Amz escrita por MissBlackWolfie


Capítulo 1
Sarah


Notas iniciais do capítulo

Vcs devem estar se perguntando.;; miss tu falou na clair. tu me vem com sarah??? oi???

começa assim mesmo... depois vcs vão entender.. tudo... ok???



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Sarah

A última vez que o vi pela janela de meu quarto, era somente um vulto se afastando e sumindo ao longo da rua escura, naquele momento soube de imediato que minha vida havia mudado para sempre.

Fechei os olhos para memorizar cada traço do seu rosto. Sua boca carnuda, seu nariz, seu queixo quadrado, e principalmente seus olhos. Possuíam uma cor que nunca havia visto em nenhum outro olhar, era cinza claro, tinha um brilho que poderia iluminar qualquer escuridão, e assim o fez no breu que encontrava o meu coração.

Aquele homem havia me transformado em uma mulher apaixonada, por ele e pela vida. Vivemos uma paixão quase que enlouquecedora. Entregamos-nos a cada momento dessa historia de amor de forma intensa, não pensando muito na razão. Eu não queria me limitar às convenções sociais, como casamento, esse sentimento transcendia a qualquer regra social. E ele era favorável a essa minha conduta de não compromisso.    

Cada minuto que passávamos juntos, eu sentia que ele sempre me pertenceria de alguma maneira, que estaríamos ligados por toda minha história. Sempre haveria dentro de mim um pedaço dele, durante cada dia da minha vida.

Era uma paixão avassaladora, que me consumia intensamente. Não havia outro pensamento, outro desejo ou outra vontade que não fosse ele. Poderia passar anos, décadas, poderia o destino separar nossos caminhos, entretanto esse sentimento nunca iria se acabar.

Ao vê-lo partindo naquela madrugada, senti uma punhalada em meu coração, como uma adaga o tivesse ferido de forma irreversível. Cheguei a me curvar para frente, com mão em meu peito, tentando respirar e mantendo minhas pernas firmes, para não cair de joelho.

A dor da separação era violenta invadia minha alma, deixando-me desorientada. Porque eu tinha certeza absoluta dentro do meu peito: era a ultima noite que o veria e sentiria em meus braços.

Fechei meus os olhos para memorizar cada detalhe do seu rosto e do seu corpo. Suspirei profundamente, estava difícil me manter firme diante da sua partida. As lagrimas já estavam lá para expressar todo esse sofrimento da despedida.

Dentro de mim sabia que nunca mais ele estaria ao meu lado, que nosso amor passaria do presente para o passado. Ele partiu também com dor, podia ver isso nos seus lindos olhos cinza, mas sabíamos que não poderíamos mais nos encontrar. Havia uma conseqüência muito solida dessa historia de amor. 

Abri meus olhos, as lagrimas que estavam ali empoçadas, esperando o momento exato para mostrar o tamanho real da minha desolação, caíram livremente. Não havia mais razão para controlá-las, simplesmente deixei elas rolarem, molharem todo meu rosto. Havia um vazio dentro de mim, entretanto eu esperava por algo mais desolador.

Na verdade era eu esperava que a dor pela ausência do meu amado fosse como um tipo de veneno no meu corpo. Me mataria lentamente, a cada momento que sua lembrança contaminasse minha mente, eu iria morrer um pouco.

Contudo não foi assim, eu sentia tristeza imensa, entretanto também havia um tipo de transformação do sentimento amor dentro mim.

O amor que sentia por aquele homem, foi modificando, estava se transformando dentro de mim. O vazio que estava no meu peito por nossa separação, foi preenchido por um sentimento de alegria e amor genuíno. Sentia-me completa. Essa nova forma de amar estava me consolando a perda que acabará de sofrer. Esse outro amor passaria ser tudo para mim.

