Haunteds escrita por LadySpohr


Capítulo 3
Tijolo Por Tijolo




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Well make sure to build your home brick by boring brick. (Or the wolves

gonna blow it down)

Bem, garanta a construção da sua casa tijolo por tedioso tijolo. (Ou o

lobo vai botá-la abaixo com um sopro)

  • O que está         havendo, Cristian? Quem é que está gritando desse jeito? - eu         ouvia uma voz de garota furiosa, vindo de alguma parte daquela casa         enorme, e levei um susto tão grande que até derrubei o balde de         pipocas em meu colo.

Cristian deu um sorriso divertido.

  • Minha irmã, ela         sempre tem esses ataques quando algo que planeja não dá certo –         ele riu, seus olhos azuis brilhando como safiras – Sabe, ela é,         como diríamos... - ele coçou o queixo enquanto estendia uma caixa         com trufas pra mim com a outra mão -... controladora.

Eu arregalei os olhos.

  • Alguém deve ter a         chateado muito.

  • Ela logo se acalma         – Cristian abanou a mão, e voltou a vista novamente para a tela         gigante à nossa frente no quarto dele. Estávamos sentados em um         monte de almofadas no chão, que por sua vez estavam por cima de um         tapete grosso de lã, agora salpicado com latas de refrigerante,         embalagens de salgadinho e bolacha, e bem no centro, a caixa grande         de papelão, onde alguns pedaços remanesciam do que fora uma         incrível pizza de mussarela.

Eu observei o perfil do meu melhor amigo. Ele tinha traços suaves, mas marcantes, especialmente o queixo, que era bem obstinado, e as sobrancelhas. Mas tudo ficava em harmonia com seus lindos olhos claros e quando ele sorria, com todo aquele metal do aparelho. Seus cabelos eram de um tom de castanho, que tinha um brilho acobreado no sol. Enfim, eu tinha um amigo bonito, e de um coração enorme. Não conseguia pensar como ele era tão adorável de personalidade com um pai frio e autoritário, e uma irmã aparentemente um tanto neurótica.

Me lembrei do meu primeiro dia de escola nova...

Eu estava quase vomitando meu café-da-manhã ao me ver sozinha naqueles corredores compridos, sem conhecer absolutamente ninguém. Nunca me senti tão deslocada. Sim, eu tinha lutado com unhas e dentes por aquela bolsa, porque aquela escola era a melhor, e era assim que meus pais gostariam que tivesse sido. E meu irmão não era diferente. Felipe sempre tinha uma fé inabalável em mim, o que em vez de me acalmar, me deixava ainda mais histérica. Eu sabia que ele não estava me cobrando nada, mas eu não gostaria de decepcioná-lo. Felipe era a única coisa que me restava, era meu pai e minha mãe agora, já que os nossos haviam ido pra um lugar melhor. Ou pelo menos era isso que esperava. Quando me encaminhei pra minha sala, esperava que não houvesse ninguém lá dentro, e minhas preces foram atendidas. Procurei um lugar no fundo, mas me detive no caminho, pensando se não seria melhor me acomodar perto do professor ou professora, talvez fosse mais seguro... Mas e se ele ou ela fosse um verdadeiro escroto tirano? Eu não iria querer ficar perto e...

  •  
    • Te aconselho a         ficar pelo meio, ou perto das janelas, que é onde sentamos – uma         voz agradável e masculina me fez girar.

Me deparei tanto com um garoto alto de cabelos castanho-avermelhado me encarando amigavelmente, assim como uma garota um pouco mais alta que eu, com um rabo de cavalo loiro e olhos castanhos que reluziam muito pra uma manhã de segunda.

  •  
    • Ah, sim – olhei         ao redor como uma idiota – Pelo meio.

    • Tem uma carteira         vaga atrás de mim – disse a garota loura, sorrindo – Meu nome         é Antoniela, mas todo mundo me chama de Nela, não me pergunte         porquê – ele virou os olhos, e eu sorri com aquele gesto.

    • Eu sou Cristian,         ou Cris, como preferir – se apresentou o garoto – E tem um         lugar vago do meu lado também.

Não entendi porque, mas eu soube, naquele instante, que não ficaria sozinha.

E em vez de ocupar o lugar ao lado do Cris ou atrás de Nela, eu acabei sendo colocada entre os dois, num pular de carteiras ágil de Nela.

