É Segredo escrita por Phallas


Capítulo 8
Capítulo 8




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"Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes."

                                    - Adriana Falcão

Não sou exatamente o tipo de pessoa que você gostaria de ver brava.

Mas é simplesmente assim que me sinto nos últimos dias. Na segunda, depois do treino, eu fui pra casa e tomei um merecido banho. Meus dias, desde então foram iguais àquele. E, quando eu digo isso, acredite, quer dizer que foram perfeitamente iguais.

Às vezes eu penso que minha vida é muito sem graça. A gente vê nas novelas e nos filmes aquelas pessoas com a vida super agitada, será que eu sou a única que sente como se estivesse fazendo a mesma coisa todos os dias? Na verdade, eu não sinto, eu realmente estou fazendo uma reprise daquela segunda todos dias.  Escola, casa, treino e casa de novo. E no dia seguinte, faço tudo outra vez.

Aprendi que jogo melhor quando estou com raiva. Principalmente quando penso que a cara de Megan Parsons é a bola. Não me levem a mal. Quero dizer, paciência é tudo na vida. Mas às vezes uma metralhadora faz falta.

Agora estou deitada na cama ouvindo uma música do Adam Lambert no último volume, preocupada com o jogo de sábado. Eu sei que somos boas, mas é que vamos jogar contra o mesmo time que nos tirou da liga municipal ano passado e ainda nos roubou o título de "Time de Voleibol Juvenil da cidade" e, claro, estou preocupada com a Megan, uma vez que o nome dela e a palavra "união" não combinam.

Se aquela menina me fizer perder de novo, ela sai da quadra e vai direto para o hospital. Sim, porque nós perdemos no ano passado por culpa 100% dela. Não importa o que as outras meninas digam, elas não sabem de nada.

Eu olho para o uniforme oficial do time em cima da minha cômoda. Peter não nos deixa treinar com ele, embora já tenhamos insistido muito. Nosso professor é meio fresco se tratando de jogos de verdade, e não treinos. Este ano, sinto que ele quer a Liga Estadual mais do que tudo. E é o que eu quero também.

- Mãe! A Bellie está ouvindo música alta! Vou ficar surdo!

Heath.

- Já chegou, pirralho? - abro a porta para provocá-lo, ainda sem abaixar a música.

Minha mãe aparece, ofegando. Subir as escadas deve ter custado muito a ela, considerando que ela teve que subir com a mala de Heath, que chegou da casa de um amiguinho. Ele podia ter ficado lá para sempre, se quisesse.

- Abaixe isso, querida. - minha mãe diz.

Eu sei que se eu demorar mais um segundo para abaixar a música, esse 'querida' não fará mais sentido nenhum.

Abaixo o volume e me encosto na beirada da porta, observando a operação de minha mãe, que, sozinha, leva mala de meu irmão para o quarto dele.

- Heath, seu idiota, podia ajudar mamãe em alguma coisa.

- Ah, vai cuidar da sua vida! - ele grita do quarto dele.

- Ela já está muito bem cuidada! - grito de volta, e bato a porta. Após fazer isso, me sinto meio infantil.

Mas é por isso que quando alguém fala que queria ter um irmão você, que sofre com um irmão, mais novo, mais velho, gêmeo, a coisa que for, tem que mandar a pessoa tomar vergonha na cara.

Não levem para o lado errado, eu amo o meu irmão, mas às vezes eu acho que minha vida ficaria melhor se ele caísse pela janela. Sei lá.

Hoje é quinta. O jogo é no sábado, lá pelas cinco da tarde, ou alguma coisa perto disso.

A aula hoje foi insuportável. Não que seja alguma novidade, mas é que hoje, além de ter sido um porre, foi estressante. Eu e Tensy passamos a aula de Português inteira passando bilhetinhos e discutindo estratégias para o jogo do fim de semana. Jogo que, eu percebi no treino de ontem, está preocupando a todos, principalmente a Peter. Ele tem é que se preocupar mesmo.

Não consigo me concentrar em nada do que faço. Tenho toneladas de excercícios de Física para fazer, mas não consigo visualizar os números na minha frente.

Então faço o que sempre faço quando estou nervosa. Vou exfoliar o rosto. Não estou brincando. É isso que eu faço. Em compensação, só cuido da minha pele quando estou nervosa.

Estou acabando de exfoliar quando o telefone toca.

- É pra você, garota. - Heath irrompe pela porta do banheiro sem bater nela, carregando o telefone de cara fechada.

