e magricela tinha sido a minha primeira infração antes mesmo de entrar na escola.

Ouvir Remus me contar tudo aquilo ali, naquela fonte, era provavelmente o gesto de amizade mais legal que ele já me fez. Enquanto ele respirava fundo para recomeçar, apertei com mais força sua mão e fiz um cafuné em seus cabelos.

- Desobedecendo completamente meus pais. – ele continuou. – Fiquei amigo de James e Sirius, e mais tarde, Peter. Quando acabei o primeiro ano aqui estava tão feliz que não podia acreditar no que estava me acontecendo. Uma única coisa me aterrorizava mais do que qualquer outra: se eles descobrissem meu segredo. No segundo ano tudo começou bem, mas eu já estava esgotando em desculpas. Minhas duas avós e dois avôs já haviam morrido de novo, uns três gatos ficaram subitamente doentes e eu não lembro mais quantas outras vezes menti para conseguir passar as noites fora sem que eles percebessem. James e Sirius nunca foram burros, e quando eu comecei a sumir dando explicações cada vez mais absurdas eles começaram a desconfiar. E o que James faz quando fica desconfiado?

- Com certeza não vai à biblioteca. – eu comecei a rir, só me lembrando de que deveria estar carrancuda ao falar dele e do jeito desleixado dele, não rir. Remus riu junto, e senti meu coração apertar quando percebi que pequenas rugas já estavam se formando em torno de seus olhos quando ele sorria. Remus estava destinado a se tornar mais velho do que era, e só fiquei mais obstinada a ouvir o que ele tinha a dizer ao notar esse detalhe.

- Não mesmo. Ele, Sirius e Peter me seguiram embaixo da capa de invisibilidade que ele tem. Me viram quando eu entrei na Ala Hospitalar, quando segui Madame Pomfrey até o Salgueiro Lutador, e claro, quando ela saiu sozinha. Imagine a minha reação quando, no dia seguinte, os três apareceram na Ala Hospitalar e abriram o acortinado onde eu me escondia. Me pressionaram tanto que eu confessei. Meu mundo caiu naquele momento, Lil. Todo aquele maravilhoso primeiro ano sem problemas passaram diante dos meus olhos como se aquelas fossem as últimas horas da minha vida, e eu baixei a cabeça para esperar o momento em que eles gritariam para que eu me afastasse e nunca mais dormisse no mesmo dormitório que eles. Eu realmente achei que teria de sair da escola. Até que Sirius, sempre o mais ousado, riu e perguntou: "Porque diabos baixou a cabeça?".

Sorri involuntariamente, agradecendo a Sirius mentalmente por ser uma pessoa tão esquisita, mas legal. Ele é louco e sequestra pobres e inocentes moças, e consegue ser o amigo mais legal que eu conheço.

- Eu ergui o queixo como se estivesse pronto a levar uma cacetada na cabeça, acredita. Tremia da cabeça aos pés, mas a reação deles me deixou tão surpreso que não conseguia falar enquanto os três se jogavam em cima de mim. Todos os ossos do meu corpo doeram, claro. Estava fraco da noite passada, fico todo dolorido por me debater nos quartinhos da Casa. Mas embora o físico reclamasse, meu coração parecia prestes a explodir de alegria. Foi a primeira vez que experimentei a sensação de ter verdadeiros amigos. Eu acho que nunca mais chorei tanto na frente de ninguém depois daquele dia. Meu maior medo se dissipou.

- James consegue ser um bom amigo. – admiti. Remus continuou sorrindo, e entendi que ele queria continuar.

- Eu já estava satisfeito demais com o fato deles saberem meu segredo e ainda gostarem de mim, e vou confessar que fiquei um pouco revoltado quando, depois de uma semana, James apareceu com uma ideia ridícula: me acompanhar.

- O quê? – me levantei de choque, e ele concordou com a cabeça. Revirei os olhos. – Eles são loucos?

- Pois é, foi isso e mais um pouco que eu disse quando ele me contou. Mas sabe, e determinação é algo que eu admiro em James e Sirius. No fim do quinto ano eles se tornaram animagos.

- O QUÊ? – perguntei mais alto ainda, e me sentei mais perto de Remus. – Rem, você está falando sério?

- Estou. Eles não são registrados, não fizeram curso nenhum. Sirius se transforma num cachorro enorme, James num cervo e Peter num rato. Eles foram comigo, Lily. Foi uma besteira minha, ainda é, mas cada dia que eles me acompanham como animais eu me sinto mais humano. O bem que me fizeram é provavelmente maior do que eu jamais irei conseguir pagar de volta. James pode parecer um idiota arrogante, mas eu, mais do que qualquer outro, posso dizer que no fundo ele é bom, generoso e o melhor amigo que eu poderia ter. Por isso acho que ele merece uma segunda chance, mais do que qualquer outra justificativa que eu possa dar.

Fiquei sem palavras diante dele, contanto tudo aquilo para mim e depois me dizendo mais ainda, que James merecia uma segunda chance. Mordi o lábio e desviei o olhar, lutando internamente contra meu orgulho. Esse lado dele eu não conhecia, não mesmo.


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