Senhora Sulista escrita por Nynna Days


Capítulo 24
Daniel Gonzales


Notas iniciais do capítulo

Novo capítulo e penultimo. Boa notícia, já comecei a escrever a continuação e assim que eu terminar de escrever Sociedade Carmim, vou me dedicar a continuação. Ah, eu já arrajei um nome. Vai se chamar Amor Sulista. Agora vocês não vão entender muito bem o porque, mas no p´roximo capítulo ( e último), vocês entederam.
Acompanhem a minha nova história, please.
Sociedade Carmim.
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Capítulo 24 – Daniel Gonzales

Senti o ar frio tocando minha nova pele e fechei meus olhos. Sair da tensão do julgamento me fazia sentir menos enjoado. Sabia que tinha alguma coisa estranha com Dinnie Ray, mesmo ela tentando aparentar estar bem. Seus olhos nunca conseguiam mentir para mim. Aquela descoberta de que seu verdadeiro criador era um assassino em massa, a deixou bastante balançada. Naquele momento, eu queria confortá-la, mas fui interrompido pelo chamado de meu avô.

Eu sabia que uma hora ou outra teria que contar a ele o que realmente aconteceu comigo. Só não sabia que seria desse jeito e tão rápido. Ele descobrir o que eu era, deveria significar a maior traição de todas as épocas. Primeiro seu filho morre por uma vampira, agora seu neto se torna um vampiro, o que me fazia praticamente morto.

Segui a multidão de vampiros e caçadores tensos que saiam do congresso e encontrei meu avô sentados nos degraus, com a cabeça baixa em suas mãos. De longe eu já conseguia escutar seu coração batendo em disparada. Era como se ele estivesse ansioso para ver que era fantasia o que tinha visto lá dentro e que eu não era um vampiro. Odiava decepcionar o velho, mas era a verdade.

“Vô”, chamei e me sentei ao seu lado, só que um pouco mais distante.

Seu corpo pulou de susto. As vezes eu me esquecia que era silencioso. Barão levantou seus olhos cinzas familiares para mim e me estudou de perto. Discretamente, passei a língua pelos dentes, vendo se as minhas presas estavam aparecendo. Sorte minha que elas estavam escondidas. Seria muita coisa para meu avô absorver.

“Então é verdade o que eu vi.”, ele disse. Não perguntou, mas afirmou. “Você se tornou um deles, Daniel”, ele balançou a cabeça e voltou a afundá-la nas mãos.

“Vô, entenda.”, toque seu ombro e ele recuou.

Algo se apertou em meu peito e eu desviei meus olhos para frente, para a noite escura do centro. A quanto tempo que eu não ia para lá. Com meus novos sentidos, conseguia escutar e ver pessoas felizes pelo natal. Com toda essa confusão eu tinha até esquecido dessa data. Será que vampiros comemoravam? Pelo visto, não. Para terem marcado um julgamento para aquele dia.

“Por que, Daniel?”, meu avô perguntou de repente. Quando o encarei , ele parecia tão frágil. “Todos me deixam. Primeiro seu pai, agora você.”, seu olhos pareciam implorar por uma resposta. “Sou uma pessoa tão ruim?”

“Claro que não, vô”, tentei o acalmar.

“Então por que? Seu pai parecia tão feliz com Marisa, sua mãe. Então ele recuou para o passado e morreu por causa de Dinnie Ray.”, ele me olhou de cima a baixo e desviou os olhos. “E agora você parece ter feito o mesmo.”

“Ela me salvou.”

“Te matando?”, ele parecia indignado. “Preferia te ver enterrado a sete palmos de terra ao saber que se tornou um zumbi sugador de sangue.”

Aquela doeu.

“Realmente, Barão”

Nem escutei os passos atrás de nós, por isso tomei um susto com a voz de Ray atrás de nós. Ela tinha os olhos duros e a boca reta em um sinal claro de frustração pelas palavras do meu avô dirigidas a mim. As mãos na cintura, enquanto ela esperava a resposta dele. Meu avô se levantou rapidamente e se colocou na frente dela. Dinnie nem se mexeu diante da ameaça óbvia. Ela preferia ser ferida fisicamente do que deixar qualquer um me ferir com palavras.

“Você tem aprender a controlar suas palavras. Está magoando, Daniel”, ela disse.

“E você o matou”, ele retruquiu. Vi Ray recuar.

