Saga Sillentya: Lágrimas da Alma escrita por Sunshine girl


Capítulo 19
XVIII - Cobranças


Notas iniciais do capítulo

E enfim eu retorno, trazendo o último capítulo do ano de 2010!

Pois é, minhas recomendações ainda não voltaram... Alguém viu elas por aí?

Mas mudando de pato para ganso, capítulo cheio de revelações e uma surpresa no final!

Boa leitura!



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Capítulo XVIII – Cobranças

“E eu sei que lá eu vou cometer erros no que eu fizer,

Mas eu sei que nada é pior do que as chances que eu não agarrar, agarrar”.

“Bem diante dos seus olhos eu estou mudando,

Mudando

Você riu internamente, eu estou mudando,

Mudando”.

(Hoobastank – Right Before Your Eyes)

Meus olhos permaneceram arregalados, a surpresa ainda era evidente em meu rosto. Mesmo assim, nos olhos dele, não havia qualquer sinal de vacilo ou enganação.

Christian estava dizendo-me a verdade e simplesmente a verdade.

- O que você... disse? – eu tinha que confirmar, precisava ouvir suas palavras mais uma vez, mesmo que elas só atenuassem toda a minha confusão e todo aquele alvoroço de sentimentos dentro de mim.

Ele inspirou novamente, parecia descrente do fato de que eu não as tivesse ouvido da primeira vez, mas mesmo assim, ele tornou a repeti-las, completamente convicto em cada palavra que era proferida por seus lábios.

- Eu te amo, Agatha. E quero que fique comigo.

- Mas... Você disse ainda hoje que não tinha certeza de seus sentimentos por mim.

Ele revirou os olhos azuis, como se eu estivesse deixando algo óbvio escapar, mas se tinha algo que eu havia aprendido é que Christian é uma pessoa imprevisível.

- Agatha, você realmente acha que poderia permanecer alguma incerteza em relação aos meus sentimentos por você depois de tudo isso?

Eu corei instantaneamente ao lembrar da intensidade de seus beijos.

Desviei o olhar, constrangida e ele recuou, deixando meu corpo e sentando-se no sofá, a cabeça entre as mãos, os cotovelos apoiados nos joelhos. Novamente eu tinha sensação de que ele remoia algo doloroso em sua mente.

Esgueirei-me, sentando-me no sofá ao seu lado, arrumei minha blusa, ajeitando a bainha e a manga que deixava meu ombro completamente desnudo, fazendo-me enrubescer mais uma vez.

Toquei, um pouco receosa, seu ombro, mas ele nem mesmo elevou o seu olhar até o meu, e apenas permaneceu com os olhos fixos no chão. Engoli em seco, eu sabia que não deveria tocar naquela sua ferida mais uma vez, mas era uma necessidade para mim, naquele momento, descobrir o que de fato houve entre Christian e Aidan.

- Por que não me conta tudo o que houve? – sussurrei, tentando não lhe causar sobressalto novamente.

Christian suspirou e eu imaginei que ele ia levantar-se dali, fugir do assunto e sair correndo pela porta da frente, mas para a minha surpresa, ele elevou sua face, fitando-me nos olhos, e naquele instante eu vi, a dor, a fúria, a sede pela vingança; então soube que ele havia tomado sua decisão.

- Você quer realmente saber por que eu o odeio tanto?

Assenti silenciosamente e o olhar de Christian vagou pela sala, parecendo perder-se no tempo, em lembranças amargas, em um passado triste, marcado pela dor e pelo sofrimento, mas principalmente, marcado por suas lágrimas.

- Eu sempre me perguntei o que Aidan tinha visto na guerra que pudesse tê-lo deixado daquela forma.

- O que você quer dizer? – perguntei-lhe, confusa.

- Eu era apenas um menino com meses de vida, jamais poderia lembrar-me do que houve exatamente naquela noite, mas seja o que for que tenha acontecido, Aidan viu, e isso o marcou... para sempre.

“Era o ano de 1863, a guerra civil estava no seu auge, havia sangue e carnificina por onde quer que se olhasse, e não demorou muito para que ela batesse a nossa porta”.

“Meu pai era um fazendeiro escravista, era rico, na verdade, Joseph Willis McGonagall era um dos homens mais ricos e influentes da Virginia, de qualquer forma, e além de tudo, era coronel e liderara uma infantaria contra os soldados da União. Ele estava longe de casa naquela noite, aliás, aposto até que já tinha morrido naquele campo de batalha nojento. Eu não me lembro do que houve, acho que nem mesmo poderia, mas pelo pouco que minha mãe ousou contar-me, eles vieram do nada, como pragas descendo pelas colinas, através do vale eles cruzaram, e então, tudo começou a pegar fogo. Era o próprio inferno, ela dissera para mim”.

- Por isso que você disse que seu sobrenome era McGonagall, é seu sobrenome de batismo.

- Christian Elliot McGonagall, sim, esse é o meu nome de batismo, e meu irmão, Aidan August McGonagall. Mas, obviamente, que quando fomos adotados por aquele crápula, ele mudou nossos sobrenomes, deu-nos novas identidades, transformou-nos em cidadãos italianos. Mas, como eu estava dizendo anteriormente...

- Ah, claro! – assenti, recordando-me de que o havia interrompido.

Os olhos azuis estreitaram-se, e a cena projetara-se involuntariamente em minha mente.

- Minha mãe, Vivien McGonagall, não teve tempo para salvar mais absolutamente nada, pegou a mim e ao meu irmão mais velho, quando o incêndio na fazenda começou, nós dormíamos tranqüilamente em nossos aposentos e nem mesmo sonhávamos que algo desse tipo pudesse cair sobre as nossas cabeças, não da forma como caiu, mas assim é a guerra, ela não poupa nada, apenas destrói tudo o que estiver em seu caminho. E então, com as roupas do corpo e mais nada, nós fugimos de nossa fazenda, enquanto ela ardia e queimava sob as chamas devastadoras do fogo.

“E... Aidan viu algo naquela noite, algo que o deixou sombrio, fez uma coisa maligna aflorar dentro dele, ele jamais superou o que houve naquela noite”.