Pego o telefone e, esquecendo completamente do exfoliante, colo o telefone na orelha. Merda.

- Alô.

- Oi, Bell.

- Ah, oi, Tensy.

- Pode me passar o dever de Física? Eu acho que estava dormindo nessa hora.

- Você dorme todas as aulas, Tens. Mas eu ainda não fiz nenhum, acredita? Tô preocupada com o jogo.

E então o assunto volta todo pro jogo. Lá estamos nós falando de passes, bloqueios e ataques. Não conseguimos esquecer e ficar tranquilas em relação a isso.

- Temos que voltar com tudo esse ano. Quero que sejamos o time da cidade de novo. - Tensy diz. Pela voz dela, não é preciso estar ao seu lado para saber que ela está tremendo.

- Eu também. O problema é a vadia da Megan.

- É. Aquela menina podia desaparecer.

A conversa segue. No fim, desligamos o telefone e eu nem lembro se passei o dever de física para ela. Estou nervosa de novo.

Há exfoliante pelo telefone. Eu limpo e o tiro do meu rosto também. São quase dez e meia e estou meio cansada. Quero estar disposta para treinar amanhã.

                                                          ○    ○    ○

- E aí, se elas pularem, nós não pulamos, para garantir, sabe? Já pensou em jogar de fundo desta vez? Só pra ver no que dá. Ah, já sei, podemos colocar aquela menina do primeiro ano entre mim e você. Que aí, se nenhuma de nós duas conseguir pegar...

- Tensy, podemos esquecer um pouco isso agora, por favor? - interrompo minha amiga, que está monologando deve ter uns dez minutos.

A boca dela se fecha de imediato.

- Achei que estivesse tão preocupada quanto eu.

- Acho que estou mais. Só quero relaxar um pouco, entende?

- Entendo. Te vejo no treino hoje?

- Eu não perderia por nada. - falo para ela, com uma piscadinha.

                                                              ○    ○    ○

 Meu Deus, o jogo é hoje. Penso isso enquanto ponho o meu uniforme. Ainda são quatro horas e jogos de vôlei sempre atrasam, mas quero ficar pronta.

O tempo passa devagar. Fiquei no computador até agora há pouco e várias pessoas no msn me desejaram boa sorte e disseram que vão estar lá, pra torcer.  Não sei se isso me faz me sentir melhor ou pior. Arrumo meu cabelo pela décima vez e meu pai me avisa que está na hora de irmos. Eu respiro fundo e desço as escadas.

Normalmente, meus pais assitem aos meus jogos, mas hoje eles não vão, porque minha mãe tem uma hora com um cabeleleiro concorrido e meu pai, uma reunião de negócios.

Estou nervosa no carro. Minhas mãos estão suando. Me sinto como se estivesse sem força, e eu não pudesse jogar mais nada. Poucas vezes fiquei tão preocupada.

Chego lá e boa parte das meninas já estão. Minha mãe me dá um beijo de boa sorte e meu pai me manda um tchauzinho do carro.

Tensy vem na minha direção, me abraça e me chama para me alongar junto com as outras meninas.

Peter me cumprimenta com um sorriso rápido, e se vira para conversar com um dos juízes. "Seja sempre amigo daqueles que mandam", lembro que ele disse ao time uma vez.

Olho a quadra. Está lotada. Os jogos de vôlei nunca estão vazios, mas desta vez está diferente. É o primeiro jogo e há um clima de decisão, o que me agradaria se eu estivesse respirando. Sinto que todo o colégio sabe da rivalidade extrema de nosso colégio com o colégio West High, com quem vamos jogar hoje. Que bom que estão aqui para torcer. Vejo gente da minha sala, professores, pais de jogadoras, e pessoas que não sei identificar ou cujo nome me fugiu agora.

O outro time chega. O habitual uniforme roxo e preto que estamos acustumados a ver e a odiar.

Então a vejo.

Blake Carmichael. A capitã do time do West High. A única pessoa que eu odeio mais do que Megan Parsons. Megan também a odeia, e isso já nos uniu algumas vezes. Blake chega desfilando e lança um olhar de desprezo sobre nosso time, que está fazendo alguns excercícios em duplas. Na verdade, desconfio que ela olha com aquele olhar cínico para qualquer lugar, menos para o espelho.

- Boa tarde, senhoras e senhores. Sejam bem-vindos. - a voz de Steve Puttyn, o narrador dos jogos de vôlei e também aluno, toma conta da quadra inteira.

É. Parece que a hora é agora.


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