“Você achar que eu não me arrependo?”, ela perguntou. Foi a vez de meu avô recuar, só que surpreso. Aproveitei a distração dos dois e me levantei, lentamente. “Eu gostava do som do seu coração e do jeito que ele respirava porque precisava, não por hábito.”

Por um segundo pensei que eles tinham se esquecido que eu estava ali, mas eles desviaram os olhos um do outro e me encararam. Me senti como uma criança pequena e os pais brigando por minha guarda. Dinnie Ray foi a primeira a voltar o olhar para meu avô.

“Mas, dizer a ele que o preferia morto do que aqui, falando com você, é a pior injustiça do mundo.”, ela continuou. Meu avô não tirou os olhos de mim. Continuei sério e tentei deixar meu rosto igual ao de Daniel de dois dias atrás. “Se quiser culpar alguém, me culpe. Me culpe por tudo, Barão. A morte de Marco e de Marisa. A 'morte' de Daniel.”, ela fechou os olhos e esperou. “É a mais pura verdade que nada disso aconteceria se eu nunca tivesse conhecido Marco.”

Meu avô continuou olhando para mim, parecendo esperar alguma reação vinda de mim. Em seu olhos passavam tantos sentimentos de uma vez que eu quase não pude identificá-las a tempo. Dor. Esperança. Reconhecimento. E por último e tão esperado, Amor.

“Não, Dinnie Ray.”, meu avô finalmente disse. Ray abriu os olhos, espantada. Barão arrastou seus olhos cinzas para ela e continuou. “Você fez isso porque o ama.”, ele hesitou nas próximas palavras e parecia usar muito dele para proferí-las. “Se eu estivesse no seu lugar, acho que faria a mesma coisa.”

Não era segredo nenhum que ele estava falando da morte de minha avó. Ela tinha morrido enquanto dava a luz para o meu pai. Meu avô ainda se culpava por isso e o consumia durante esses 45 anos. A única coisa que o desligava da vovó, era meu pai. E depois da morte dele, eu. E agora ele estava ali, sozinho. Conseguia ver seus músculos tensos. Era como se ele visse que estava em desvantagem e cedesse. Soltei o ar e vi Dinnie fazer o mesmo.

“Quero que seja feliz, Dan.”, meu avô disse vindo em minha direção para me abraçar. “Entre te ver assim e nunca mais te ver, prefiro que tenha presas.”, ele me apertou em um abraço forte para a sua idade. Dei um leve aperto e o vi reclamando. Tentei me afastar, mas ele não deixou, rindo. “Só não faça ir atrás de você para matá-lo, moleque.”

Eu ri.

“Não, vô.”, eu respondi quando ele me soltou. Tinham lágrimas em seus olhos cansados. “Tenho uma boa vigia.” , levantei meus olhos para Dinnie, mas ela não estava mais ali. “Tenho que ir.”

“Tudo bem.”, ele suspirou, cansado. “Se cuide e venha me visitar”

Assenti, me virando para procurar Dinnie. O que foi um pouco difícil com aquela multidão de vampiros que ainda saiam do congresso. De longe, avistei alguns dos meus amigos da época humana. Que trabalhavam comigo na oficina. O que me fez parar para pensar. Agora que eu não teria uma vida normal, como iria trabalhar. Não poderia me mater na 'aba' de Ray para sempre. Tinha que arrumar um emprego.

Entrei com passos arrastados no congresso e consegui achar Dinnie Ray conversando com Dorian e os outros jurados. Nem sinal de Luanne e Noah. Caminhei com passos lentos até Ray. Dorian foi o primeiro a me ver, e abriu um grande sorriso. Ele gostava de cutucar Dinnie. O outro jurado, de olhos lilás, também me encarou e sorriu. Por último, a mulher de olhos brancos, sorriu. Vendo que a atenção tinha ido para outro lugar, Dinnie se virou e me encarou.

Um sorriso pequeno apareceu em seus lábios enquanto eu me aproximava. Era como se todos ao redor tivessem ficado em silêncio conforme eu me aproximava. A vampira do olhos branco se aproximou de Dinnie e sussurrou algo em seu ouvido. Não pude escutar por ainda estar longe e minha orelha estar em estado de torpor, causado pelos olhos de Dinnie. Quando eu finalmente cheguei perto dela, entrelacei meus dedos nos dela.

“Parece que Dinnie se achou realmente”, o vampiro de olhos lilás disse.

“Eu gostaria de me achar assim”, a vampira gracejou me olhando de cima a baixo.

“Esse já tem dona, Dália”, Dorian disse a repreendendo discretamente. “E concordo com você, Pietro. Ela realmente se encontrou.”