- Aidan viu... algo?

Christian sacudiu a cabeça, como se tentasse desfazer o quadro que havia formado em sua mente, até mesmo eu podia imaginá-lo: um casarão do século XIX em chamas, uma mulher apavorada, fugindo com seus bens mais preciosos: seus dois filhos; um garoto com pouco mais de três anos e um bebê de colo.

- Depois disso houve apenas mais tragédia; Ducian encontrou-nos, éramos refugiados, estávamos sujos, famintos e exaustos, minha mãe conseguiu levar a nós dois até o porto, onde ela pretendia pegar um barco e fugir para a América do Sul, ela não suportava mais ver os horrores da guerra.

“Mas não tínhamos mais nada, e se não fosse por aquele maldito italiano, nós jamais teríamos deixado o país”.

- Eu conheço essa história... – eu o interrompi, lembrando das exatas palavras de Aidan – Ducian ofereceu abrigo e suporte a vocês três, prometeu afastá-los da guerra, mas acho que só conseguiu envolvê-los em uma ainda mais catastrófica e violenta.

- Nisso você está certa. – murmurou Christian, estreitando seus olhos azuis – Ducian não manteve sua palavra, ele levou-nos para a Itália, e então, separou Aidan de minha mãe, levando-o até aquela sociedade de perdedores para treiná-lo e transformá-lo em uma máquina de matar.

“Quando eu alcancei a idade necessária, Ducian arrastou-me consigo para o seu mundo de mentiras. Eu já não via meu irmão há quase cinco anos, e Aidan estava... diferente. Havia algo nos olhos dele, algo que me fazia recuar, algo que me deixava apreensivo. Mas eu decidi confiar nele, afinal, ele era o meu irmão, ou pelo menos, era isso o que eu repetia para mim mesmo, e eu paguei o preço por ter feito essa escolha muitos anos depois”.

“E então, quando Aidan completou dezoito anos, alcançou a idade necessária, ele foi iniciado como um Mediador, Ducian era somente orgulho para com ele, o tratava como um verdadeiro filho, ou como um cachorrinho fiel, como você preferir. Quando Aidan adquiriu os poderes e as habilidades que tornam um Mediador uma criatura tão temida, ele perdeu-se de vez, Ducian havia transformado meu irmão em um monstro assassino, e foram anos atribulados e difíceis para mim e para minha mãe”.

“Eu podia senti-lo afastando-se cada vez mais de sua humanidade, Aidan caminhava em uma estrada perigosa e sombria, as trevas dominavam seu coração, e até mesmo eu me perguntava se algum dia, eu teria o meu irmão de volta, mas...”.

- O que houve?

Christian inspirou profundamente, buscando forças para remexer naquela sua velha e dolorosa ferida e enfim prosseguiu.

- Três anos depois, eu juntei-me a ele, passei pelo ritual de iniciação e tornei-me um Mediador, assim como ele. Não demorou muito para que todos tomassem conhecimento de nossos feitos, nenhum Mediador resistia perante nós dois, nós éramos imbatíveis, invencíveis, e logo ganhamos o apelido de “Irmãos Satoya”, nós caçávamos desertores, nós os destruíamos – Christian cerrou os punhos e franziu o cenho – mas, aquilo nunca foi o suficiente para Aidan, derrotar nossos inimigos nunca o satisfez, não, ele não somente os humilhava, como também os aniquilava como se não fossem absolutamente nada, como se fossem insetos, e talvez para ele, de fato fossem.

“Ele ter se envolvido com aquela cobra desprezível só piorou as coisas...”.

- O que você disse? – eu perguntei, sentindo meu coração espremer-se contra meu peito e minha respiração tornar-se pesada e dificultosa.

Christian ergueu as sobrancelhas e pigarreou, ele sabia que havia iniciado um assunto que seria difícil para eu ter que ouvir, mas não importava, eu precisava saber. Ele suspirou, rendendo-se.

- Aidan envolveu-se com uma garota, uma Mediadora, mas para mim, ela é apenas uma cobra venenosa.

- Deixe-me adivinhar, o nome dela é Crystal Sherwood?

- Pelo visto, você já a conhece.

Cruzei os braços, profundamente irritada e bufei.

- Já ouvi falar dela, mas sei que ela não é flor que se cheire.

- Nisso você está certa, o fato é que Crystal não era exatamente um modelo de pureza e integridade, ela sempre demonstrou interesse pelo meu irmão, sempre se jogava para cima dele, e um dia... Ela conseguiu abocanhá-lo. – Christian encerrou seu discurso, rindo um pouco.

Ele notou meu aborrecimento repentino e tentou confortar-me de alguma forma.

- Ei, ela não é páreo para você, você dá de dez a zero naquela cobra peçonhenta.

- Apenas continue. – pedi-lhe, ainda irritada.

Ele pigarreou, forçando sua voz.

- Como eu estava dizendo, antes do seu ciúme despertar, o envolvimento de Aidan com ela só piorou as coisas, Crystal tinha o meu irmão na palma de sua mão, ela o manipulava com muita facilidade e Aidan deixava influenciar-se por ela. Resumindo: ela terminou de arrastá-lo para as trevas. Mas, eu jamais sequer suspeitei de que as coisas pudessem, de alguma forma, piorar ainda mais.

“Em uma noite fria na Itália, eu e Aidan fomos chamados para realizar um tipo diferente de missão”.

- Que tipo de missão?

- O tipo de missão realizada apenas pelos caçadores mais experientes de Sillentya. Mas, Ducian parecia convicto de que nós dois teríamos chance de sucesso e triunfo, se ele soubesse o quão enganado estava...

“Lembro-me perfeitamente dele chamar-nos até sua presença, e passar-nos as instruções detalhadamente. Nós deveríamos viajar até a França e encontrar... um tipo especial de alvo, uma criatura tão ou até mais poderosa do que nós dois. Obviamente que nós dois acatamos suas ordens e partimos imediatamente, mesmo sem saber muitas informações sobre o inimigo”.