Quando olhei para minha barriga soube, de imediato que minha vida havia mudado para sempre. Sentia que haveria uma transformação na minha vida por completo. Não me trazia medo, mas sim confiança de que essa pessoa abriria as portas para uma nova vida, que eu parecia ansiar por muito tempo esse recomeço.

Com o passar dos meses, a minha barriga foi crescendo. Nunca estive grávida antes, mas parecia que o meu ventre crescia de forma acelerada. Sendo que depois de quatro meses, minha mãe foi tirar minha medidas para costurar novas roupas para mim, afinal as velhas já não estavam mais cabendo em mim.

Quando ela passou a fita métrica na altura do meu busto vi sua sobrancelha se levantar, assustada com o aparente inchaço que ele se encontrava. Mas não fez comentário algum.

Ao continuar em suas medições notei que seu rosto estava cada vez mostrando mais desconfiança, mas ela não compartilhava seus pensamentos. Finalmente ela ficou de frente para mim, passou a mão no meu ventre e concluiu finalmente que não estava engordando de comum, que na verdade eu estava esperando um filho.

Ela pareceu não acreditar como aquilo era possível, afinal eu nunca fui comprometida. Nenhum pretende havia pedido minha mão aos meus pais. Ela nunca me viu acompanhada com nenhum rapaz. Assim não tinha sentido eu estar naquele estado, na opinião dela.

Minha mãe me lançou um olhar de pavor, ao perceber o que eu tinha feito com a minha vida e da minha família. Ela continuava com a mão na minha barriga, então sentimos mexer. Isso assustou tanto ela como a mim, era a primeira vez que havia acontecido aquilo.

Foi inevitável, eu abri um sorriso, pois eu fui inundada por uma felicidade sem tamanho. Minha mãe estava pasma, não sei se pela minha reação de alegria ou pela minha gravidez. Acredito que possa ser até pelos dois motivos.

Sem esperar por nenhuma reação minha ela passou a mão no meu pulso e começou a me puxar em direção a sala de nossa casa, ao mesmo tempo ela gritava o nome de meu pai, exigindo sua presença. Quando ela contou ao meu pai sobre a “desgraça” que tinha se abatido na nossa família.

Suas veias começaram a saltar da pele mostrando a quantidade elevada de sangue que ali estava correndo, deixando seu rosto com um tom de vermelho quase roxeado.

Vi a raiva dele quase solidificar no ar.  Para me proteger do seu ódio comecei a fitar o chão, sabia que aquele volume de sentimentos rancorosos não faria bem nem para mim e muito menos para o bebê.

Como era esperado meu pai me questionou quem era o homem responsável por me seduzir, pois deveria assumir pelo o mal que havia me causado. Eles não sabiam que ele não me fizera mal algum, mas que tinha me dado o maior presente da minha vida, um novo significado para viver.

- Quem é o pai dessa criança, Sarah? – Dizia meu pai aos berros, enquanto minha mãe chorava inconsolável.

- Vocês não o conhecem – eu dizia calmamente- e além do mais ele não está mais na cidade, deve estar bem longe daqui.

Eles me olhavam com incredulidade. Na mente deles não é possível uma mulher jovem, ter um filho sem estar casada. Então pude olhar para meu pai, um homem moreno, alto e de ombros largos com afeições muito duras devido ao cotidiano militar.

Ele foi soldado durante a primeira grande guerra, quando retornou decidiu queria algum tipo paz, já que os fantasmas do passado sempre o a assombrava. Varias noites ouvia-se ele acordando aos berros, dizendo palavras usadas em combate.

Então, em busca de tranqüilidade, mudamos para uma cidade do Caribe, Jilas. As pessoas viviam suas vidas da mesma maneira por séculos.

-Como você pode fazer isso conosco, com sua família – gritava minha mãe. - Você é tão jovem tem somente 17 anos, já destruiu sua vida dessa maneira - Seus olhos negros me fitavam com tamanho horror, que fez meu coração começar a sangrar por magoá-la daquela forma. Mesmo achando a vida de minha mãe muito vazia, vendo nitidamente sua alienação diária pelo meu pai, eu a amava muito.