Meus ouvidos poderiam estar prestando atenção na conversa, mas meus olhos eram apenas de Dinnie Ray. Presos nos seus, eu ainda não sabia como não a estava agarrando. Engoli saliva e levantei meu olhar para nossos espectadores. Um meio sorriso hospitaleiro nos lábios. Dinnie também se virou para os vampiros.

“Daniel, esses são Dália Souza, Senhora Sulista do Rio de Janeiro, Brasil.”, Dinnie me apresentou a vampira de olhos brancos e com a tatuagem de pomba no pescoço. Dália estendeu seu mão chocolate para mim e eu, como uma bom cavalheiro, a beijei.

“É um prazer conhecê-la, Senhora”, disse fazendo uma breve mesura. Ray deu um olhar orgulhoso na minha direção. Ela não pensava que eu aprenderia tanto nesse tempo com seus vampiros.

“O prazer é todo meu, Daniel”, Dália respondeu e sorriu. “Adoraria que um dia vocês fossem nos visitar. Tirar uns dias de folga para você nas lindas praias brasileira.” Suas presas eram grandes e bem afiadas. Tive um instinto de recuar, mas tudo o que eu fiz foi ampliar meu sorriso, ainda ocultando minhas presas. Discretamente, Dinnie assentiu, dizendo que eu estava fazendo a coisa certa.

“Esse é Pietro Bonacera, Senhor do Norte de Roma, Itália.”, Dinnie gesticulou para o vampiro de olhos lilás com uma tatuagem de um corvo no pescoço.

“Senhor”, cumprimentei fazendo uma mesura.

“Não seja tão formal”, Pietro reclamou. “Você está com Dinnie Ray. As pessoas que deveriam estar se curvando para você por esse feito.”, ele estendeu a mão na minha direção e eu apertei. Dorian riu com o comentário de Pietro.

“Se sua mulher escutar isso...”, Dorian deixou a frase em aberto e balançou a cabeça.

“Mirella pode ser linda, mas tem algo em Dinnie que atraí.”, Pietro continuou com seu gracejo, olhando Ray de cima a baixo, como se fosse uma mercadoria. Não gostei por um momento, até que ele me encarou com um sorriso nos lábios. “Hey, garoto, não se preocupe. Sou casado e muito bem casado. Amo muito minha esposa e caí entre nós.”, ele se aproximou de mim e sussurrou. “Prefiro as loiras.”

Esse comentário me fez ficar mais calmo e gerou mais e mais risadas entre os vampiros. Eu nunca me imaginei ali, cercados por vários vampiros conversando e rindo. E escutar Dinnie Ray rindo era espetacular. Nem eu conseguia fazê-la rir tanto em tão pouco tempo. Aproveitando que tantos vampiros importantes estavam reunidos, coloquei para fora uma das minhas dúvidas sobre suas cultura.

“Vocês não comemoram o Natal?”, perguntei de repente. Todos ficaram me encarando como se eu fosse um dos vampiros mais loucos do mundo. Pietro, então explodiu num riso.

“Claro que sim”, ele respondeu.

“Então por que marcar um julgamento para o dia do Natal?”, eu estava realmente confuso. Quem me respondeu dessa vez, foi Dália.

“Todos temos casa, querido. Queremos passar o natal com quem amamos. Ao mesmo tempo, temos deveres. Quanto mais cedo terminamos com isso, mais cedo vamos comemorar. Um pouco atrasado, claro.”

“Vocês ainda não vão embora?”, estava surpreso.

“Sinto que seu menino quer se ver livre de nós, Dinnie Ray”, Dália disse. Ray apenas levantou uma sobrancelha para mim, mas no fundo dos seus olhos brilhava diversão. Os olhos brancos de Dália pousaram novamente em mim. “Só vamos embora depois da morte na praça pública, amanhã.”

“Oh!”, tentei soar surpreso e não decepcionado.

“É melhor você levá-lo para casa, Ray”, Dorian disse de súbito. “Logo irá amanhecer e vocês ainda tem que ir na praça pública.”

“Por que TEMOS?”, perguntei dando enfase a última palavra.

Todos ficaram em silêncio, não querendo me responder. Dália parecia distraída pelo contraste de seu terninho branco contra seu cabelo escuro. Pietro começou a procurar Mirella , ao redor. Dorian olhava para Dinnie, esperando ela me responder. Mas algo no olhar dele parecia gritar VOCÊ NÃO CONTOU A ELE. Tinha mais coisas que eu deveria saber? Isso já estava me dando dor de cabeça. Dinnie colocou a mão em meu ombro e me olhou docemente.