“Quando nós o encontramos, em plena Paris, nos subúrbios da cidade luz, surpreendemo-nos então. O alvo não era um Mediador, não era uma criatura como nós, não, jamais poderia ser comparada a nós dois. O alvo era uma senhora de idade, idosa já, mas o que mais me surpreendeu não foi isso”.

- Então foi o quê?

Christian sorriu de canto, direcionando toda a intensidade de seu olhar para mim e então prosseguiu.

- A incrível habilidade daquela “jovem” dama de manipular os quatro elementos básicos da natureza. Isso mesmo, água, fogo, terra e ar. Ela era uma lutadora formidável, batalhava com graça e ferocidade no olhar. E nenhum de nós dois foi páreo para ela. E eu e Aidan fomos vergonhosamente derrotados. O que Ducian esqueceu de contar-nos, ou omitiu propositalmente é que aquela senhora era uma Elemental, uma poderosa Elemental, uma criatura tão gloriosa e tão letal. Madame Mabelle Champoudry, este era seu nome.

- E o que houve? Ela... feriu vocês?

Christian riu baixo mais uma vez e eu estranhei. Do que ele estava rindo?

- Muito longe disso, Mabelle deixou-nos em paz depois de nos dar uma boa surra, ela partiu, desaparecendo nas vielas escuras, apenas isso, mas depois daquele dia, eu soube que havia muito que Ducian não nos contara. Afinal, quem era aquela mulher? E como ela poderia portar tanto poder? Eu sabia que Ducian estava escondendo algo de nós dois, mas Aidan não enxergava isso, para ele, a mulher dominadora de elementos e os semelhantes a ela eram nossos inimigos de morte e precisavam ser todos extinguidos, ou pelo menos foi isso que Ducian plantou em sua mente.

“Quando voltamos para a Itália, Ducian contou-nos toda a história de rivalidade entre Mediadores e Elementais e contou-nos sobre Ephemera, a sua sociedade suprema. Ele tentou convencer-nos de que os Elementais eram ameaças a nossa segurança, a nossa paz, eram criaturas violentas e sanguinárias, sedentas pela vingança, por isso tiveram de ter seus poderes selados, mas havia falhas no selo, e que alguns deles faziam qualquer coisa para rompê-lo e livrar-se da maldição que nós mesmos lhe impomos. Portanto, eles deviam ser detidos a qualquer preço, custe o que custase, isso manteria a ordem e a paz para ambas as raças, mas eu jamais acreditei nisso. Depois daquele dia, ficou claro que Aidan escolhera seu lado, mas eu, eu sentia a necessidade de saber mais sobre essas criaturas místicas e poderosas, eu precisava conhecê-los mais”.

“E então, um dia, eu fui mandado em uma missão especial, sem meu irmão...”.

- E o que você foi ordenado a fazer?

O sorriso no rosto de Christian diminuiu e ele baixou os olhos até o carpete novamente, sua voz era distante e triste.

- Eu deveria ir até a cidade de Chicago, nos Estados Unidos, e espionar uma jovem atriz, uma jovem Elemental que ainda estava sujeita ao selo da Fênix e que estava despertando o interesse e a atenção do público. Caroline Monroe. Foi assim que eu a conheci.

“Por meses eu a vigiei, eu a assisti, sempre escondendo minha presença, sempre me ocultando, pelo menos até aquele dia...”.

- O que houve depois disso? – interrompi-o novamente, curiosa pela história de amor que poderia haver entre ele e Caroline.

Christian sorriu de canto, e um novo brilho apoderou-se de seus olhos lápis-lazúli, assemelhando-se a uma verdadeira noite estrelada.

- Eu decidi que queria saber mais sobre ela. Decidi que não cumpriria minha missão até ouvir a história de ambos os lados. E aproximei-me dela, com a intenção de descobrir cada detalhe que Ducian havia omitido de mim e de meu irmão. Eu só não esperava, que com o tempo, pudesse afeiçoar-me tanto a ela, que, de forma inesperada, eu pudesse estabelecer um elo tão forte com Caroline, e principalmente, que pudesse apaixonar-me por ela.

“Quando eu descobri toda a verdade, decidi que definitivamente, não poderia permanecer com minha lealdade a Ducian e a Sillentya. Caroline contou-me sobre o que houve com sua mãe, e então eu soube de toda a barbaridade que estava por detrás das mentiras de Ducian”.

- O que houve com a mãe de Caroline?

- A mãe de Caroline era uma Elemental, marcada pelo selo amaldiçoado da Fênix, o pai era apenas um humano, não tinha a menor noção da guerra que estava metendo-se. Em uma noite, um caçador enviado por Sillentya encontrou-a em uma pequena cidade no interior do Tennessee, Olívia Monroe, esse era o nome da mãe dela.

- E o que aconteceu depois?

- O caçador e a mãe de Caroline entraram em combate, ela havia rompido o selo quando pequena, ao afogar-se enquanto nadava em um lago. A experiência de quase-morte foi o suficiente para livrá-la da maldição do selo e despertar seus poderes adormecidos. Por anos, ela manteve-se escondida, ocultando a sua verdadeira identidade. Mas Ducian parecia poder farejar o cheiro de um Elemental, ele era como uma praga, uma doença, e quando a encontrou, não a poupou... Caroline era apenas uma menina de colo quando a mãe foi levada até Sillentya e submetida ao segundo ritual de selamento dos poderes de um Elemental...

- Espere... – pedi-lhe, atenta e um pouco confusa – Você disse segundo ritual? Como assim?

- Quando os Mediadores perceberam que o selo da Fênix não era completamente capaz de suprimir os poderes dos Elementais e que apresentava uma brecha, que futuramente, poderia conceder-lhe uma chance de despertá-los, as Sete Tristezas decidiram que o melhor a se fazer era encontrar todos os descendentes de Vírsico e Angeonoro Vallatori, capturá-los para então, submetê-los a um novo ritual de selamento, um do qual não haveria escapatória, do qual não haveria fuga. Isso porque, não se escapa com vida desse ritual.

Levei uma de minhas mãos até meu ombro esquerdo, eu era incapaz de cerrar meus lábios ou desacelerar meus batimentos.