Claro, nem todos foram tão receptivos quanto os dois. E teve gente que realmente não foi com minha cara. Mas depois de duas semanas, eu já estava me sentindo confortável e sabendo quase tudo da vida de meus dois novos amigos.

Cristian Bonfleur: era filho de um empresário muito rico, cujo nome eu já vira em revistas, tinha o hábito de revisar seus textos mil vezes, era muito inteligente, lia pra caramba, tinha um sorriso quente e lindo, adorava guaraná e tinha uma sensatez e educação que jamais vi em outra pessoa. Raramente falava sobre sua família, e quanto o assunto vinha à baila, ele se esquivava.

Antoniela Silva e Sanchez: levei um susto quando ela disse seu sobrenome, ela era integrante de uma das famílias mais importantes da cidade, e claro, cheia da grana, tinha uma personalidade super exuberante, sem medo de falar o que pensava, e conseguia achar algo pra rir em qualquer situação, incluindo quando derrubou café em seus tênis Dior, declarando que ele tinha ficado bem mais fashion manchado do que na cor original. Era muito comunicativa e por vezes eu e Cris tínhamos que freia-la na tagarelice. Mas o mais especial em Nela era sua total falta de egoísmo. Em duas semanas ela me dera dois moletons sem motivo algum, e dois sapatos de salto altos, que quando pesquisei o preço quase caí pra trás.

  •  
    • Meu Deus, eu tenho         que devolver pra ela, Cristian, essas coisas são caras demais! –         murmurei, enquanto esperávamos ela pagar o lanche dela na cantina.

    • Não faça isso –         ele arregalou os olhos numa expressão alarmada – Ela vai ficar         um mês sem falar com você!

    • Mas... -         recomecei.

Ele ergueu a mão.

  •  
    • Não – Cristian         suspirou – Olha, Nela é esse tipo de pessoa, que não espera         nada em troca quando dá algo pra uma pessoa, ela simplesmente         gosta de dar presentes, se sente bem fazendo isso. E costuma fazer         isso comigo também – ele sorriu – Uma vez eu achei um clipe da         Mont Blanc muito elegante na loja, que custava cinquenta reais, mas         não achei que valesse a pena levá-lo porque eu sou rico, mas         tenho bom senso – Cris abanou a cabeça, relembrando do caso com         diversão – E Nela estava junto comigo. No dia seguinte ela me         deu o maldito clipe de presente. Ela só...é assim.

Mordi o lábio, indecisa, observando minha amiga juntar a bolsa de uma garota que a tinha derrubado.

  •  
    • Cris... pessoas         assim não existem. Todo mundo espera algo em troca – comentei,         enquanto a garota da bolsa sorria e agradecia Nela, que equilibrava         a pilha habitual de empadinha, água mineral e barra de cereal.

Cristian virou o rosto para Nela.

  •  
    • Eu pensava o         mesmo, até eu conhecê-la, dois anos atrás. Ainda existe gente         generosa por natureza, Nanda. E uma dessas pessoas é a Nela.

Naquele momento ela chegou, jogando a garrafa de água em mim, que quase a derrubei, e enfiou o salgadinho no Cris, que já acostumado com esse tipo de entrada, se deu melhor que eu, dando uma risadinha pra mim. Estreitei os olhos.

  •  
    • Comprei o meu e …         - Nela vasculhava os bolsos da jaqueta do uniforme - ...Aha!         Trident pro meu amigo de aparelhos! - ela sorriu e estendeu o         pacotinho pra Cristian – E, Confete pra minha amiga gata e sem         aparelhos! Agora vamos arrumar um canto pra comer.

Eu me entreolhei com Cristian. E ele sorriu docemente, como se disesse “eu disse que ela é uma dessas pessoas”. E ela era.