“Eu vou ter que ir para matar Luke”

******

A ida até em casa foi um pouco tensa. Dinnie me disse que Luanne e Noah foram mais cedo para o Quartel General para dar as notícias do julgamento aos vampiros sulista. O que resultou em irmos até o sul a pé. Bem, eu não diria A PÉ. Já que corremos a maior parte do caminho. Mas o silêncio (tanto meu quanto de Dinnie) era sufocante.

Quando chegamos a porta do seu prédio desaceleramos. Ray parecia perdida em pensamento, enquanto tentava entender essas súbitas mudanças de humor. Vampiros tinham TPM? Tinha algumas coisas que estavam coçando na minha garganta. Não, não era fome. Era curiosidade. Uma parte de mim, ainda suspeitava que esse estranho comportamento era culpa. Outra parte dizia que tinha a ver com Luke ser seu criado e ela ter que matá-lo. Tinham outras possibilidades, mas nenhuma tão provável quanto aquelas duas.

“Ray, fala comigo”, pedi assim que ela entrou no apartamento.

“Estou falando”, respondeu com a voz fria.

Pisquei e ela não estava mais ali. Droga. Parecia que mesmo eu como vampiro ainda era lento. Segui seu cheiro e os ruído fracos até o seu quarto. A observei trocando a roupa formal o julgamento para uma camisola solta. Ela soltou o ar como se sentisse mais livre. Eu adoraria fazê-la se sentir livre, mas ela estava criando uma parede entre nós dois. Novamente.

Aquilo era pior do que a compulsão. Pelo menos eu consegui quebrar a compulsão. Agora a probabilidade de conseguir passar pelo muro metal criado por Dinnie era bem pequena. Pensei que ela se deitaria e dormiria, como qualquer mulher pensativa. Mas, ela apenas se sentou na ponta da cama e afundou o rosto nas mãos, assim como meu avô tinha feito mais cedo. Parei em frente a ele e tentei acariciar seus cabelos. Ela recuou.

“Se você não me explicar o porque de estar assim, vai ser difícil te ajudar”, eu disse.

Ela levantou os olhos para mim e eu recuei. O escarlate brilhava frio.

“Não te pedi ajuda nenhuma”

“Mas, eu quero te ajudar, Dinnie”

“Não preciso de ajuda.”, ela se levantou, passando a mão pelo cabelo, um pouco perturbada. “E mesmo se eu precisasse, procuraria um psicólogo.”

“Não faça isso”

“O quê?”, ela pareceu surpresa com meu comentário. “Procurar um psicólogo?”

“Não”, balancei minha cabeça e estiquei minha mãe, tentando alcançá-la de novo. Ela se afastou e foi para o outro lado do quarto. Minha mão caiu ao lado do meu corpo e eu suspirei alto. “É disso que eu estou falando. Não faça isso. Se afaste de mim. Não agora.”

“Desculpa se isso faz parte da minha natureza.”, sua voz estava dura.

“O quê?”, retruqui. “Fugir dos problemas, envés de sentar e falar sobre eles?”

“Eu não tenho problemas”

“E eu não tenho presas.”, em outra situação eu teria rido, mas agora eu estava tenso. Andei até onde Dinnie estava e toquei seu rosto com a ponta dos dedos. Ela levantou os olhos para mim, mas eles estavam tão triste que me doeu vê-los. “Isso é por causo de Luke ou por causa do que meu avô disse?”

“Um pouco dos dois”, ela confessou. (Finalmente).

Como era difícil fazer essa mulher se abrir comigo, meu Deus. Dinnie deu um passo a frente, se aproximando de mim. Seus olhos se suavizaram um pouco. Parecendo notar o quão frágil estava, desviou de mim e voltou a se sentar na cama. Me sentei ao seu lado. Ela fitava o nada, enquanto falava.

“Ás vezes parece que, eu não fui feita para ser feliz.”, ela soltou com um pouco de esforço. Abri a boca para perguntar o porque dela dizer isso, mas, parecendo ler a minha mente, ela acrescentou: “Eu já fui noiva, sabia?”

“Noiva?”, me espantei.

Não que ela noiva me espantasse menos que ela com meu pai, mas mesmo assim. Noiva? Ela riu suavemente com meu espanto e entrelaçou meus dedos nos seus. Ela estava se abrindo aos poucos. Isso era bom.