- O que você quer dizer com... Não se escapa com vida? – sussurrei, a voz tomada pelo pânico. Christian estreitou os olhos suavemente, fixando seu olhar no nada, parecendo ver através de mim.

- Quero dizer que o ápice do ritual acontece com a destruição da vítima, tudo, até mesmo a alma é selada dentro do corpo, em seguida, uma adaga é cravada no coração e o individuo tem a sua existência completamente apagada, como a alma está aprisionada dentro de sua casca, ela não pode deixar esse plano e encontrar o seu refúgio no plano espiritual, então, a alma morre. É como se ele jamais existido, ou pisado na face da terra. Não há descanso para a alma, nem mesmo para o corpo, tudo é apagado... Tudo.

- Isso é possível? Quer dizer... Uma alma pode mesmo... morrer?

- Pense na alma como a chama de uma vela, e que com o sopro certo, ela pode ser extinta. É assim com o ritual de trancamento que as Sete Tristezas realizam. Uma vez iniciado, o individuo passa por uma experiência extremamente dolorosa e traumática, o ritual tem de ser concluído com a sua morte, caso contrário, ele não surte efeitos e os poderes permanecem sem qualquer tipo de empecilho e podem ser despertados a qualquer momento, basta que o selo da Fênix seja rompido ou removido. Infelizmente, para ambos os processos, a vida do usuário do selo corre grande risco.

Meus dedos cravaram-se em meu ombro e meus olhos estreitaram-se, enquanto as lembranças atribuladas e violentas preenchiam meus pensamentos.

- Eu lembro-me... da dor, de que não conseguiria suportá-la.

- É exatamente assim. – ele murmurou.

Meus olhos baixaram até o chão, e uma dor, não física, mas desoladora, atingiu-me em cheio, trazendo consigo um sentimento de desconfiança e temor.

- Acha que meu pai passou por esse ritual? – sussurrei com minha voz embargada pela tristeza e pela dor, eu não queria imaginar, mas a cena projetava-se automaticamente em minha mente. Meu pai, acorrentado a um altar, sete mantos vermelhos ao seu redor, seus olhos verdes rolando nas órbitas pela dor, e uma figura sinistra no centro do círculo, uma adaga prateada, uma lâmina afiada em suas mãos, a reza murmurada em uma língua antiga e desconhecida, e meu pai sendo morto...

Cerrei os olhos com força, banindo esses pensamentos de minha cabeça, era doloroso demais imaginar que meu pai podia ter morrido pelas Sete Tristezas, e daquela maneira violenta... Não, eu não poderia pensar mais nisso!

- É bem provável – Christian murmurou, interrompendo-me em meus devaneios dolorosos –, muitos Elementais já foram exterminados dessa maneira em todos esses séculos. Sinto muito, Agatha, acredite em mim, eu sei como é essa dor.

Só percebi que estava chorando quando senti as lágrimas quentes deslizando pelo meu rosto, escorrendo pelo meu queixo e pingando em meu colo. Obriguei-me a parar de vertê-las, limpei-as com as costas da mão e trinquei os dentes, reprimindo aquela vontade esmagadora de chorar ainda mais.

- Continue, Christian, você não terminou de contar-me a história de Caroline. – pedi-lhe, desesperada para mudar de assunto. Tornei a fitá-lo, vendo a desconfiança nos olhos azuis, ele hesitava em contar-me mais sobre seu passado. Eu estava frágil, era verdade, mas a minha necessidade de desenterrar aquelas verdades era maior do que o meu desejo de afogar-me em lágrimas.

Ele suspirou, seu olhar vago perdeu-se na imensidão de lembranças, e eu sabia que agora viria a parte mais dolorosa para ele.

- O pai de Caroline refugiou-se em Chicago, jurando proteger a filha dos mesmos caçadores italianos que levaram sua esposa. Durante anos, ele conseguiu mantê-la escondida, mas quando a carreira artística de Caroline ascendeu, não havia mais maneira de ocultar sua existência, e a prova disso, é que eu cheguei lá, fui mandado para espioná-la, e depois, levá-la até Sillentya para que a matassem.

“Eu não pude fazer isso, eu a amava como jamais amei outro alguém, Caroline era minha vida, o motivo de minha existência, e movido por meu desespero de perdê-la para Ducian, eu tomei uma séria decisão. Eu fugiria com Caroline, para o fim do mundo de fosse preciso, mas eu a esconderia e viveria com ela até os últimos dias de sua vida”.

“E foi então que eu cometi o pior erro de minha vida”.

Christian sacudiu a cabeça novamente, cerrando os olhos e trincando os dentes, a fúria enrijecia seus músculos e tencionava seus membros. Eu a senti naquele instante, palatável, projetando-se ao meu redor, uma aura assustadora de raiva e amargura.

- Eu confiei em Aidan. – sussurrou Christian, a voz tomada pela dor – Eu confiei naquele maldito, acreditei que ele ia ajudar-me, que ele preocupava-se comigo e queria ver a minha felicidade, mas eu fui tolo, eu contei a ele tudo, eu o levei até o esconderijo de Caroline, e ele enganou-me, disse que me ajudaria na fuga, mas voltou com caçadores. Ele traiu-me, Agatha, contou a Ducian sobre mim e Caroline, contou sobre meu plano de fuga e entregou-nos a ele, sem demonstrar nem mesmo um pouco de arrependimento.

- Eu... não consigo acreditar que ele tenha feito isso. – sussurrei, horrorizada pela atitude que Aidan tomara. Como ele pôde? Com o próprio irmão? Uma dor, ainda maior, apunhalou-me em meu coração, fazendo-me quase sufocar.

- Pois acredite, porque o Aidan que eu conheço era capaz disso, eu lhe disse, Agatha, meu irmão trilhava um caminho de trevas, não havia humanidade alguma nele, Aidan só se importava consigo mesmo e com mais nada.

“O resto da história você pode adivinhar, Caroline e eu fomos levados até Sillentya, eu perdi a conta de quantos dias permaneci preso e acorrentado naqueles calabouços, sendo rigidamente castigado por minha traição”.

“Até que o dia de meu julgamento chegou”.

O choque atravessou todo o meu rosto.

