Mundo dos Sonhos escrita por Trezee


Capítulo 21
VII - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Uhuu



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Acordei esperta, depois de uma noite até que agradável de sono, sem muitos sonhos. Tomei um café da manhã reforçado e pedi para meu pai me levar um pouco mais cedo. Disse que era para tirar algumas duvidas antes da prova, mas na verdade eu queria mesmo é ter uma boa conversa com Daniel. Eu amei o presente, principalmente por ter sido ele quem me deu, mas aceitá-lo já era outra história. Não sei se seria certo, pois a final, eu nunca poderia retribuir com um presente daqueles. Era o que minha mãe havia falado: “Tudo é questão de se conversar”.

         Meu pai aceitou meu pedido e fomos para a escola. Olhei no painel para ver em que sala Daniel estava. Corri o dedo e encontrei logo. “Daniel Floukin, 3° A”. Fui até a classe, mas ele ainda não havia chego. Encostei na porta e abri o livro de História para ir lendo enquanto o esperava. Em cinco minutos, avistei a figura de Floukin vindo em minha direção.

         - Mel, você mudou de sala? – perguntou se fazendo de desentendido.

         - Não senhor, ainda estou na outra sala, porém não conseguiria me concentrar na prova antes de vim falar com você! 

         - Ai Mel... Sobre? – fez uma cara mais desentendida ainda.

         - Pelo amor de Deus Deniel Floukin, não faça essa cara de “sou o anjinho”!

         - E se eu for?- seus olhos me fitaram seriamente por poucos segundos. - Bem, mas isso não vem ao caso agora. Do que você que falar? – indagou fazendo uma cara atenciosa.

         - Oras, você sabe muito bem! – eu estava começando a ficar impaciente. – Ontem o senhor foi até a minha casa, colocou uma raquete de seiscentos reais em cima da minha cama e foi embora!

          - De nada? – ele fez uma cara irônica com aquele sorrisinho irresistível.

          - Não, de nada não! Eu não posso aceitar isso! – exclamei.

          - Não só pode como vai aceitar sim senhora! É um presente que eu estou te devendo. Eu quero muito te dar aquela raquete, se você não aceitar, além de triste eu vou ficar muito bravo! – ele fez uma voz irredutível.

           - Hei Para! Você não está me devendo coisa alguma, dá para entender? Tudo que aconteceu não tem nada a ver com você. O cão me atacou – minha voz tremeu.- por algum motivo que nem eu e nem você sabemos. Não dava para prever, você nem estava lá! Não me deve nada...

           - Mel, não dá para explicar, mas por favor entenda... Eu te devo, acredite. Aceite esse presente, o comprei de todo o coração. Você não sabe como eu fico feliz em te ver feliz!

           Suas palavras foram satisfazendo meu coração e meus sentimentos como se as esperanças fossem ferozmente alimentadas. A questão era que eu já não estava entendendo mais nada.

             - Mas como eu posso aceitar uma coisa dessas... Seria totalmente errado da minha parte, um abuso! – insisti já ciente da minha derrota.

            - Mel aceita. – ele colocou a mão em meu ombro e eu gelei. – Aceita, por mim. – suas palavras saíram doces, irresistíveis.

             - Mas... – dei um sorriso apertado. – Está bem eu desisto, mas aceite pelo menos metade do preço!

             - Sem mais nem menos. Quero que você guarde esse dinheiro para quando surgir uma oportunidade muito boa para ele ser usado, ok? – insistiu imponente.

             - Sim senhor, Daniel Floukin...

             Nesse meio tempo o sinal tocou e eu corri para a sala. De costume, antes das provas de História, eu lia os principais trechos para decorar instantaneamente os fatos mais marcantes. Porém dessa vez eu estava indo para a prova apenas com o que lera em casa. Correu até que tudo bem. Algumas questões pegaram no meu pé, mas com um jogo de cintura básico e minha ótima memória, visualizei algumas páginas da apostila mentalmente e retirei os trechos necessários para uma resposta convincente.

          Infelizmente, não consegui responder a uma questão. Eis aquela bendita pergunta que o Professor Emmanuel falou que iria adicionar a prova. Não entendo por que ele faz isso, mas quando pode, tem o prazer de nos encrencar. Era uma questão de vestibular, de um assunto que nem era tão ligado ao que estávamos estudando, mas ela estava lá. Pergunta número dez, última da prova, para fechar com chave de ouro. Meio respondida, provavelmente errada. 

         Nem consegui lanchar no intervalo devido a tantos amigos que precisei socorrer para a segunda prova. Era Física, a mais temida entre todos. Parecia uma guerra de nervos, todos em desespero. Os menos desesperados tentavam ajudar os outros, mas como o desespero é contagioso, já viu. Os mais desesperados recorriam às colas. Diversos meios eram minuciosamente armados, tantos que nem consigo diferenciar. Os tranquilos, que era apenas um, ou melhor uma, sofria tentando tirar o desespero de quantos mais pudesse. Sim, eu sofri.

          O sinal tocou como um carrasco para todos, menos para mim. Fui para a sala, recebia minha prova como de costume e fiz sem pressa. Não estava difícil a meu ver, respondi tudo, sabia as fórmulas e onde aplicá-las. Mesmos fazendo a prova com calma, fui uma das primeiras a sair. Os outros demoram muito para terminar, eu já estava acostumada.