“É. Eu ainda era humana.”, ela continuou parecendo cada vez mais presa as lembranças. “Tinha recém feito 20 anos. Tinha planos de sair de casa e levar minha irmã mais nova, Susan, comigo. Ela tinha apenas 15 anos, tão nova e brincalhona.”, ela riu um pouco com a lembrança da irmã. Então seu sorriso diminuiu, devagar. “Eu era noiva de um dos homens mais cobiçados de Dallas, Texas.”, ela me olhou e deu outro pequeno e rápido sorriso. “Esse é o porque do meu último nome. Quando saí de Dallas, fiquei com Dallas.”

“Mas, voltando. Jonathan Miller era bonito, confiante e elegante. Tudo o que minha mãe queria. Além do dinheiro, é claro. Por um momento, pensei que também era o que eu queria. Ela me cortejava sempre que possível e me presenteava. Naquela época, isso era bastante comum. Nosso primeiro beijo, foi no dia em que ele me pediu em casamento. Mesmo assim, tinha sido apenas um roçar de lábios. Nada comparado com o que eu senti com seu pai, ou com você.”

Ela pausou e respirou fundo. Parecia que para saber dela, teria que conhecer a sua raiz. Ela fez uma careta e me encarou. Tentei deixar meu rosto mais em branco possível. Sabia que ela falaria de meu pai. Uma hora ou outra. Era irreversível.

“Para resumir.”, ela continuou ainda olhando para mim. “Ele me traiu. Com uma prostituta.”, quando eu arfei em surpresa, ela sorriu. “É, até naquela época existiam essas mulheres. Quando eu vi ele com ela, corri e me perdi numa floresta que havia ali perto. Fiquei perdida e Luke achou.”, ela engoli e olhou para as mãos no colo. “Ele me perguntou se eu queria morrer de verdade ou ficar solitária. Eu respondi que preferia ficar solitária e ele me mordeu, me transformando.”

“Pensei que você não soubesse quem te criou”, indaguei.

“Eu não sabia.”, ela balançou seus cabelos, furiosamente. “Não sei até hoje.”, ela se levantou. Eu permaneci sentado. Dinnie andava de um lado para o outro, tentando decidir o que falar ou o que não precisava agora. “Eu pensei que tinha me encontrado quando encontrei e me apaixonei por seu pai, mas vi que estava enganada.”, ela pausou e me encarou, esperando alguma reação minha. Apenas assenti, esperando que ela continuasse. “Ele nunca me entendeu como você me entende. Isso, ás vezes, me assusta muito.”

“Eu estou com você, Ray”, peguei uma mão sua e a coloquei entre as minhas, aquecendo-a.

“Seu pai me chamava de Ray”, ela lamentou.

Uma parte de mim queria gritar para ela esquecer meu pai por um segundo e se ligar em nós dois apenas. Então eu sempre lembrava que eu era uma lembrança bem viva do meu pai. Meus olhos, o mesmo apelido. Tudo se arrastava para meu pai. Ás vezes me arrependia de nunca tê-lo conhecido. E me incomodava que os outros o conheciam melhor do que eu. Notando meu silêncio, Dinnie se inclinou na minha direção e tirou uma mexa de cabelo do meu rosto.

“Me desculpe”, ela sussurrou docemente.

“Tudo bem”, respondi.

“Tenho um presente para você”

Ela soltou minha mão e saltitou até o armário. Sorri ao ver um pouco da Dinnie Ray que ninguém mais conhecia. Uma extrovertida e que se desculpava. Que gostava de sorrir e fazer os outros rirem. Ela se abaixou e começou a mexer no fundo do armário. Fiquei observando seus quadris se mexendo conforme ela reclamava o quão fundo o presente estava. Eu não falava nada, fascinado pela perfeição que estava tão perto de mim.

Finalmente ela se levantou (e antes que eu pudesse agarrá-la), trazendo consigo um embrulho na forma retangular. Ela caminhou calmamente até mim e se sentou no meu colo, colocando o embrulho nas minhas mãos que pousavam em suas pernas. Fiquei tentado a jogar o presente para o lado e subir minhas mãos por seu corpo. Como se lesse meus pensamento, Dinnie riu e disse:

“Abra logo, Daniel”

Relutante, eu abri. Primeiro pensei que era algum livro idiota sobre como se um bom vampiro. Mas não era. A capa era azul e , ao mesmo tempo que era dura, era fofa e acolchoada. Passei meu dedo pelo macio pano, então abri. Arfei e Dinnie prendeu a respiração, esperando uma reação.