Ela colocou as mãos na boca para abafar os soluços que cortavam sua respiração. Ela me olhava como eu acabasse de cometer um crime imperdoável.

Não conseguia entender como eu estava tranqüila, olhava para mim procurando respostas para meus e seus erros, sim ela sabia que iriam acusá-la de ser péssima mãe.

-Nós vamos arrumar um pai para honrar o nosso nome – Os olhos esverdeados de meu pai encontraram os meus – Você não é como uma mulher qualquer. Sua mãe a criou para ser uma mulher digna. E isso que vamos fazer arrumar um marido, para dar dignidade a essa situação.

Nesse momento uma fúria surgiu em meu peito, como de um animal que acabou de ser atacado e ferido seriamente. Sabe pelo seu instinto de sobrevivência, que não pode ficar acuado, deve atacar para se defender, senão ele morre. Senti como esse bicho, eu estava sendo acuada eu deveria agir de alguma maneira.

Levantei e passei a mão em meu ventre, senti uma força dentro de mim que jamais pensei ser capaz de sentir. Então olhei bem no fundo dos olhos do meu pai.

-Não vou permitir que você me trate como um bicho abandonado que precisa de dono. Sei que posso ser uma vergonha para vocês dois, contudo é da minha vida que estamos falando. Não vou me casar com qualquer um só para ter algum tipo errôneo de dignidade. Não há nada de digno em casar sem amor. Não repetirei o erro de minha mãe.

Foi então que senti um tapa cortar minha face, com tamanho ódio que era quase tangível. Ao mesmo tempo ouvi o grito abafado de minha mãe ao ver aquela cena. Senti o sangue em minha boca, ao mesmo tempo me veio uma ira quase incontrolável.

Quando me virei, vi meu pai tremendo involuntariamente de raiva, quase em tipo de convulsão, seu rosto demonstrava um horror, o animal dentro dele também estava ferido.

Limpei o sangue no canto da boca com as costas da mão direita. Sustentei o olhar do meu pai e sai da vagarosamente da sala, indo em direção ao meu quarto. Peguei uma mala pequena e pus poucas mudas de roupas, pois sabia que a pouco não dariam mais em mim.

Sai do quarto com mala em punho, quando vi meu pai no canto da sala olhando pela janela a chuva que cai torrencialmente. Enquanto minha mãe soluçava freneticamente e quase se afogava em suas próprias lagrimas. Lançou-me um olhar de terror quando viu o que carregava na mão, ela sabia de imediato o significado desse ato. Assim correu ao meu encontro e chorou copiosamente entre os meus cabelos castanhos escuros.

Pus minha bagagem no chão, peguei-a pelos ombros e a afastei olhando para seu rosto. Comecei analisá-lo calmamente, havia rugas nos cantos dos olhos, elas tinham o significado de como a vida daquela mulher foi de sacrifício e omissão ao lado do meu pai. Talvez se elas tivessem voz, me diriam quanto era difícil toda sua vida.

As lagrimas caiam sem parar dos seus olhos, eram dois rios contínuos. Comecei a limpa-los com meu dedo indicador. Seu rosto era de suplica e desespero. Meus olhos marejaram ao encontrar aquele quadro de desolação de minha mãe.

-Mãe, não posso viver como você. Não conseguiria sobreviver nem um dia sequer. Sei que não parece racional esse amor que sinto por ela – coloquei gentilmente a mão em minha barriga – Não nasci para ficar pressa a ninguém que não seja a ela. Então desculpe-me por não ser merecedora de ser sua filha.

Abracei a lentamente, deixando que ela molhasse mais um pouco meus cabelos. E também me prendi a sentir seu cheiro, sabendo aquela seria provavelmente a ultima vez que a veria.