- Julgamento? – eu repeti, confusa.

Christian notou a minha confusão e esforçou-se para me explicar.

- Quando um Mediador viola uma das “sagradas” leis impostas por Sillentya, o castigo é iminente, e ele varia de acordo com a gravidade da violação. No meu caso, a punição máxima deveria ser aplicada e a morte era inevitável. Para um traidor como eu, não havia perdão, não havia segunda chance.

- Quer dizer que... Ducian ia matá-lo?

- O julgamento nesse caso era uma mera formalidade, mas eu tinha um consolo e partiria feliz se aquela condição mantivesse-se até o fim.

- Que condição?

- As Sete Tristezas possuem um código, pode chamá-lo de conduta se quiser, mas eles jamais tocam em um Elemental se o selo da Fênix ainda estiver suprimindo os poderes. É uma lei que eles jamais costumam violar, então, se Caroline fosse mantida sobre vigilância constante, eles não a machucariam, bastava que ela terminasse seus dias como uma mera humana. E eu realmente desejava isso. Mas...

- Mas não foi isso que aconteceu, não é?

- Não... Ducian sabia exatamente o que deveria fazer, ele sabia perfeitamente cada passo que deveria tomar para alcançar seu objetivo, mas as demais Tristezas jamais concordariam em tocar Caroline, não enquanto ela estivesse subjugada ao selo da Fênix. Tudo para não causar a ira de Lucius, ainda mais.

- Lucius... – repeti o nome, lembrando-me de onde o ouvira, a lembrança preencheu meus pensamentos, Stevan Blake, ele havia dito algo sobre Lucius aceitar Christian de braços abertos e oferecer-lhe uma segunda chance. Christian sorriu um pouco, parecendo perder-se em suas próprias lembranças.

- Lucius Wolfgang, ele atualmente é o líder de Ephemera, e um dos mais poderosos Elementais, ele protege sua raça e luta por ela com bravura e determinação, é um homem honrado e de princípios, ele acolheu-me quando eu mais precisei, é por isso que sou grato a ele.

- Entendo.

- Lucius jamais perdoará a Ducian pelo que fez a família dele.

- E o que houve?

- Ducian assassinou seu irmão mais velho há muitos anos atrás, Frederich, obrigando Lucius a assumir a liderança de Ephemera, enquanto a esposa de seu irmão fugiu, desaparecendo com seu único filho, uma criança que teve toda a sua trajetória apagada e que se misturou aos humanos, sem conhecer a sua verdadeira origem. Dizem que Amélia, sua esposa, foi morta logo depois de esconder a criança, por caçadores a mando de Ducian.

“Mas isso não é nem metade de toda a história, anos depois, Ducian tornou a tirar pessoas que ele amava, capturando a sua esposa, Helena, ainda grávida de seu segundo filho, e então, sem a menor clemência ou misericórdia, ele a assassinou a sangue frio, agindo pelas costas das demais Tristezas e despertando a fúria de Lucius”.

- Como ele pôde destruir tantas vidas? Como ele consegue conviver consigo mesmo? – eu perguntei, irritada e receosa, afinal, Aidan convivia com aquele monstro, estava perto dele, perto até demais. E se Ducian descobrisse sobre o que Aidan fez no passado? Ele desacatou suas ordens, poupou a vida do irmão e, além disso... – Christian, você acha que Ducian pode tentar algo contra Aidan?

- Não. – sua resposta foi categórica – Ducian jamais machucaria o amado filhinho dele, ele presa demais a vida de meu irmão. Ele vê em Aidan o seu futuro sucessor, aquele quem continuará disseminando a dor e o sofrimento quando ele enfim partir.

- Você realmente acha isso? Afinal, Aidan... Ele apaixonou-se por uma... – a palavra entalou em minha garganta e eu quase sufoquei ao tentar pronunciá-la, mas era a realidade, quer eu a quisesse ou não – ele apaixonou-se por uma Elemental.

Christian bufou, revirando os olhos teatralmente, ele claramente estava dizendo-me: você está sendo tola de preocupar-se com ele, mas eu preferi deixar essa passar.

- Acredite em mim, ele fará o que for necessário para manter Aidan ao seu lado.

Christian arriou os ombros e relaxou sua postura no sofá, eu mordi o lábio inferior e decidi mudar de assunto.

- Então, continue, o que houve depois que você foi julgado?

- Foi uma surpresa para mim, mas eu já devia desconfiar do que Ducian estava tramando. Quando anunciaram o meu veredicto, eu nem mesmo pude acreditar, eu fora inocentado das acusações de traição e conspiração, porém, elas recaíram todas sobre Caroline.

Eu arquei uma de minhas sobrancelhas, confusa novamente.

- O quê? Como isso pode ter acontecido?

Christian soltou um longo suspiro e então prosseguiu.

- É simples, eles a acusaram de ter me seduzido, ter me convencido a traí-los, acusaram-na de conspiração, pode imaginar isso, Agatha? Como alguém como Caroline planejaria algo assim? Estava óbvio de que Ducian estava por trás disso, eu tinha certeza de que ele a havia induzido a assumir a culpa por mim.

- Mas por quê?

- Porque assim ele poderia tocá-la, as demais Tristezas não se oporiam a submetê-la ao segundo ritual, uma vez que ela havia me arrastado para o lado inimigo. Caroline a partir de então, tornava-se uma ameaça aos olhos das Sete Tristezas e não haveria escapatória para ela, não mais...

“Eu sempre me lembrarei daquele maldito dia, o dia em que a tiraram de mim, eu jamais esquecerei o que Ducian fez-me e jamais perdoarei Aidan por ter me entregado nas mãos dele”.

- Eu... Sinto muito, sinto muito mesmo, Christian. – eu não conseguia encontrar mais palavras que pudessem consolá-lo. E ainda fitando o nada, ele continuou, imergindo cada vez mais naquelas lembranças tão dolorosas, enquanto seus olhos ensombreciam.