           Uma meia hora depois Daniel saiu da sala, com um leve sorriso no rosto.

           - Foi bem? – perguntei.

           - Não. – respondeu ainda indiferente.

           - Não? Então porque está rindo? – espantei-me.

           - Oras, eu não vou ficar de cara fechada porque não fui bem em uma prova. Se eu não tivesse estudado ou tentado entender a matéria, aí sim eu teria motivos para ficar bravo. Mas o que eu posso fazer se números não são meu forte?

           - Nossa! – incrivelmente ele tinha razão. – Eu acho que concordo com você. Sou testemunha da sua persistência.

           - Obrigado! – Ahn... Tem como você repetir isso quando eu mostrar minha nota para meu pai?

           Eu dei uma boa gargalhada.

           Seguimos para o ponto. Finalmente era sexta feira, fim de semana chegando. Minha semana havia sido muito movimentada. Aconteceu de tudo! Eu merecia um descanso.

            Andamos calmamente para o ponto, ainda esfriando a cabeça da prova. O  ônibus já estava chegando, então apertamos o passo para alcançá-lo.

           - Mel, meu time passou para a semifinal do campeonato paulista Júnior. – começou Daniel sentando-se na poltrona. - Domingo vai ser o jogo. Eu sei que ainda é a semifinal, mas para nós, esse jogo conta mais do que a própria final. Vamos jogar contra um rival antigo, queremos muito ganhar! – disse sem pausas. – Eu gostaria de saber se você quer assistir?

            - Uhn, semifinal do paulista? Vocês devem jogar muito bem! – elogiei abrindo um longo sorriso. - Bem, domingo que horas?

            - Duas e meia no campo do Bráscuba.

            - Duas e meia? Poxa... – murmurei.

            - O horário não dá para você? – perguntou franzindo as sobrancelhas.

            - Ahh, é que eu tenho que ir a um almoço com meu pai... Mas pode ter certeza que eu tento dar uma escapada, a final o almoço também é em Bráscuba! Pelo menos para assistir ao segundo tempo... Não vou perder esse jogo! – ri com um ar de confiança.

             - Ha! Com certeza vai ser bom se você for me assistir!

             - Ah é? Por quê? – fiz uma cara de desentendida.

             Ele inclinou o corpo para o lado invadindo o espaço da minha poltrona, aproximou o rosto da minha orelha e eu gelei.

              - Cada um tem sua própria tática para jogar bem. Uns usam chuteiras novas, outros só entram com o pé direito. – sussurrou no meu ouvido. – O meu segredo... Bem, ele é um pouco diferente. Jogo muito melhor quando alguém me assiste jogando...

              - Mas seus pais e amigos não vão te assistir sempre, não vão? – respondi no mesmo tom de sussurro, inclinando um pouco a cabaça para o lado.

              - Vão... Mas eu não estou me referindo a esse tipo de torcida...

              Olhei para sua cara e levantei levemente uma das sobrancelhas.

              - Não?

              Ele apenas continuou me fitando com um leve sorriso nos lábios. Rapidamente seus olhos se mexeram, desviando para longe dos meus. Ele desinclinou o corpo e se ajeitou na poltrona. Eu ainda estava curvada em sua direção, meia sem jeito, não sabendo o que fazer. Estranhei a situação, que se tornou até um pouco engraçada. Segui o mesmo, endireitando-me na poltrona ao seu lado.

              Não sei se realmente foi isso, mas ele parecia um tanto que incomodado, inquieto de certo modo.

              - Seu ponto já está chegando. – foram as primeiras palavras dele depois de um tempo de silêncio.

              - É, já sim... – disse me levantando e rindo baixo da situação passada. – Bom final de semana Daniel. E... fica tranquilo, vou fazer de tudo para ir te assistir. – dei uma piscadinha com um olho, ao mesmo tempo em que minha bochecha se corava.

              - Vai ser bom... – murmurou para mim.

               Não sabia se essa fala era em resposta ao meu “Bom fim de semana” ou ao fato de eu ir ao seu jogo. Mas de qualquer forma, isso era o menos importante naquela hora. A cena, agora engraçada, do segundo de pausa na nossa conversa, aquele “olhos nos olhos” não saia da minha mente. Não sou tão boba ao ponto de não perceber que ali rolou um certo clima, será mesmo? Pode ser uma invenção da minha cabeça. Como ela me tortura, adora pregar peças em mim. Muitas vezes já me fez crer veemente em algo que depois me decepcionou. Não quero que isso aconteça novamente, não quero estar errada. Preciso acreditar que é possível, desejo acreditar nisso. Estou disposta a correr o risco de estar enganada, de ver coisas que não estão acontecendo. Mas se eu não confiar nessa possibilidade, vou confiar em quê? Preciso ter alguma esperança, mesmo que as consequecias não sejam das melhores. Na vida é preciso arriscar no escuro algumas vezes, jogar a moeda sem saber de qual lado ela vai cair. Pois é exatamente isso que eu vou fazer. Vou jogar a moeda.


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Notas finais do capítulo

=D