Dessa forma a olhei com os olhos, houve uma cumplicidade mutua, não éramos mais mãe filha. E sim duas mulheres fortes que admiravam uma a outra. Antes desse momento nunca houve anteriormente um momento tão próximo de nós duas.

Aquele seria um momento único, guardado dentro de mim. Vi no fundo dos olhos de minha mãe uma admiração silenciada, estava lá o seu orgulho pela minha coragem.

Enxuguei as minhas lágrimas e as dela, de forma bem gentil. Passei a mão em seus cabelos sedosos que caiam até os ombros, para limpar seu rosto dos fios que ficaram presos devido suas lagrimas. Abracei novamente, sabia que seria pela ultima vez. E sussurrei em seu ouvido.

- Vai ficar tudo bem. Não há motivo de preocupação. Eu estou muito feliz com a minha escolha- admiti. Ela piscou freneticamente para mim, como acabasse de levar um susto com as palavras que acabei de pronunciar.

Dei um beijo em sua testa, peguei minha mala do chão. Olhei minha mãe pela ultima vez, tentando guardar cada detalhe daquela imagem. Fechei os olhos memorizando tudo por um segundo e me virei para abrir a porta. Sai em meio a chuva grossa, e sem olhar para trás, sem ao menos ter mínima duvida da minha decisão.  

Comecei a andar rapidamente até a rua, havia poças e mais poças de água em meu caminho, minhas roupas já estavam encharcadas somente ao percorrer esse pequeno caminho. Elas estavam pesadas, ou eu sentia um peso a mais devido a minha escolha? Para onde eu iria? O que aconteceria agora?

Perguntas me invadiam de forma quase acusatórias. Contudo me sentia tão segura sobre minha escolha que não me permitiria enfraquecer em frente a essas palavras. Olhei para os lados, decidindo para onde eu iria. Não conseguia avistar nada, devido ao temporal incessante, minha mente também não estava apontando caminho nenhum. Respirei fundo, deixei meu coração me levar para qualquer lugar.

Enquanto andava pelas ruas de Jilas, sem rumo algum, pude sentir vários olhos me encarando através das janelas das casas. Senti uma pontada de pena de minha mãe, as historias e acusações que a fariam devido a minha decisão de sair de casa.

Podia ouvir em minha cabeça as pessoas falando: “sua filha fugiu solteira e grávida”. Estou ciente que essa idéia lhe causaria dor, sem duvida haveria um gosto amargo de impotência. Já que questionaria sua competência como mãe, aos olhos dos outros ela havia falhado.     

Abaixei a minha cabeça, talvez para tentar esconder meu rosto, minha mãe não merecia mais sofrimento em sua vida. Entretanto já havia tomado minha decisão, não havia possibilidade de voltar. Dessa maneira continuei meu caminho sem destino definido, ao longo do caminho pude refletir um pouco sobre a minha vida.

Deixei minha mente vagar, não prestando atenção em que direção seguir, meus pés moviam involuntariamente. Sabia que tinha que andar para bem longe dali, e assim o fiz. Minhas pernas moviam-se e minha mente viajava ao longo dos meus pensamentos.            

Sempre soube que minha vida não seria como as demais mulheres de Jilas. Eram criadas desde mais tenra idade, para serem perfeitas mães e esposas. O seu papel na família era como de um serviçal sem direito a nenhum tipo de recompensa. Viviam somente para servir aos caprichos de seu marido e filhos, não podiam esperar nenhum tipo de carinho em troca.

Trabalhavam para manter o perfeito funcionamento da casa, que sempre devia estar muito bem limpa e decorada. Os horários de refeição deveriam ser obedecidos de acordo com desejos dos maridos, elas deviam cozinhar o que eles gostavam. Em nenhum momento havia preocupação de que essas mulheres deviam ser amadas e desejadas.