- Eles acorrentaram-me lá, colocaram-me para vê-la de camarote, enquanto eles a amarravam naquele altar, a imobilizavam, e então a tortura começou. Eu ainda posso ouvir seus gritos de agonia e dor, como se ela estivesse sendo queimada viva. Ela se contorcia e pedia que eu a ajudasse, mas não importava o quanto eu forçasse aquelas correntes, eu jamais as arrebentava, e ela foi apenas... sucumbindo, enquanto eu assistia, inerte, incapaz de tirá-la dali. E então, Ducian ergueu a adaga, o punhal prateado, e a última coisa que ela pôde fazer foi olhar para mim, os olhos embaçados pelas lágrimas de dor e depois...

Christian encerrou seu discurso, sua voz desaparecendo, sua cabeça pendendo para baixo, e seus olhos ocultados pelas palmas de suas mãos. Não pude fazer mais nada, apenas o abracei, passando meu braços ao redor de seu corpo e repousando minha cabeça em seu ombro. Eu mesma já me encontrava em estado lamentável, debulhando-me em lágrimas, compadecida por sua dor.

- Eu sinto muito, Christian, sinto muito... – meus lábios sussurravam sem parar, tentando de alguma forma acalentá-lo, reconfortá-lo, mas pareciam tão inúteis meus esforços. Talvez, eu entendesse um pouco de sua dor. Afinal, eu perdi a pessoa que amava, de uma forma completamente diferente, mas mesmo assim, ele havia me deixado para trás e isso eu não poderia negar.

Christian recompôs-se, passou as mãos freneticamente em seu cabelo e apertou os olhos, trincando o maxilar.

- Depois de alguns dias, ainda preso naquele calabouço, e sem saber se era dia ou noite, eu consegui fugir, mesmo ferido e exausto. E foi então que Aidan veio atrás de mim, eu sabia que Ducian mandaria meu próprio irmão para dar cabo de minha vida, nada seria mais divertido e delicioso para ele do que ver dois irmãos lutando um contra o outro.

“Eu cheguei até a fronteira com a França, com Aidan em meu encalço, nós lutamos até que o sol se posse, até que minhas forças esgotassem-se todas, e ele finalmente me venceu. Eu vi a hesitação em seus olhos, ele não queria me matar, eu via isso estampado em sua face, mas havia algo dentro dele, algo que o corroia, algo que o ordenava a matar-me de uma vez só. Mas ele não teve coragem suficiente, disse que nosso elo sanguíneo era maior que o seu desejo de me matar, ele poupou minha vida e ordenou que eu retirasse-me de sua presença, que eu nunca mais o procurasse, porque se isso acontecesse outra vez, ele não teria misericórdia de mim. E eu o fiz com o maior prazer”.

- E para onde você foi?

- Refugiei-me na França, permaneci como um andarilho por dias, pelo menos, até encontrar uma “velha conhecida”: Madame Mabelle Champaudry.

- A Elemental com quem você lutou! – eu concluí, sendo iluminada por minha razão. Christian assentiu silenciosamente e então prosseguiu.

- Ela cuidou de mim, tratou de meus ferimentos, e ofereceu-me uma segunda chance, uma que eu não recusei. Ela levou-me até Ephemera, deixou-me sob os cuidados de Lucius, e é lá que eu tenho estado desde então. Pelo menos, permaneço grande parte do tempo, enquanto não estou viajando.

Retirei minha face de seu ombro, endireitando-me no sofá, enquanto a tristeza desaparecia de seus olhos e uma centelha de esperanças reavivava-os.

- O que nos leva até você. – sussurrou ele e estendeu sua mão até minha face, afagando-a delicadamente.

Detive sua mão, fixando meu olhar no seu, encarando-o incisivamente, perfurando-o com meus olhos.

- Agora eu compreendo, você veio atrás de mim para vingar-se de Aidan – baixei meu olhar, decepcionada, embora eu pudesse compreender sua dor e sua fúria, eu ainda não sabia se poderia confiar inteiramente nele –, você pretendia me machucar para deixá-los quites. – minha voz baixou para um sussurro inaudível e eu cerrei meus olhos, irritada.

- Isso foi no passado, Agatha. E eu não me importo com mais nada, apenas com você. Desde aquela noite, quando pus meus olhos em você, eu sempre soube que jamais seria capaz de levar esse plano idiota adiante, pense, Agatha, eu poderia tê-la matado ainda naquela noite quando os Devoradores a atacaram, mas eu não o fiz, eu a salvei dos braços da morte. E depois, senti uma necessidade desoladora de saber mais sobre você. Eu precisava conhecer você, saber seu nome, do que gostava, do que não gostava... Por isso me aproximei de você. E agora – ele sacudiu a cabeça, incrédulo –, veja só, estou completamente enfeitiçado por você.

Pigarreei, desejando mudar de assunto imediatamente, ou enrubesceria indubitavelmente. Procurei algo em minha mente para mudar de assunto e então me lembrei.

- Christian, como você pôde derrotar Blake daquela maneira? Eu... jamais vi um Mediador lutando da forma como você o enfrentou.

Ele riu um pouco e um sorriso de canto brotou em seus lábios.

- Quando eu cheguei a Ephemera, através de Madame Mabelle, eu surpreendi-me, não havia apenas Elementais lá, havia também Mediadores que desertaram de Sillentya, por não suportarem mais as regras e imposições das Sete Tristezas e aderiram a causa de Lucius. Um deles era Solomon O’Grady.

- Eu lembro-me desse nome! – exclamei, relembrando as exatas palavras de Stevan, ele dissera algo sobre esse tal de Solomon ter treinado Christian.

Christian lançou-me uma piscadela e prosseguiu.

- Solomon não era um Mediador comum. Ele foi, há muito tempo atrás, uma das Sete Tristezas...

- Espere! – eu o interrompi, confusa, tentando assimilar os fatos – Está dizendo-me que uma Tristeza desertou?

Não havia o menor sinal de vacilo em sua face, então era verdade.

- Isso é... surpreendente. – sussurrei, ainda um pouco confusa, eu jamais imaginaria que uma Tristeza poderia ter desertado. E então, os fatos encaixaram-se em minha mente, eu encarei Christian, meus olhos ainda um pouco perdidos em tanta confusão – Você... Você foi treinado por uma Tristeza? – minha voz falhou e eu tive que confrontar a mim mesma para reavê-la – Você controla o poder de um Antigo?