“Isso é...?”, comecei a indagar.

“Um álbum de fotos do seu primeiro ano de vida”, ela completou e sorriu um pouco. “E algumas fotos de quando sua mãe ainda estava grávida e Marco vivo.”

Passei os olhos em cada foto, percebendo a presença de Dinnie em algumas delas. Todas ela tinha os olhos azuis violetas. Em todas que ela estava com meu pai, eu podia ver a tensão gerada pelo passado deles. Mas, tinha uma foto, quase no final, que meio que contradisse a tensão. Eles estavam se olhando e pareciam se querer ali mesmo. Fiquei pensando como que minha mãe não tinha notado aquilo ainda.

“Essa foto foi tirada antes do seu pai conhecer sua mãe.”, Ray explicou. A encarei surpreso por ela ter percebido minha confusão com aquela foto. “O que foi?”

“Nada.”, voltei a olhar as fotos. Passei por uma em que estava minha mãe e Dinnie Ray abraçada. “Minha mãe nunca desconfiou de você e do meu pai?”

“Gostaria de dizer que não, mas eu realmente não sei.”, ela estava encarando a foto e estudando-a como eu. Era um pouco surpreendente que minha mãe era uma mulher tão linda, ainda mais para uma humana. Os grandes olhos verdes, os cabelos escuros e curtos no ombro, a pele clara. Tão diferente de Dinnie Ray. Mas em seus olhos brilhavam esperteza. “Ás vezes eu a pegava olhando para mim e Marco, como se ela suspeitasse. Marco jurou que nunca contou nada para ela, mas Marisa não era burra. Mulher sabe quando o passado bate a porta em forma de auxílio. Mas, ela nunca foi grossa comigo ou malvada. Muito pelo contrário. Era um doce. E isso que me deixava mais culpada.”

Passei por mais uma foto, de meu pai e minha mãe. Me surpreendi com o fato de meu pai ser loiro. Quero dizer, nunca soube a cor dos cabelos de meu avô, por serem de um branco incomparável. Mas, saber que meu pai era loiro, era um pouco estranho comparado ao fato de eu ter os cabelos escuros de minha mãe.

As últimas fotos do álbum eram uma minha pequeno no colo de minha mãe e ao lado de Dinnie Ray. Dava para ver o sorriso forçado das duas enquanto encaravam a câmera. A última era de meu pai, minha mãe e Dinnie juntos. Eu podia ver o olhar de felicidade dos três, mesmo suspeitando que o de Ray era forçado.

“Gostou?”, Dinnie perguntou ansiosa quando fechei o álbum e o coloquei ao lado da cama.

“Amei”, respondi e entrelacei meus dedos nos seus em seu colo. “Como eu amo você”

Eu poderia ter induzido aquela noite para terminar em um sexo quente, mas sabia que não seria a coisa certa a se fazer naquele momento. Por isso apenas me deixei encaixar no seu corpo e dormir com sua cabeça em meu peito. Ela sentia falta do bater do meu coração, isso era fato. Mas das outras coisas, nem tanto. Outro indício disso, foi quando, depois de uns minutos em silêncio, ela levantou seu olhos vermelhos para mim.

“Nada de me agarrar?”, ela perguntou parecendo surpresa.

“Não”, neguei e sorri.

“Vocês, Gonzales, são estranhos”

“Estou apenas cuidando de você”, tentei me defender.

“Já tenho babás demais.”, ela se sentou no meu colo e inclinou-se para frente, pondo seu rosto a centímetros do meu. “Quero você, agora.”

“Mas, e o julgamento amanhã?”, não acreditava que estava tentando me esquivar dela.

“Vou matar alguém, Daniel. Não vou fazer um discurso de posse presidencial.”

“Já que é isso...”

Ela riu quando virei nossos corpos, me pondo por cima e a beijei. O clima entre nós era instalado tão rápido que parecia que sempre esteve ali. A tensão ainda estava ali, só que um pouco esquecida por algumas horas. Quando o sol ameaçou finalmente aparecer, nós finalmente fomos dormir.

Nos preparando para o começo de nossas vidas.

E o final de mais duas.


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Notas finais do capítulo

E o que acharam da atitude de Barão com Dinnie Ray, a aceitando? E Daniel finalmente conseguiu fazer essa mulher se abrir para ele. O sentimentos, quero dizer. Não percam sexta feira o último capítulo.