Alias uma mulher não poderia chamar atenção para sua beleza, esse tipo de vaidade era visto como um comportamento desviante. Devia preocupar-se somente com sua família, mesmo que houvesse sacrifícios pessoais.

Os homens controlavam todas as decisões sobre o grupo familiar, principalmente em respeito a suas esposas e filhas. Eles eram os únicos que “sabiam” o que eu seria melhor para destino das mulheres. Os sentimentos sempre ficavam em segundo plano quando unia se um casal. Outros interesses eram priorizados, principalmente os financeiros.

Não era permitido sonhar em ter outro destino que não fosse do matrimonio e da constituição de uma família. Se ela fugisse a regra seria vista como uma aberração. Era condenada e rechaçada, não podia viver entre as famílias de Jilas, pois não era digna. Constantemente chamada de mulher da vida, pois havia escolhido o caminho “errado”.  

Então não conseguia me ver como essas mulheres que haviam escolhido caminho “certo”. Não podia conceber uma vida para mim onde teria como única função servir como uma escrava a um homem.

E viver essa escravidão até que a morte me encontrasse. A mim essa idéia parecia muito distante, nunca compartilhei dessa maneira de viver. Entretanto não sabia o que esperar da minha vida, afinal será que havia outro tipo de pensar?    

Assim sempre deixei a vida passar por mim, trazendo as supressas ao longo do seu passar. Levei-me pelas emoções que tocavam ao meu caminhar, sendo sempre fiel aos meus sentimentos, atitude não muito comum entre as mulheres. Privavam-se o tempo todo dos seus sonhos e desejos, em busca de um ideal previsto pelos homens. 

Como fosse de esperar o amor me encontrou de frente de forma inevitável. Vivi esse amor de forma intensa e louca, como todo amor deve ser vivenciado. Como não houvesse tempo suficiente para viver aquele sentimento na sua totalidade.

Soube desde inicio que ele não seria o meu marido, nem queria ele nesse papel. Sempre vi os homens transformando em donos de suas esposas, como se elas não tivessem mais vontade própria, vivam por e para eles. Não queria aquela escravidão para mim.

De repente meus devaneios íntimos foram interrompidos pela aproximação de uma mulher. Andava de forma firme e decisiva, uma maneira incomum para uma senhora, devia estar marchando. Chegou bem perto de mim, colocou uma capa, similar com a que estava usando, pegou-me pelos cotovelos e me girou de forma que ficasse ao seu lado.

Passou uma das mãos pelo meu ombro e a outra pegou a mala de minha mão. Começamos andar em direção a uma casa. A olhei incrédula, como ela poderia querer ficar perto de mim? Será que ela não tinha visto o estado em que me encontrava? Essa mulher queria alguma coisa comigo? 

Andamos em meio a chuva, as gotas pareciam bolas de gudes, caiam sem parar, formando poças e mais poças ao caminho de uma casa. Como vaguei a alheia em meus pensamentos anteriormente, não via onde estava indo. Foi quando percebi que estava próxima a praia de Sula, era uma das mais isoladas, onde havia pouquíssimas casas.

Não conseguia olhar para o lado, a chuva cobria qualquer tentativa de descobrir quem estava ao meu lado, só sabia que era uma mulher porque tinha visto a barra de seu vestido.

Foi então que as perguntas inundaram minha mente, cada vez mais inquietas, mas havia uma que não parava de girar. Por que essa mulher esta ajudando uma desconhecida grávida?

No segundo seguinte parecia que obtivera algum tipo de resposta. Meu instinto materno pareceu gritar em plenos pulmões: ela queria minha filha.

Parei de andar de imediato, coloquei a mão na minha barriga de forma protetora e a lancei um olhar furioso. Sentia-me como uma Leoa defendendo seu filhote, se ela me atacasse ou a minha filha, seria capaz de matar aquela estranha. Não haveria remorso para isso, pois essa era minha criança, nada e ninguém poderiam tirá-la de mim.