Christian assentiu, e eu quase desabei no sofá. Ainda não podia acreditar. Eu estava diante de um ser muito mais poderoso do que um simples Mediador comum. Christian dominava o incrível poder de um Antigo, isso justificava a derrota humilhante de Stevan Blake há pouco.

Engoli em seco, um pouco receosa, se Christian confrontasse Aidan...

Sacudi a cabeça e não quis mais pensar nisso, banindo aqueles pensamentos sombrios e assustadores. Tornei a fitar Christian, que ainda esperava que eu me recompusesse.

- Mas... – tentei iniciar outro tópico, disposta a desenterrar cada segredo e desvendar cada mistério que estivera rondando-me desde o momento em que conheci Aidan, ou até mais – Christian, como exatamente você soube sobre mim e... seu irmão?

Ele revirou os olhos, como se a resposta fosse óbvia, eu cruzei os braços, irritada, mas ele decidiu explicar-me.

- Da mesma forma que Ducian soube, ora. Sabe, Agatha, nem todos os Mediadores odeiam a sua raça, alguns até mesmo se compadecem dos semelhantes a você.

- Pode ser um pouco mais específico. – pedi-lhe, gentilmente e ele bufou.

- Temos espiões em Sillentya, informantes, pessoas ligadas as Sete Tristezas, e essas, informam-nos de tudo o que ocorre lá dentro. Um desses espiões conseguiu interceptar uma das cartas de Blake e levou essa informação até Lucius.

- Então foi assim que você soube da minha existência.

Ele assentiu e em seguida, desviou os olhos, quase como se estivesse envergonhado de suas atitudes recentemente.

- Claro que quando eu descobri sobre você, eu fui cegado pelo desejo de vingança, Lucius tentou convencer-me de que você era inocente e não tinha culpa, mas eu apenas o ignorei e viajei até a América, disposto a pôr um fim a sua vida no momento em que te visse. Mas, eu não pude fazer isso, Agatha, e sinceramente espero que você perdoe-me, eu sou mesmo um estúpido.

- Está tudo bem. – sussurrei, ainda lutando para assimilar todos os fatos de que tinha tomado conhecimento esta tarde e então, soltei um longo suspiro – E eu sou mesmo uma aberração da natureza, não sou?

Christian notou meu aborrecimento, pegou-me pelos ombros e fez-me encará-los nos olhos.

- Ei, não diga algo assim, tenha orgulho do que você é, Agatha, você é uma criatura magnífica, inigualável, sua raça é sinônimo de poder e majestade para os Mediadores, por isso vocês são tão temidos e perseguidos. – um sorriso gentil emoldurou seus lábios e seus olhos azuis derreteram, tornando-se amáveis e profundos – Jamais amaldiçoe a sua origem, apenas aceite o seu destino, aceite quem verdadeiramente você é.

- Eu nunca pedi por esse poder, eu nunca pedi por isso... – sussurrei, sentindo as lágrimas acumularem-se em meus olhos, prontas para despencar a qualquer momento e Christian não me disse mais nada, apenas puxou-me para um abraço, reconfortando-me, oferecendo-me o que mais ninguém podia naquele momento: conforto e apoio.

Deixei-me embalar por aquelas sensações, procurando mais uma vez pelo refúgio que eu havia encontrado em Christian. Por mais que eu não admitir, eu precisava dele, como jamais precisaria.

E então, de repente, ele apertou-me mais em seus braços, e seus lábios estavam em meu cabelo, descendo vagarosamente através da pele de meu pescoço, onde ele depositava castos beijos.

- Fica comigo? - sussurrou ele no meu ouvido, sedutoramente.

Enrije no mesmo instante e afastei-me dele, desvencilhando-me de seus braços. Levantei do sofá, levando as mãos à cabeça, confusa e extremamente abalada. Não precisei olhar para trás para saber que ele seguia-me, enquanto eu deixava a sala e rumava em direção à cozinha.

Eu precisava de um pouco de ar fresco, sentia que estava sufocando dentro daquelas paredes. Minha garganta queimava e meu corpo pesava. Abri as cortinas acima da pia da cozinha, permitindo que a luz da lua infiltrasse-se pela casa, abri a janela também, e senti a brisa fresca noturna causasse uma sensação de alívio em minha pele.

E então, um corpo quente estacou bem atrás de mim. Estremeci, parece que eu não conseguiria despistá-lo assim tão fácil. Ele aproximou seus lábios de meu ouvido e sussurrou delicadamente, arrepiando minha pele.

- Você não respondeu minha pergunta...

Pisquei, atônita, tentando lembrar-me do que exatamente ele estava falando, mas Christian não me deu chance de concluir meus pensamentos, abraçou-me, puxando-me para perto de si, apertando-me em seus braços, e mais uma vez, seus lábios refaziam um lento trajeto de meu ombro até a base de meu pescoço.

Cerrei os olhos com força, mordendo o lábio inferior, como ele conseguia deixar-me tão... sem palavras?

- Christian, espere, por favor... Eu... – tentei inutilmente juntar as palavras em uma frase, mas sem sucesso, todo o meu corpo reagia as suas carícias.

Em um movimento abrupto, e repentino, que acabou por me chocar um pouco, Christian virou-me para ele, empurrou-me para trás, até que meu corpo chocasse-se contra a bancada da pia, e ergueu-me pelos quadris, depositando-me ali em cima.

Enrubesci lamentavelmente, sentindo o sangue arder nas maçãs de meu rosto. Ele aproximou-se o máximo que podia de mim, sua respiração quente chocava-se contra a pele de meu rosto, fungando em meu cabelo. E ele insistiu novamente.

- Diga-me, Agatha, o que sente por mim?

Abri a boca para tentar falar-lhe algo, mas ele nem mesmo esperou por minha resposta e tomou-me em seus braços, colando seus lábios nos meus, com a mesma intensidade de outrora.

Senti o seu desespero e a sua necessidade na forma como ele beijava-me.