E assim tinham se passado dois meses. Dois meses nos quais fiz inúmeras visitas à casa de Nela, na qual fui muito bem recebida e tratada, em todas as vezes. Os pais dela eram pessoas muito simpáticas e acolhedoras, do tipo que apesar de ocupados, não esqueciam da família. E tinha o irmão mais velho de Nela, Plínio, que eu só vira uma vez em casa, porque ele estudava Medicina, e portanto nunca tinha muito tempo, de acordo com Nela. Mas ele tinha sido tão querido quanto sua irmã naquela unica vez, me cumprimentando amavelmente e declarando que “a casa é sua!”. Havia muitas fotos e de Nela pelos móveis. Eles só tinham o sexo e a cor de cabelo realmente pra diferenciá-los: Nela era loira, e seu irmão tinha os cabelos escuros. De resto, eles eram muito parecidos. Logicamente favorecidos pela genética, ou seja, lindos. Como os pais, nas fotos em que apareciam na juventude. Já a casa de Cris foi estranho. Raramente tinha alguém da família lá, apenas os empregados, num lugar imenso e silecioso, exceto por uma linda labradora chamada Dora, que pertencia ao Cris, e um gato preto gordo e que me dava arrepios, que Cristian esclarecera, rindo, que era o bicho de estimação de sua irmã mais velha. Eu nunca a vira. Tinha retratos pela casa, mas como aquele lugar não parecia aspirar visitas, eu não prestei muita atenção. Ficava com medo de esbarrar até nas paredes, tal era seu luxo. Não era como a casa de Nela, uma construção antiga, com um chão de madeira polida e com um certo desleixo de seus moradores, como livros em cima de móveis, bilhetinhos de bom dia grudados na geladeira, ou uma aglomeração de copos esquecidos na pia, e até mesmo cobertores e xícaras vazias de chá pela sala. A casa de Cristian era rigidamente organizada, sem nada fora do lugar, ou um grão de poeira. Aquilo me dava medo.

Não havia calor naquele emaranhado de quartos e corredores. Mesmo assim eu dormia lá, porque era o Cristian que me pedia. E eu o amava, assim como Nela. Eles eram o que chamamos de irmãos de alma.

Fui tirada das minhas lembranças quando a porta do quarto se abriu num repelão, e uma garota apareceu ali, seguida daquele gato assustador.

  •  
    • Ah, desculpe,         Cris, não sabia que tinha companhia – ela disse, então me         encarou uma segunda vez, piscando.

    • Essa é a … -         começou Cristian, tranquilamente.

    • Fernanda, eu sei –         Laura disse, sem mudar a expressão – O irmão dela estuda comigo         – e então se moveu, sentando do outro lado de Cris, que sequer         se moveu. Ela apanhou um punhado de pipocas do balde dele e me         encarou. Meu coração acelerou diante de tanta raiva dentro         daqueles olhos esverdeados, mas não fazia sentido, o que eu tinha         feito pra ela? - Seus olhos são parecidos com os de seu irmão.

Ah. Eu sabia. Ela desviou a vista, e mirou a televisão. Alguma coisa havia acontecido entre ela e meu irmão naquela sala, e claro, aquela alusão aos olhos do meu irmão tinha me dado o alerta.

Mas o que o Felipe poderia ter feito à Laura????

***

Os alunos estavam reunidos, duas semanas depois da recusa de Felipe à Laura, no salão de reuniões da universidade, era um espaço amplo e limpo, com toda a estrutura de uma instituição de alta linha e renome. Dali alguns minutos seria decidido o futuro do Conselho Estudantil, com a candidatura do oponente de Laura. Ela e Felipe não se falaram desde o primeiro diálogo, mas se econtravam ocasionalmente em algumas festas dos alunos.

Laura o observou conversando com Amanda a algumas cadeiras de distância. Hummm, eles pareciam muito próximos, será que estavam juntos?

Amanda sentiu-se observada, sabia que era por Laura e sorriu pra Felipe em meio à conversa.

Laura mal sabia o que lhe aguardava, daqui alguns momentos ela pagaria por tê-la tomado a chance de ser a líder do Conselho. Ela só tinha aceitado o cargo que tinha por saber que Laura tinha força demais pra ser combatida sozinha, mas agora...haveria um novo campeão, e estava sentada ao lado dele.

Embora não tivesse sido fácil convencê-lo, pouco a pouco ele acabou comprando a ideia, mesmo que não soubesse o quanto significaria pra ela ver Laura derrotada. Ainda que fosse só ela a desgostosa, mas não era, muita gente ali achava que ela já estava a tempo demais no comando, e que era hora de outras pessoas terem a chance de comandar.

É Laura, sua era acabou”, pensou Amanda, quando o reitor começou a anunciar.


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