Seu passo parou um segundo depois de mim, virou e me olhou de forma incompreensível. No primeiro momento pensei que ela estava com raiva, depois analisando um pouco mais atentamente, vi uma sombra de um sorriso em seu rosto, principalmente quando ela viu minha mão protegendo o meu ventre.

Ela se aproximou de mim de uma forma bem gentil, sem fazer nenhum movimento brusco, olhando em meus olhos, pegou a minha mão que repousavam em minha barriga.

- Não tenha medo. Não vou ferir você e nem suas meninas. Eu estava esperando por vocês, para poder ajudá-las - Seus olhos eram lilás claros, pude ver bem nitidamente devido aproximação com os meus.

Fiquei paralisada e desarmada. Parecia que aquela estranha mulher sabia mais da minha vida, do que eu mesma. Como era possível isso? As perguntas que estavam explodindo na minha cabeça calaram-se, ficaram tão supressas quanto eu com a resposta daquela estranha.

A olhei com perplexidade, não sabia o que fazer ou dizer. Ela deu uma risada baixa, pegou novamente meu ombro e voltamos a andar.

- Podemos continuar andando? – Perguntou de forma bastante gentil.- Suas roupas estão encharcadas, deve estar com frio.

Somente assenti com a cabeça. Realmente o frio começava me atacar, fazendo meu corpo ter espasmos musculares, pareciam protestar a respeito aquela roupa ensopada colada em meu corpo.

Era muito estranho como aquela mulher parecia olhar dentro da minha alma, seus olhos lilás pareciam me conhecer por completo. Não havia segredos entre nós. Continuamos a andar em meio a tempestade sem fim.

Vi uma casa ao longe, as paredes eram brancas e com janelas de madeira escura. Atravessamos um jardim, que parecia ser bem cuidado, não conseguia julgar perfeitamente por causa da chuva, que embaçava bastante a minha visão.

Ao chegar à varanda da casa, ouvi uma voz de criança. Tinha impressão de ser um grito de felicidade. Fiquei feliz e ao mesmo tempo surpresa. Foi quando a misteriosa mulher passou a minha frente e estava abrindo a porta. Eu fiquei paralisada na porta, aquilo tudo era inacreditável.

Vislumbrei a sala, muito bem iluminada, havia duas poltronas beges colocadas lado a lado, tinha uma linda e simples mesa de centro, onde estava repleta de brinquedos e fraldas, abaixo dessa mesinha havia um tapete de palha, de um tom bege claro. No outro canto da sala havia uma mesa enorme com pilhas de roupas de crianças.

Fiquei encantada com arrumação e a limpeza. Sem duvida era um lugar aconchegante, fui imediatamente seduzida pelo clima de paz, que esse ambiente me transmitia. Entrei vagarosamente na casa, olhando cada detalhe. Quando passei o ultimo pé pela soleira só ouvi o bater da porta se fechando, atrás de mim. O susto me fez virar imediatamente, então vi uma menininha morena. Ela tinha os olhos negros como à noite, mas muito brilhantes, que combinavam perfeitamente com seu cabelo liso e preto. Percebi que foi ela quem fechou a porta.

Ela abriu um sorriso encantador ao encontrar meus olhos, parecia que conhecia aquela pequena de apenas dois anos de idade. De certa forma sentia que ela me pertencia de alguma maneira estranha. Ela olhou para mim sorrindo, esticou os braços, pedindo que eu a pegasse no colo. Retribui o sorriso e atendi seu pedido. Quando a ela se ajeitou em meu colo, passou os bracinhos pelo meu pescoço e me deu um beijo.

- Bem vinda ao lar. – olhando bem fundo nos meus olhos. Senti realmente que tinha retornado ao um lugar que nunca deveria ter saído. Fui inundada por um mar de emoção e sentimento. Aquela pequena criança me fez ver que tinha escolhido o caminho certo, mesmo sem saber qual era. Senti meus olhos afogarem em lagrimas.