Vasculhei meu cérebro a procura de algo que fosse coerente, mas eu falhava miseravelmente, por que ele conseguia domar-me daquela maneira? Eu nem mesmo me lembrava como respirar corretamente.

Ele interrompeu nosso beijo, avançando para meu pescoço mais uma vez, sua língua ainda me deixava arrepiada e sem qualquer reação racional. E ele sussurrava contra a minha pele.

- Diga, Agatha, o que sente? O que está sentindo agora?

Segurei em seus ombros, tentando controlar minha respiração – impossível para mim naquele momento.

Ele apertou-me ainda mais em seus braços, suas mãos estavam em minha cintura, escorregavam pelas minhas costas, enrolavam-se nas pontas de meus cabelos e ora ou outra, seguravam em minha nuca. Eu suspirei, ainda estava sendo tomada por aquelas sensações estranhas e desconhecidas, mas que ao mesmo tempo, embalavam-me de uma maneira tão assustadora e inebriante.

Era como antes, eu não podia resistir, eu não conseguia resistir a ele. Porque tínhamos uma conexão, uma que eu jamais conseguia explicar.

Abri meus lábios outra vez – eu estivera tentando conter os gemidos, que vergonhosamente escapariam deles se eu os mantivesse abertos –, e meus dedos agarraram o tecido de sua camisa.

- Christian, eu... Eu... – fechei os olhos e tentei mais uma vez – Christian, eu...

Um som interrompeu minha fala, ecoando por toda a silenciosa casa, praticamente me arrancando de meu momento com Christian; Era o telefone que tocava.

O som repetiu-se mais uma vez, mais impaciente e barulhento, era irritante.

- Christian, o telefone... – tentei de alguma maneira fazê-lo despertar, mas ele parecia determinado a manter-me ali, em seus braços.

Seus lábios subiram através de meu pescoço e estacaram em minha orelha.

- Deixei-o tocar... – sussurrou ele e então mordiscou o lóbulo de minha orelha. Um espasmo de prazer percorreu toda a extensão de meu corpo, e ele sorriu, satisfeito.

Ele tomou meus lábios mais uma vez, exigindo toda a minha atenção, mas o barulho incessante insistia, e atazanava-me, doía em meus tímpanos.

Levei minhas mãos até seu rosto, usando de toda a minha força para afastá-lo, ele relutou, mostrou garra e determinação em afastar-se de mim, mas no fim, cedeu, e seus olhos excitados e brilhantes fuzilaram-me por interrompê-lo justo naquele momento.

Permaneci boquiaberta por alguns décimos de segundos, e por fim murmurei.

- Pode ser importante.

Ele bufou, irritado, mas desceu-me da bancada da cozinha, afastando-se de mim, o calor de seu corpo deixava o meu, e ele encostava à parede, o semblante pensativo, o olhar vago.

Caminhei, apressada, abanando-me, meu corpo estava em chamas, acelerei os passos até a sala, e se ele resolvesse mudar de idéia novamente?

Estaquei diante do aparelho barulhento, e estendi minha mão, pegando-o, cessando aquele ruído infernal de uma vez por todas. Levei-o até minha orelha direita.

- Alô?

Houve um estranho ruído ao fundo, um chiado que me fez afastar o aparelho do ouvido imediatamente; a ligação estava horrível.

- Alô? – insisti mais uma vez, e a pessoa do outro da linha pronunciou-se.

- Agatha?

Reconheci a dona daquela voz imediatamente e meus olhos arregalaram-se, enquanto o pânico – e não o alívio – dominava-me.

- Tamara?

O oxigênio fugiu de meus pulmões e eu senti-me sufocada no mesmo instante.

- Tamara, o que houve? Onde você está?

Ela riu do outro lado da linha, e eu estaquei, chocada.

- Não precisa preocupar-se comigo, Agatha, eu estou bem. Mais do que bem na verdade. Ele precisa de mim...

- O quê? Do quê você está falando? Diga-me onde está agora! – exigi, tomada pelo desespero e pela fúria.

- Eu estou em um lugar especial, mas em breve não estarei mais... – ela sussurrou, como se estivesse segredando-me algo grande.

- Tamara, pare de brincar, eu quero saber onde você está!

- Não se preocupe, Agatha, ele disse que você será a próxima, mas por enquanto, é de mim que ele precisa e mais ninguém.

- Tamara!

Ela riu novamente, como uma criança que está aprontando algo.

- Que comece o Wayeb! – exclamou ela e o telefone de repente ficou mudo, a ligação caiu.

Baixei o aparelho de telefone mudo, meus olhos vidrados no nada, os lábios escancarados.

Christian aproximou-se de mim, parecia preocupado. Virei-me para ele, ainda chocada, os olhos ardendo pela umidade iminente.

- O que houve, Agatha? – perguntou-me ele.

- Tamara... - consegui sussurrar.

- O que tem a sua amiga?

Eu tomei fôlego, uma forte vertigem ameaçava apanhar-me. Senti-me tonta no mesmo instante, as paredes giravam ao meu redor. Mas mesmo assim, eu consegui falar, mesmo que minha voz parecesse sem vida, morta...

- Tamara ligou-me, ela está em algum lugar da cidade, ela é o quinto sacrifício. Tamara foi escolhida como o quinto sacrifício... – e minha voz falhou, enquanto eu debulhava-me mais uma vez em lágrimas e desespero.


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Notas finais do capítulo

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh putz e agora?Será que a Agatha conseguirá salvar a Tamara?E o que acharam da história que há por trás da rivalidade do Aidan e do Christian? Alguém ainda tem dúvidas?Não se preocupem, teremos muitos flashbacks desses dois na 4ª fase! (narrada pelo próprio Aidan!!!! Alguém me abane!)Próximo capítulo, o circo vai pegar fogo! Ò.ÓHahahahahahaha!!!!E agora...FELIZ ANO NOVO, MEUS AMORES! TUDO DE BOM PARA VOCÊS! QUE TODOS OS SEUS SONHOS SE REALIZEM! E obrigada por me acompanharem nesse maravilhoso ano! Eu com certeza tenho ótimas lembranças de todos vocês!Beijos, meus queridos!