- May, a deixe terminar de entrar e de nos conhecer direito- disse a mulher misteriosa de forma bastante afetuosa- teremos muito tempo para conversar e conviver. Você não deveria estar dormindo mocinha?

Não havia percebido a presença da mulher ao meu lado, até o momento que ela tentou pegar a May de meu colo. Contudo a menina não quis sair, apertou os braços em volta do meu pescoço, me surpreendi a força desse abraço, ela aparentava ter um ano de idade, mas a força era equivalente a uma criança de oito anos.

- Diga-me aonde que ela dorme, eu mesmo a coloco na cama. – pedi a mulher sem ao menos um minuto tirar os olhos de May- Vamos dormir?

Ela saiu do esconderijo dos meus cabelos, me deu um largo e sincero sorriso. Voltou a conchegar em meio aos meus cachos, suspirou profundamente e se entregou aos sonhos. A mulher misteriosa assentiu de bom grado. E conduziu-me até um quarto verde, onde havia cinco berços, três de um lado e dois do outro.

Havia também duas camas de solteiro ao final do quarto. E uma mesa alta no meio do quarto onde havia uma pilha de fraldas de pano. Tudo muito bem arrumado e organizado. O cheiro de bebê era inebriante, era aconchegante e caloroso aquele quarto, parecia estar repleto de amor e cuidado.


Coloquei May no primeiro berço, estava vago e ela já dormia tranquilamente em meus braços. Havia uma paz enorme naquele cômodo, como nada de ruim pudesse acontecer ali, senti um conforte e paz. Tudo parecia estranhamente familiar e esperado. Caminhei ao longo do aposento, tocando tudo que podia com as pontas dos dedos, avaliando se tudo aquilo era real.

Quando me virei para analisar o os outros dois berços que estavam ao lado de May, notei que havia mais duas crianças. No primeiro havia uma menina de cabelo castanho escuro, com leves tons de avermelhado entre as mechas, a cor de sua pele era um tom moreno claro, uma boca bem carnuda e bochechas bem rosadas.

Passei vagarosamente os dedos em seu rosto, ela não acordou, mas mexeu como agradecida pelo carinho. Ela devia ter um ano e alguns meses de idade. Ao sair vi que tinha uma placa com um G em cima do seu berço.

Ao virar para o outro berço vi outra menina, essa tinha o cabelo liso e dourado como sol, era branca, mas não em um aspecto doente, nunca tinha visto alguém daquela cor. Olhei para placa e vi que seu nome era Nina. Parecia ter a mesma idade da May. Comecei acariciá-la no rosto e fui descendo pelo seu braço direito, admirada pela cor da sua pele. 

Quando passei os dedos sobre sua mão, ela pegou o meu dedo delicadamente, ainda dormindo sussurrou algo incompreensível. Parecia queria me dizer algo muito importante e urgente. Eu ri sozinha do seu gesto, ela não queria soltar o meu dedo.

- Amanhã nos conheceremos melhor, estarei aqui para ficar com você. – Disse lentamente, sussurrando mais baixo possível. Foi nesse momento que ela deu um sorriso e me libertou.

Precisei de um minuto para absorver tudo que havia acontecido nesse quarto. Muitas emoções estavam presentes dentro de mim, maioria delas nunca eu tinha sentindo anteriormente.

Como poderia ter me ligado a essas três meninas tão rapidamente? Elas pareciam que me aguardavam. Eu também estava reencontrando com elas, sentia que elas eram minhas filhas.

Lembrei da frase da mulher misteriosa a caminho da casa.  Não vou ferir você e nem suas meninas. Será que ela se referia as meninas do quarto ou que eu estava esperando mais de uma criança? Sempre soube que daria a luz a uma menina, desde começo senti, eu tinha essa certeza muito clara dentro de mim.  

As perguntas que estavam em minha mente antes de eu entrar naquela casa, voltaram a rodar de rapidamente, como um espiral, eram tantas e estavam completamente inquietas dentro de mim. Senti-me tonta, cambaleei um pouco, quando estava quase encontro ao chão, senti uma mão me segurando.

-Você precisa se alimentar. Quanto tempo está sem comer? – Disse a mulher misteriosa me levando para a cozinha.

- Não sei – murmurei pensando sobre ultima refeição. Aconteceu tanta coisa que parecia que havia se passado anos. Era como fosse outra era, como uma vida passada.

- Você esta com fome, posso ouvir seu estômago – Disse de forma humorada – Espero que goste da comida. 

Sentei-me à mesa de madeira e olhei a minha volta, a cozinha era bem ampla. Olhei para o fogão de lenha, vi uma panela alta, o cheiro que vinha dela parecia de uma sopa deliciosa. Meu estômago fez mais um barulho alto, que pode ser ouvido até do lado de fora da casa.

Quem estava dentro de mim também estava protestando a sua fome. Então a mulher pos um prato de sopa na minha frente.

- Bom Apetite. Se quiser tem mais sopa na panela, pode pegar o quanto quiser. – Ela se sentou ao meu lado com seu prato a sua frente.

- Obrigada pela sua gentileza.

Foi a primeira vez que olhei aquela mulher de forma detalhada. Ela aparentava ter uns quarenta anos, cabelo negro longo, presos numa trança embutida, pele morena clara, do mesmo tom da pele de Mary.

Seus olhos eram lilás, como eu tinha visto lá fora. Era alta e esguia, havia uma elegância nela do tipo que lia em livros sobre realeza. Ela me deixou analisá-la sem parecer desconfortável com a minha atitude. Foi quando olhei para os seus olhos gentis.

- Você deve ter várias perguntas. Meu nome é Lisa e sei que seu nome é Sarah, você terá duas meninas- Ela parou e avaliou a minha reação antes de continuar- Teremos bastante tempo para responder qualquer pergunta que você tiver. Mas antes de tudo quero que saiba, você tem a opção de ir embora hora quiser. O destino tem um esboço para todos nós, contudo nós que decidimos se aceitamos o plano original ou escrevemos outro. Enfim espero que possa confiar em mim, como já confio em você. Agora você pode perguntar o que você quiser.

Ouvi tudo com muita atenção, não queria perder nenhum detalhe do que Lisa falava. A segurança com o que ela falou me tocou profundamente. Estranhamente sempre senti que o destino tinha planejado algo a mais para mim. Algo realmente surpreendente.

Não que eu fosse um ser especial, mas estava preparada para participar de algo único. Acho que encontrei aonde realizarei essa tarefa, mesmo que ela não esteja ainda clara para mim.

- Não quero outro plano, parece que o destino já traçou o meu mapa, e sinceramente me agrada e muito esse original. Não sei o que vai acontecer, só não sinto medo e sim uma certeza imensa de que achei finalmente o meu lugar.

- Ótimo. Sempre estaremos juntas- Disse pegando minha mão e sorriu.- Esperando o tempo necessário pela nossa outra filha.

Não consegui compreender a sua última frase, mas não queria mais pensar em nada, somente comer aquela deliciosa refeição. Ficar preparada para uma jornada incrível que minha vida estava começando traçar à minha frente.

Meu coração transbordou um pouco mais de amor, eu teria outra filha. Não sei quando e como ela surgirá no meu caminho, contudo esperarei a cada dia pacientemente. Guardando todo meu amor para o dia que ela chegar.

Comemos e conversamos durante toda a madrugada. Nunca havia me sentindo tão feliz em toda minha vida. Aquele era o meu lugar, ali estava minha verdadeira família.
          

 
      


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Notas finais do capítulo

Amanha teremos finalmente Clair ok??? medo.. será q vcs vão gostar... medinho...